Porto Alegre, terça-feira, 19 de março de 2024
   

Deputado Raul Carrion - PCdoB-RS

O Partido Comunista do Brasil no Rio Grande do Sul
1922-1929


3 - A FUNDAÇÃO DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL

3.1 - Fatores que impulsionaram a formação do Partido Comunista do Brasil

            O exame conscencioso do surgimento do Partido Comunista do Brasil nos obriga a rejeitar a visão simplista, e até simplória, dos que vêem o seu surgimento e a sua existência como algo alheio ao amadurecimento objetivo das lutas de classes e da vanguarda operária brasileira, e sim como uma criação artificial da Internacional Comunista e do “dedo de Moscou”.[1]

            Em primeiro lugar, é inegável que o surgimento do Partido Comunista do Brasil está diretamente ligado aos grandes movimentos operários de 1917-1920 e à sua derrota, decorrente da incapacidade da liderança anarquista em dar um rumo correto a essas lutas.

É nesse contexto de impotência e de fracasso do anarquismo na condução da luta contra a exploração capitalista, que explode a grande Revolução Russa, dirigida pelo Partido Bolchevique, que conduz o proletariado ao assalto ao Poder, em aliança com o campesinato, e cria o Estado Soviético. A influência desses acontecimentos sobre a vanguarda operária no Brasil é enorme. Os “dogmas” anarquistas contra o “Partido em si” e contra o “Estado em si” - sem examinar o seu caráter de classe - caem por terra. Lentamente, dá-se um processo de diferenciação dentro do próprio movimento anarquista, onde cresce a corrente dos anarco-bolchevistas, de onde sairão alguns dos fundadores do PC do Brasil em 1922. A própria passagem de uma parte dos anarquistas “puristas” para o campo do antisovietismo, acelera esse processo.

Um terceiro fator básico para o surgimento do Partido Comunista, é o próprio crescimento e concentração da classe operária no país, fruto da industrialização inicial do país durante a I Guerra Mundial. Segundo o censo de 1920, a classe operária chegava a 300 mil trabalhadores, sendo que os três Estados de maior concentração proletária eram São Paulo (28,3%), Rio de Janeiro (24,6%) e Rio Grande do Sul (8,3%); em 1920, concentravam-se nesses três Estados 61,2% do proletariado nacional.

A classe operária brasileira era formada, predominantemente, por trabalhadores da indústria têxtil (40,7%) e alimentícia (18,8%), que totalizavam 60% dos operários. Desse total, 13% trabalhavam em empresas até 9 operários, 17% em empresas entre 10 e 49 operários, e 70% em empresas com mais de 50 operários. Nos estados mais industrializados esta concentração era ainda maior: assim, trabalhavam em empresas com mais de 100 operários, no Rio de Janeiro, 67%, em São Paulo 64% e no Rio Grande do Sul 52%. O que já nos permite caracterizar a maioria da classe operária brasileira, de então, como essencialmente fabril, com um grau razoável de concentração.[2] Tudo isso contribuía para tirar forças ao anarquismo, ideologia típica da fase artesanal do proletariado.

            No Rio Grande do Sul, 70,3% dos operários concentravam-se nas indústrias da alimentação, têxteis, vestuário e mobiliário, sendo que 57,4% só nos dois primeiros ramos. A indústria têxtil é a que registra a maior concentração - 182 trabalhadores por estabelecimento - seguida bem de longe pelas indústrias do mobiliário - 24 t/e - alimentação - 19 t/e - e vestuário -13 t/e. Em 1920, as mulheres já são 22% de toda a mão-de-obra operária, empregada na indústria gaúcha

Ainda é importante considerarmos, no caso do Rio Grande do Sul, a influência dos movimentos operários da Argentina e do Uruguai, onde haviam sido criados Partidos Comunistas em janeiro de 1918 e em setembro de 1920, respectivamente. É interessante notar que nesses países os Partidos Comunistas surgiram dos fortes Partidos Socialistas ali existentes, diferentemente do que ocorreu no Brasil. Em uma fronteira tradicionalmente permeável ao contrabando e à migração, também a circulação de idéias era intensa. São inúmeros os registros seja quanto a circulação de publicações marxistas[3], seja quanto a ações de solidariedade proletária nas lutas contra o capital.[4]

3.2 -    Os primeiros grupos comunistas no Brasil e no Rio Grande do Sul e o Congresso de
            fundação do Partido Comunista do Brasil

Segundo os dados de que dispomos, é na cidade de Cruzeiro, São Paulo, onde surge o primeiro núcleo comunista do Brasil, liderado pelo eletricista Hermogêneo Silva. Esse grupo, que adota o nome de “União Operária 1º de Maio”, funcionou entre 1917 a 1919.[5] Também o Rio Grande do Sul surgem grupos “comunistas”:

em 1918, aos 28 anos de idade, Santos Soares fundou e se colocou a frente da liga comunista de Livramento. Essa foi a primeira organização comunista do Rio Grande do Sul. A primeira medida da liga foi publicar um jornal, que efetivamente circulou em vários números e foi disputado pelos trabalhadores. A sede da liga comunista foi assaltada pela polícia. Mas ela existiu até a fundação do Partido Comunista do Brasil, em 1922. (...) promovia com maior intensidade a leitura do escasso material revolucionário obtido através da fronteira com o Uruguai. (...) animava a chama da solidariedade à União Soviética. (...) A fundação da liga Comunista de Santana do Livramento não foi um fato isolado. Com pequena diferença de tempo, surgem organizações semelhantes em diversos pontos. Funda-se um centro em Passo Fundo. Os trabalhadores de Porto Alegre editam o Manifesto Comunista de Marx e Engels. Os trabalhadores de Rio Grande inscrevem na fachada da União Operária o lema “Operários de todos os países uni-vos” (...) Essa iniciativa de fundar ligas e círculos comunistas é uma demonstração da necessidade que os trabalhadores sentem do partido. A atuação de Santos Soares está na própria raiz da organização do partido comunista no Rio Grande do Sul.”[6]

Em 1921, Santos Soares “funda o Centro Socialista de sua cidade, já plenamente alinhado com a Revolução Russa. Não é mais um ‘comunista libertário’. É um marxista”.

Em novembro de 1918, Abílio de Nequete - um dos dirigentes da greve geral de 1917, em Porto Alegre - lança o “Manifesto da ‘União Maximalista’ aos operários”, marcando o surgimento da “União Maximalista” de Porto Alegre, referenciada na Revolução Russa e formada por Abílio Nequete, Francisco Merino e Otávio Hengist. Nesse “Manifesto” afirmava-se, entre outras coisas:

Operários! Invadi essas casas arejadas e habitai-as sem discussão, porque foram construídas por vossas próprias mãos. Destruí duma para sempre, o capricho dessa corrompida sociedade, que tem por objetivo aniquilar-vos. Apoderai-vos desses depósitos de produtos alimentícios e alimentai-vos deles sem receio, porque eles são o produto de vosso labor, são portanto legitimamente vossos e não de seus atuais detentores, vossos fidagais inimigos, os quais há séculos consomem sem produzir coisa alguma. Ponhamo-los fora de nossa comunhão, só lhes aceitando quando se apresentem como de fato produtores. Operários!, apoderai-vos de tudo que encontrardes depositado em tecidos e calçados e vesti-vos, porque se não fora vossas mãos nada disso haveria. Operários!, mais um impulso e a burguesia do mundo cairá. Tende em mira o impulso “maximalista” bastando ali a vontade dos operários e soldados, para pôr por terra não só a secular tirania dos Romanovs como também a seu satélite a Democracia Kerenskina. Operários!, basta de indolência, saibas de uma vez para sempre que o mundo só deve ser daqueles que produzem; e todo aquele que não produz é parasita (...) Operários!, vós unidos derrubareis esse carcomido edifício da burguesia, edificando em seu lugar o da razão, da Harmonia e da Igualdade que consiste em cada qual dar o que pode, levando o que necessita. Operários! (...) o maximalismo é triunfante na Rússia e, segundo as últimas informações, já está invadindo os impérios centrais, começando pela Bulgária, já bate no trono dos Hohenzollern (...) estejais pois alertas, porque ele há de vir até cá (...) muito breve talvez, a despeito de todos os arreganhos[7]

Em 1922, a “União Maximalista”, já com a nova denominação de “Grupo Comunista”, está formada por doze membros: “Nequete, Francisco Merino, Otávio Hengist, Carlos Toffolo, Narciso Mirandola, um judeu argentino - Samuel Speiski - e mais dois judeus, Marcos e Isaac. Não há referência quanto aos outros quatro membros, a não ser a um português - Magalhães”.[8] Segundo Rosito:

Encontrando, no início do ano de 1921, o diário “Justicia”, órgão do Partido Socialista Uruguaio, tomou conhecimento da preparação do congresso em que esse partido deveria aderir à Moscou. O deputado Celestino Mibelli optava pela adesão imediata. Por ocasião do aparecimento das 21 condições, no II Congresso Internacional de Moscou, reuniu-se novamente o Partido Socialista Uruguaio. Abílio de Nequete escreveu ao deputado Mibelli pedindo que aceitasse as condições e concedendo-lhe a representação da União Maximalista do Rio Grande do Sul - “eis como Mibelli teve de ser o primeiro representante do Brasil num congresso comunista.” [NEQUETE, Abílio. Apontamentos realizados de 8 a 19 de julho de 1944 - caderno nº II, p. 21] Na mesma carta escrevera a frase de Barbusse (...) sobre as 21 condições: “nada tinha que não pudesse ser aceito por um socialista sincero ou cidadão honesto”. O presidente daquela sessão do congresso telegrafou mais tarde agradecendo à União Maximalista do Rio Grande do Sul. Foi a primeira relação da União com o exterior. [9]

            No dia 7 de novembro de 1921, é fundado o “Grupo Comunista” do Rio de Janeiro, constituído por Astrojildo Pereira, Luiz Perez, José Alves Diniz, e outros nove membros. De imediato, o grupo carioca tratou entrar em contato com outros centros operários, divulgando as 21 cláusulas da Internacional Comunista e recomendando que também formassem grupos comunistas. Assim, surgiram grupos semelhantes em Recife, Juiz de Fora e Cruzeiro (SP). A 1º de janeiro de 1922, Cristiano Cordeiro - que entre 1919-1920, junto com Rodolfo Coutinho, havia criado em Recife o “Círculo de Estudos Marxistas” - funda o Grupo Comunista de Recife.[10] Em janeiro de 1922, o Grupo Comunista do Rio de Janeiro lança a revista MOVIMENTO COMUNISTA, que se apresenta como o órgão dos comunistas do Brasil, tendo como objetivo “defender e propagar, entre nós, o programa da Internacional Comunista. (...) repositório mensal fidedigno de doutrina e informação do movimento comunista internacional.” A revista - que, após a fundação, passou a ser publicada como um órgão oficial do Partido Comunista do Brasil - editou 13 números durante o ano de 1922, totalizando 390 páginas, com um tiragem anual total de cerca de 15 mil exemplares. Em 1923, foram publicados outros 12 números, sendo o último deles datado de 10 de junho de 1923.[11]

No início de 1922, Astrogildo vai à São Paulo com o objetivo de fundar um grupo comunista, mas só meia dúzia de pessoas assinam o livro de presença. No que se refere ao Rio Grande do Sul

Em fins de 1921, Astrogildo Pereira, do Grupo Comunista do Rio de Janeiro, escrevera a Polidoro Santos (anarquista da Liga de Defesa Popular) pedindo a sua adesão à Revolução Russa. Polidoro respondera informando o endereço de Abílio de Nequete, solicitando que se dirigisse a ele. Dessa correspondência resultou a mudança do nome de União Maximalista para Grupo Comunista, “mais de acordo com o que Lenine havia proposto” [NEQUETE. Apontamentos ... Op. Cit., p. 24]. (...) No início de 1922, Abílio de Nequete recebe um telegrama do Uruguai, dizendo que a sua presença era exigida naquele país por um assunto urgente. O telegrama era assinado por Martin Simoni e tinha resposta paga. Recebeu o dinheiro para a viagem, depois de responder afirmativamente. No Uruguai (...) procurou Simoni na redação de “Justicia”. Foi informado da intenção de um delegado russo vir ao Brasil e da necessidade de entrarem em contato. O delegado russo era Alexandre Alexandrovski, que tinha ido à Rússia nos primórdios da Revolução em nome dos russos residentes na Argentina, e voltara como delegado da Revolução para a América Latina. Desejava obter um relatório sobre o movimento brasileiro e a organização do partido. Dali regressaria à Rússia. Em Buenos Aires R. Vaterland, outro delegado da Revolução, deveria continuar a correspondência. Ficou estabelecido que Abílio de Nequete iria ao Rio de Janeiro convocar um congresso, embora de poucos elementos, já que a insistência de Alexandrovski devia-se à falta do nome do Brasil na Internacional.. Depois de mais alguns dias em Montevideo, Abílio de Nequete voltou a Porto Alegre, de onde escreveu a Astrogildo Pereira e Everardo Dias, informando da próxima viagem ao Rio e remetendo o jornal “Justicia”. (...) foi Abílio de Nequete quem recebeu, do delegado russo, a incumbência de organizar o partido, devido à necessidade de enviar um representante do Brasil ao IV Congresso da Internacional de Moscou. O Grupo Comunista de Porto Alegre já estava reconhecido pela Internacional, embora tivesse apenas doze membros.[12]

            Finalmente, nos dias 25, 26 e 27 de março de 1922, reuniu-se no Rio de Janeiro o Congresso de fundação do Partido Comunista do Brasil.[13] Estavam presentes 9 delegados, representando 73 filiados em todo o país: Abílio de Nequete, barbeiro, de Porto Alegre, que também representava o Partido Comunista do Uruguai e a Agência de Propaganda para a América do Sul da Terceira Internacional; Astrogildo Pereira, jornalista, de Niterói; Cristiano Cordeiro, funcionário público, de Recife; Hermogênio Silva, eletricista e ferroviário, de Cruzeiro; João Jorge da Costa Pimenta, gráfico, de São Paulo; Joaquim Barbosa, alfaiate, do Rio de Janeiro; José Elias da Silva, funcionário público, do Rio de Janeiro; Manoel Cendón, artesão alfaiate; Luiz Peres, artesão vassoureiro, do Rio de Janeiro. Destes, 7 eram brasileiros natos, um espanhol (Cendón) e um libanês (Nequete). Santos e Juiz de Fora, onde também havia grupos comunistas, não puderam enviar delegados.

Da ordem-do-dia do I Congresso constavam: 1) Exame das 21 condições de admissão na Internacional Comunista; 2) Estatutos do Partido Comunista; 3) Eleição da Comissão Central Executiva; 4) Ação pró-flagelados do Volga; 5) Assuntos vários. Depois de aceitas as 21 condições da IC, os presentes aprovaram Estatutos provisórios, baseados nos Estatutos do PC da Argentina.[14] Os seus artigos 1º e 2º afirmavam:

Art. 1º - Fica fundada, por tempo indeterminado, uma Sociedade Civil, no Rio de Janeiro, ramificando-se por todo o Brasil, tendo por título - Centro do Partido Comunista do Brasil[15], mas que será chamada Partido Comunista, Seção Brasileira da Internacional Comunista.

Art. 2º - O Partido Comunista tem por fim promover o entendimento e a ação internacional dos trabalhadores e a organização política do proletariado em partido de classe para a conquista do poder e conseqüente transformação política e econômica da Sociedade Capitalista em Sociedade Comunista.[16]

A seguir, foi eleita a primeira Comissão Central Executiva, composta por 5 titulares e 5 suplentes; como titulares foram escolhidos Abílio de Nequete, secretário geral; Astrogildo Pereira, imprensa e publicidade; Antonio Bernardo Canellas (gráfico), secretário internacional; Luís Peres, frações sindicais; Antônio Gomes Cruz Júnior (comerciário), tesoureiro. Os suplentes eleitos foram Cristiano Cordeiro (estudante), Rodolfo Coutinho, Joaquim Barbosa, Manoel Cendón e Antonio de Carvalho (estivador). A maioria deles, eram originários do anarco-sindicalismo e do sindicalismo revolucionário, com exceção de Manoel Cendón - que havia sido influenciado pelos socialistas da Argentina, onde viveu - e Rodolfo Coutinho. Abílio de Nequete foi eleito para a secretaria geral a partir de uma indicação de Astrogildo Pereira, possivelmente em deferência a maior antigüidade da “União Maximalista” e por sua estreita relação com o Partido Comunista Uruguaio e com o Bureau da IC para a América Latina, mas logo demonstrará estar pouco preparado para a função.

            As demais discussões se deram em cima de algumas mensagens e moções, além de medidas para a solidariedade aos flagelados russos. Não foi aprovado nenhum documento de análise da realidade ou de orientação política. Como não existia legislação específica para os partidos políticos, o P. C. do Brasil foi registrado como sociedade civil, publicando os seus Estatutos no Diário Oficial da União, de 07.04.22.

            Se, por um lado, a fundação do Partido Comunista do Brasil significou um enorme salto de qualidade da classe operária brasileira, no sentido da sua transformação de classe em si para classe para si, por outro lado, padece de grandes debilidades. Em primeiro lugar porque - apesar de surgir no bojo da crítica ao anarquismo[17] da avaliação da rica experiências das lutas proletárias de 1917-1920 - o Partido se constrói em um momento de refluxo do movimento operário brasileiro e de furiosa repressão governamental. Em segundo lugar, pelo grande desconhecimento da teoria marxista em nosso país, seja na classe operária, seja na intelectualidade progressista. Em terceiro lugar, pela ausência de qualquer tradição organizativa  no movimento operário - decorrente de um longo predomínio do anarquismo e da extrema debilidade dos movimentos de caráter socialista - com todas as suas conseqüências negativas para a tarefa de organizar um partido coeso e disciplinado. A essas dificuldades deve-se somar - além do relativo atraso industrial do país e a origem camponesa de grande parte de sua recente classe operária - o apoliticismo incutido durante anos a fio na mente dos operários de vanguarda, e o peso considerável das correntes reformistas (católicos, cooperativistas, socialistas evolucionistas) entre os trabalhadores:

Mas a classe operária, ao fundar seu partido, é ainda bastante jovem. Somente durante a I Guerra Mundial, o capitalismo no Brasil adquire maior impulso. Se expande a industria leve, particularmente o ramo têxtil, e se ampliam os meios de transporte marítimo e ferroviário. Junto com a burguesia se desenvolve o proletariado que vende sua força de trabalho não só a capitalistas nacionais como também a empresas imperialistas. A classe operária se compõem em boa parte de elementos provindos do campo e de trabalhadores de oficinas e pequenas empresas (...) O movimento sindical, ainda que combativo, apresenta muitas debilidades. O proletariado mal começa a adquirir consciência política. (...) Até então, o marxismo não é conhecido no Brasil e, mesmo entre a intelectualidade avançada, prevalece o anarquismo. Tudo isso não pode deixar de repercutir no Partido recém fundado que reflete as virtudes e os defeitos da classe operária. Apesar de ter surgido sob a égide da III Internacional (...) o Partido pouco conhece o marxismo e muito longe está de dominá-lo. Falta-lhe suficiente clareza para se orientar com acerto na realidade[18]


 

 

[1] “O que é certo, porém e isto está muito ligado às próprias condições de formação do Partido Comunista, que não foi resultado de grandes movimentos da classe operária brasileira, é que o discurso político de seus dirigentes e militantes está impregnado do marxismo e das práticas da Terceira Internacional”. [GARCIA, Marco Aurélio. Prefácio. In: ZAIDAN FILHO, Michel. O PCB e a Internacional Comunista (1922-1929). São Paulo: Vértice, 1988, p. 8]; “esse mimetismo do PCB em relação à IC não se restringe à política de frente única. Na prática, o Partido só é capaz de enxergar a ‘Realidade” brasileira através das lentes da IC, acabando por atuar como uma mera agência desta, sem qualquer margem de autonomia.” [TRONCA, Italo. Revolução de 1930: a dominação oculta. São Paulo: Brasiliense, 1993, p. 30]

[2] “É também interessante comparar o nível de concentração da classe operária no Brasil e na Rússia tzarista, especialmente a porcentagem de trabalhadores ocupados nas empresas com mais de 100 operários cada: na Rússia de 1910 - 80%; no Brasil de 1920 - 61,1%. Mas isto ainda não significa que na Rússia o grau de concentração do proletariado era superior (...) o grau de concentração do proletariado industrial no Brasil era consideravelmente superior: o número médio de operários nas empresas desse grupo na Rússia era de 53 operários, e no Brasil 331, ou seja, 6 vezes maior.” [KOVAL. Op. Cit., pp. 130]

[3] “Em Rio Grande encontrou vários endereços do exterior e alguma bibliografia. De volta a Porto Alegre escreveu a Buenos Aires, de onde recebeu o semanário ‘Internacional’ e ‘Documentos del Progreso’, e através desses encontrou vários livros. Assim, através da viagem recomendada pelos anarquistas, Abílio de Nequete encontrou bibliografia preciosa para o seu objetivo de convencer os camaradas a se afastarem do anarquismo.” [ROSITO, Renata Irene Haas. O Pensamento político de Abílio de Nequete. Datilografado. PUC, 1972, p. 8.

[4] “A solidariedade do internacionalismo proletário frutificava, na prática: na Praça, entre outros, vem falar um delegado da Federação Operária de Montevideo. E mais: embora a greve fosse em Livramento, no dia 27 há um grande comício na ‘Plaza Rio Blanco’, em Rivera, dentro do território uruguaio!” [MARÇAL. A primeira greve ... Op. Cit., p.4]

[5] BANDEIRA. Op. Cit.., p.154.

[6] AKCELRUD, Isaac. Santos Soares. Rio de Janeiro: Revista Problemas nº 39, 1952, p.

[7] PETERSEN e LUCAS. Op. Cit., pp. 210-212

[8] ROSITO, Op. Cit., p. 10.

[9] Idem, p.9.

[10] “Correspondi-me em 1921 com Astrojildo Pereira (...) Combinamos criar, ele no Rio, eu no Recife, embriões de futuros comitês do partido. (...) O Grupo Comunista do Recife estabeleceu-se no dia 1º de janeiro de 1922. (...) Li, na ocasião, os chamados “21 Pontos de Moscou, condições para adesão à Internacional Comunista. A ata de fundação foi assinada por cerca de 35 pessoas que decidiram, ainda, que eu seria o delegado de Pernambuco ao encontro para a criação do PCB.” [CORDEIRO, Cristiano. Depoimento a Ricardo Noblat. In: BARROS, Manoel de Souza et al. Memória e História - 2. São Paulo: LECH, 1982, p. 83]

[11] PEREIRA. Op. Cit., pp. 77-81.

[12] ROSITO. Op. Cit., pp. 10-11.

[13] “Em meados de fevereiro, por iniciativa dos camaradas do Grupo de Porto Alegre, o Grupo do Rio entendeu-se com os demais grupos existentes sobre a necessidade de se apressar a reunião, em congresso, dos delegados dos mesmos, para definitiva organização do Partido em vista da aproximação do IV Congresso da Internacional de Moscou, no qual deveriam fazer-se representar os comunistas do Brasil.” [MOVIMENTO COMUNISTA., 7, junho de 1922. In: PEREIRA. Op.Cit. p. 65]

[14] “Antes da instalação do Congresso, Abílio de Nequete recebeu os estatutos do Partido Comunista da Argentina e uma mensagem de R. Vaterland (...) O número 7 do “Movimento Comunista” publicou a mensagem de R. Vaterland, secretários do Bureau Internacional Comunista.” [ROSITO. Op. Cit., 12]

[15] “O Partido aparece com o nome que conserva até hoje de Partido Comunista do Brasil, como inclusive era uma das exigências da Internacional Comunista; usava a sigla PCB; quatro décadas depois, para diferenciar sua sigla do intitulado Partido Comunista Brasileiro, surgido em 1961, passou a usar a sigla PCdoB.” [LIMA, Haroldo. p.11]

[16] Partido Comunista, Estatutos - 1922. In: CARONE, Edgard. O P.C.B (1922-1943) v. I. São Paulo: DIFEL, 1982, p.23.

[17]“A crise ideológica do anarquismo e do sindicalismo (correntes pré-marxistas) significou um avanço importante na formação da consciência de classe do proletariado e de sua orientação política. Este processo conduziu organicamente à criação dos partidos comunistas.” [KOVAL, Bóris. A Grande Revolução de Outubro e a América Latina. São Paulo: Alfa Ômega, 1980, p. 133]

[18] PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL. 50 Anos de Luta. Rio de Janeiro: mimeografado, 1972, p.5.


O Partido Comunista do Brasil no Rio Grande do Sul -1922-1929

 


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