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   Porto Alegre, terça-feira, 16 de abril de 2024

   
A ascensão do nazi-fascismo, a política de apaziguamento e o início da 2ª Guerra Mundial

Raul K. M. Carrion

Neste estudo, analisaremos os acontecimentos do imediato pós-guerra: a nova divisão do mundo – consagrada na “paz de salteadores” de Versalhes –, a ascensão do nazi-fascismo – com a conivência das democracias ocidentais que viram nele um dique à “revolução bolchevique” – e a chamada política de apaziguamento, que desembocou na hecatombe da 2ª Guerra Mundial.

          Essa política de apaziguamento adotada pelas democracias ocidentais frente ao rearmamento alemão e às agressões militares da Alemanha, Itália e Japão, só pode ser compreendida no contexto das contradições inter-imperialistas e das contradições entre o capitalismo e o socialismo.

            Procuraremos fugir tanto das análises psicológicas – que debitam o apaziguamento ao caráter pusilânime de tal ou qual estadista – quanto das análises ingênuas, que vêem a sua origem no louvável esforço das democracias ocidentais em evitar a guerra, a qualquer custo.

            Na verdade, a política de apaziguamento foi uma estratégia consciente e premeditada da Inglaterra, da França e dos Estados Unidos para “empurrar” a Alemanha nazista contra a URSS, visando o enfraquecimento de ambas e a imposição de sua hegemonia sobre o resto do mundo. Mas que acabou voltando-se contra os seus próprios criadores.

            Por fim, examinaremos o contexto em que foi assinado o tratado germano-soviético de não-agressão, apresentado por alguns como o “causador da II Guerra Mundial”. Apesar da historiografia posterior à Segunda Guerra Mundial ter examinado exaustivamente esse tema e ter concluído, de forma quase unânime, pela responsabilidade principal das chamadas democracias ocidentais que incentivaram as forças do Eixo em suas aventuras guerreiras, percebe-se nos dias de hoje uma tentativa de revisão histórica do que já era considerado como um consenso, mesmo entre os historiadores ocidentais.

            Nestes tempos de ofensiva contra o socialismo e de “fundamentalismo de mercado”, tornou-se moda desqualificar toda a experiência soviética – sem diferenciar os seus erros dos seus acertos – mesmo que à custa da mistificação histórica.

            Cabe-nos, como estudiosos da história – sem dobrar-nos à avalanche do “pensamento único” dos dias de hoje – procurar restabelecer a verdade histórica, analisando criticamente os novos argumentos trazidos à discussão, sem medo de corrigir interpretações que tenham envelhecido pela descoberta de novos fatos e cientes de que todo o conhecimento, inclusive o histórico (mas não somente ele), é um processo de aproximação “assintótica” da verdade, com a qual nunca coincide. Por isso mesmo, todo o conhecimento (e não só o histórico) é um processo de permanente construção.

            Desculpo-me pelo grande número de citações, mas o grau de controvérsia que o tema adquiriu nos dias de hoje exige um grande rigor documental no exame desses acontecimentos.

ANTECEDENTES

            Para compreendermos a política de apaziguamento das potências ocidentais – que contribuiu de forma decisiva para a eclosão da Segunda Guerra Mundial – e o paradoxal Pacto Germano-Soviético, é necessário que examinemos os seus antecedentes, aqui incluídas a vitória da Revolução Socialista na Rússia, a nova divisão do mundo após a Primeira Guerra Mundial – através do sistema Versalhes-Washington – e o ascenso do nazi-fascismo, resposta do grande capital ao crescimento das lutas revolucionárias, principalmente dos povos da Europa.

O Sistema de Versalhes

            A 18 de janeiro de 1919, inaugurou-se em Versalhes a conferência dos “vencedores”, para ditarem as condições da paz no pós-guerra. Estavam representados 27 países que, de uma forma ou outra, participaram da aliança contra a Alemanha, a Áustria-Hungria, a Turquia e a Bulgária. Foram excluídas desta conferência tanto a Alemanha e suas aliadas, quanto a Rússia socialista, apesar dela haver participado da guerra ao lado dos aliados. Na prática, três países decidiram sobre o destino da futura paz: Inglaterra, França e Estados Unidos. Após quase quatro meses de discussões, as duríssimas condições da paz foram comunicadas à delegação alemã. Diante da insatisfação alemã e da tentativa de amenizar as condições impostas, os aliados ameaçaram com a ocupação militar. Pressionada, a Assembléia Nacional Alemã autorizou a assinatura do Tratado, por 237 contra 138 votos.

O tratado foi firmado em Versalhes, no dia 28 de junho de 1919. Através dele, além de pesadas indenizações, a Alemanha foi obrigada a renunciar a todas suas colônias, ceder a Alsácia-Lorena à França, a zona de Eupen-Malmedy à Bélgica, o Schleswig setentrional à Dinamarca. Além disso, a Alemanha reconheceu a independência da Polônia e teve que lhe entregar Poznam, a Prússia Ocidental e parte da Alta Silésia. Também perdeu Memel, posteriormente anexado à Lituânia (1923).

Durante 15 anos, o Sarre passaria a ser administrado pela Sociedade das Nações, a qual cedeu a exploração do seu carvão à França. Mas, Dantzig não foi entregue à Polônia, sendo transformada em “cidade livre”. A margem direita do rio Reno foi dividida em três zonas de ocupação, a serem evacuadas no prazo de 5, 10 e 15 anos, e a Alemanha perdeu o controle sobre seus rios navegáveis. Foi obrigada a entregar todo o seu material de guerra e a quase totalidade da sua esquadra, e ficou proibida de possuir encouraçados e submarinos. O seu exército foi limitado a 100 mil homens, e foi proibido de manter um Estado Maior, ter carros de combate, aviões militares, artilharia pesada e antiaérea. As suas fortificações ao leste foram desmanteladas.

            Em 10 de setembro de 1919, foi assinado o Tratado de paz com a Áustria, em Saint Germain-en-Laye. O Império Áustro-Húngaro foi desmembrado, devendo a Áustria reconhecer a independência da Hungria. Pelo Tratado, a Áustria entregou a Boêmia e a Morávia para a Checoslováquia. Perdeu a Dalmácia e a Bósnia-Herzegóvina que – junto com a Sérvia e Montenegro, mais os territórios perdidos pela Hungria – constituirão a Iugoslávia. Entregou o Sul do Tirol, Triestre, Istria, e partes da Dalmácia, Caríntia e Carniola, à Itália. Cedeu a Bucovina à Romênia. Por fim, forneceu os territórios da Galícia ocidental para formar o sul da Polônia do pós-guerra. Pelo mesmo tratado, a Áustria – reduzida a 84 mil km2 e isolada do mar – foi proibida de unir-se à Alemanha e teve o seu exército limitado a 30 mil homens.

            Em 27 de novembro de 1919, foi firmado o Tratado de paz com a Bulgária, em Neuilly. A Bulgária teve que entregar o sul da Drobudja à Romênia, a Macedônia ocidental à Iugoslávia e os seus territórios Trácios à Grécia, perdendo a sua costa no Mediterrâneo. O seu exército foi limitado a 20 mil homens.

            Em 4 de junho de 1920 – depois do sufocamento do Poder Soviético de Bela Kun por tropas francesas, romenas e checoslovacas – foi assinado com a Hungria o Tratado de Trianon, reduzindo o seu território a um terço da sua superfície de 1914 e isolando-a do mar. Por ele, a Hungria foi obrigada a ceder a Eslováquia e a Rutênia à Checoslováquia, e a entregar a Croácia, a Eslovênia e parte do Banato à Iugoslávia. Também teve que ceder a Transilvânia e a outra parte do Banato à Romênia. Proibida de unir-se à Áustria, teve o seu exército limitado a 35 mil homens.

            Em 10 de agosto de 1920, foi assinado o Tratado de paz de Sèvres com a Turquia (não ratificado pelo Parlamento turco). A Turquia foi obrigada a ceder a Trácia oriental, Esmirna e as Ilhas Egéias (exceto Rodes) à Grécia; Síria e Cilícia à França; Iraque, Palestina, Chipre e Egito à Inglaterra (que também obtém o protetorado da Arábia); Rodes e o Dodecaneso à Itália. Ainda lhe foram impostas a independência da Armênia e a autonomia do Curdistão. O seu exército foi limitado a 50 mil homens.

            O ex-Império Russo, derrotado pela Alemanha, convulsionado pela revolução socialista de 1917 e em pleno processo de guerra civil, também foi esquartejado pelos “vencedores”. Em dezembro de 1917, a Romênia monárquica ocupou a Bessarábia. Em 1917, com o decisivo apoio das potências ocidentais e após esmagar pela força das armas o nascente poder operário-camponês, a Finlândia separou-se da futura União Soviética:

A Finlândia moderna nasceu da vontade comum dos partidários do “Ancien Régime” e da burguesia finlandesa e oeste-européia, unidos num pedaço do antigo império do czar. Sem o apoio externo no momento da guerra civil russa, a Finlândia não seria hoje mais que provavelmente uma república socialista soviética como as outras (...). No dia 19 de dezembro de 1917, a Dieta da Finlândia adotara (...) uma declaração de independência. (...) Colocado ante o fato consumado, o Conselho dos Comissários do Povo adotou (...) um decreto confirmando a independência política da Finlândia. (...) O Conselho Executivo Central da Rússia ratificou o decreto de 4 de janeiro de 1918. (...) Stalin (...) declarou então: “Vemos que o Conselho de Comissários do povo deu, sem querer, a liberdade não para o povo, não para os representantes do proletariado da Finlândia, mas à burguesia finlandesa”. (...) Encorajada pelos bolchevistas russos (...) rebentou uma revolução soviética nas zonas industriais do Sul da Finlândia (meados de janeiro de 1918). (...) Os centros importantes (como Helsinque e Viborg) não tardaram em ficar sob controle total dos Sovietes. (...) Em maio de 1918, a insurreição soviética finlandesa foi esmagada após quatro meses e meio de guerra civil.[i]

            E, em março de 1918, a Rússia revolucionária foi obrigada a assinar a paz de Brest-Litovsk com a Alemanha, a Áustro-Hungria e a Turquia:

Em Brest-Litovsk (...) os plenipotenciários da República dos Sovietes viram-se constrangidos a renunciar não só a Livônia, Curlândia, Estônia e Lituânia, mas também a uma Polônia, que claramente extravasava dos seus limites étnicos, e a Ucrânia. (...) Além de abandonar os territórios ocidentais acima mencionados, o governo soviético renunciava igualmente, em proveito da Turquia, a uma importante zona do Cáucaso, que incluía Batoum, Kars e Ardahan. (...) No total, o tratado de Brest-Litovsk implicava para o poder dos Sovietes a perda de alguns milhões de quilômetros quadrados e de mais de quarenta milhões de habitantes.[ii]

            Na ocasião, polemizando com Bukharin, Trotsky e outros, que em nome do internacionalismo proletário exigiam que o governo soviético não assinasse a paz com a Alemanha, Lenin afirmou:

No momento atual, uma guerra verdadeiramente revolucionária seria a guerra da República Socialista contra os países burgueses com o claro objetivo (...) de derrotar à burguesia de outros países. Mas é evidente que no momento presente ainda não podemos nos colocar esta finalidade. Objetivamente, lutaríamos agora pela liberação da Polônia, Lituânia e Curlândia. Mas nenhum marxista, sem apartar-se dos princípios do marxismo e do socialismo em geral, poderia negar que os interesses do socialismo estão acima dos interesses do direito das nações à autodeterminação. Nossa República Socialista fez e continua fazendo todo o possível para levar a prática o direito a autodeterminação da Finlândia, Ucrânia, etc. Mas, se a situação concreta é tal que a existência da República Socialista se acha neste momento em perigo (...) se compreende que os interesses da preservação da República Socialista devam prevalecer.[iii]

O posterior desmoronamento dos exércitos centrais possibilitou, em fins de 1918, a denúncia do acordo de Brest-Litovsk e a retomada do poder pelos bolcheviques na Estônia, Lituânia, Letônia e Ucrânia:

As tropas alemãs evacuam a Estônia, a Letônia, a Bielo Rússia, a Lituânia, a Polônia e a Transcaucásia. Não mais existe Brest- Litovsk e o Exército Vermelho, apertando as tropas germânicas, atinge Narva, Pskov, Vilno, Kovno, Riga (3 de janeiro de 1919) (...) Kharkov e Kiev são ocupadas pelos bolcheviques e na Estônia, na Letônia e na Lituânia constituíam-se repúblicas soviéticas.[iv]

Mas, mais uma vez, a intervenção militar das potências capitalistas impôs ao Poder Soviético uma “paz de salteadores”. Em fevereiro de 1919, os exércitos polacos apoderaram-se de Brest-Litovsk, dando início a guerra russo-polonesa. Em abril de 1920, as tropas polonesas invadiram a Ucrânia e pouco depois tomaram Kiev. Em sua contra-ofensiva, o Exército Vermelho avançou até as portas de Varsóvia, que só foi salva pelas tropas francesas do general Weygand.

Em julho de 1920, através da conferência de Spa, as potências ocidentais propuseram como fronteira entre a Rússia e a Polônia a “Linha Curzon”[v]. Em outubro de 1920 foi estabelecido um armistício e em março de 1921 o Estado Soviético foi obrigado a assinar a paz de Riga, através da qual a Polônia avançou 250 km a leste de sua fronteira étnica[vi] e deslocou a sua fronteira com o Estado soviético 150 km para o Leste, apossando-se da Galícia, da Ucrânia Ocidental, da Bielo-Rússia ocidental e de Vilna, “no total, uma população de 11 milhões de habitantes, dos quais quase dez milhões de bielo-russos, russos ou ucranianos[vii]

Em fins de 1920, o tratado de Dorpat – ao obrigar o governo soviético a reconhecer a Estônia, a Letônia e a Lituânia como estados “formalmente” independentes, mas sob a clara tutela ocidental – “consagrou não somente a fixação das fronteiras mais desfavoráveis que a região de Leningrado tivera algum dia, como amputou também a Rússia setentrional do território de Pétsamo, que nunca estivera incluído (nem antes de 1914, nem em qualquer outra época) no Grão-Ducado ‘Histórico’ da Finlândia.”[viii]

            Com os tratados de paz impostos, consolidou-se a hegemonia francesa no continente europeu, através do avassalamento da Alemanha e de seus aliados. Também foi assegurado o papel dominante da Inglaterra no Oriente próximo e sobre as comunicações marítimas.

            Ao mesmo tempo que buscava esmagar as potências centrais, o sistema de Versalhes teve uma orientação claramente anti-soviética. Além da conferência de paz de Paris ter-se tornado o Estado-Maior da intervenção armada contra o Estado Soviético, os estados imperialistas procuraram formar um “cordão sanitário contra o comunismo”, através da criação da Polônia e dos pequenos estados bálticos e da anexação da Bessarábia à Romênia. Em todos esses países foram instalados governos francamente reacionários:

No tocante à Rússia, que a Conferência ignora oficialmente, os aliados constituíram, para isolá-la, um cordão sanitário de pequenas repúblicas: Finlândia (3.500.000 habitantes), Estônia com 1.250.000 habitantes, Letônia com 1.900.000 indivíduos dos quais 25% são alógenos, Lituânia (2 milhões com 17% de alógenos), cuja organização deverá exigir muitos anos, e de estados médios: Polônia (que conta um alógeno em três habitantes) e Romênia, que compreendem territórios autenticamente russos na Rússia Branca, na Ucrânia e na Bessarábia.[ix]

Momentaneamente derrotadas em suas tentativas de liquidar o Poder Soviético, as grandes potências ocidentais começaram de imediato a armar o tabuleiro de xadrez para as suas futuras jogadas. Em 1921, formou-se a aliança entre a Polônia e a Romênia, contra a Rússia. Em 1922, foi constituída a Entente do Báltico – entre a Polônia, a Estônia, a Letônia e a Finlândia – também voltada contra a URSS: “A Rússia Soviética foi isolada da Europa ocidental mediante um cordão de estados violentamente anticomunistas, arrancados em parte do território russo”. [x]

Diante das tentativas de cercá-lo e isolá-lo, o Estado Soviético respondeu com uma aproximação da Alemanha, assinando em 1922 o Tratado de Rapallo que restabeleceu as relações diplomáticas e, através de um acordo secreto, permitiu a instalação na URSS de fábricas alemãs, para a produção de armamentos proibidos pelo Tratado de Versalhes[xi]:

Lloyd George (...) resolveu convocar uma nova conferência (...) em Gênova em abril de 1922 (...) Os russos e alemães estiveram presentes, mas com a suspeita não injustificada de que iam ser lançados um contra o outro. Os alemães seriam convidados a participar de uma expedição contra a Rússia, e os russos seriam instados a pedir reparações da Alemanha. Ao invés disso, porém, os representantes dos dois países se reuniram secretamente em Rapalo e concordaram em não agir um contra o outro. O tratado de Rapalo torpedeou a conferência de Gênova (....) É certo que impediu uma coalizão européia para uma nova guerra de intervenção contra a Rússia, e é certo também que impediu qualquer renascimento da Tríplice Entente. [xii]

Diante do agravamento da crise da economia alemã – assoberbada pelo pagamento das indenizações de guerra – e do risco de uma revolução social, as potências ocidentais decidiram fortalecer a Alemanha, para opô-la ao “perigo vermelho” do Oriente:

Foi julgado essencial reconstruir e armar o imperialismo alemão contra a União Soviética, ao mesmo tempo que se pretendia manter o rival em cheque. (...) Chamberlain e Churchill (...) representavam as duas metades contraditórias da política externa imperialista britânica, durante este período. De um lado, o desejo de construir (...) uma arma apontada contra a União Socialista Soviética. De outro lado, levar a União Soviética a uma aliança militar, como uma arma contra o imperialismo rival da Alemanha. Ambas as estratégias partiam do princípio de que uma (...) guerra germano-soviética enfraqueceria e destruiria, simultaneamente, as duas principais potências consideradas pela Inglaterra como ameaças ao seu imperialismo. (...) A estratégia de rearmamento alemão de Chamberlain, Munique (...) terminaram em desastre. (...) O objetivo básico muniquista de destruição mútua de Hitler e da União Soviética, com o Ocidente como espectador de primeira fila, para surgir depois como vencedor final e estrangular a revolução na Europa (a explicação dada por Hoare, como embaixador junto a Franco), foi, desse modo, seguida por outros meios. (...) o então Senador Truman (...) proclamou: “Se virmos que a Alemanha está ganhando a guerra, teremos de ajudar a Rússia e, se a Rússia estiver a ganhar, teremos de ajudar a Alemanha, e, entretanto, deixemos que eles se matem tanto quanto possível”. (New York Times, 24 de julho de 1941).[xiii]

Um dos precursores dessa idéia foi o general alemão Max Hoffmann que já em 1922 afirmou:

Nenhuma potência européia pode conceder a outra uma influência preponderante sobre a futura Rússia. Este problema só pode ser resolvido pela União dos grandes Estados europeus, principalmente a França, a Inglaterra e a Alemanha. É preciso que, por uma intervenção militar, essas potências aliadas derrubem o poder soviético e restabeleçam a situação na Rússia, no interesse das forças econômicas inglesas, francesas e alemãs. A participação financeira e econômica dos Estados Unidos da América seria preciosa.[xiv]

Para isso, foi criado em 1924 o Plano Dawes, investindo grande quantidade de capitais – sobretudo norte-americanos (cerca de 70%), mas também ingleses – na Alemanha. O que, contraditoriamente, pouco a pouco lhe permitirá recuperar e ampliar o antigo potencial econômico-militar. A Conferência de Locarno (1925) estabelece diversos acordos bilaterais com a Alemanha, em uma tentativa de melhorar as suas relações com as potências ocidentais. Em 1926, ela foi admitida na Sociedade das Nações, inclusive no seu Conselho de Segurança. Começou a desenhar-se no horizonte a futura tática de utilização da Alemanha como um dique contra a URSS e a revolução socialista: “Toda a história do tratado de paz de Versalhes, desde o momento da sua assinatura até o início da Segunda Guerra Mundial, constituiu na destruição gradual do sistema de Versalhes e no incitamento da Alemanha, pelas potências ocidentais, à agressão contra a URSS.[xv]

Uma das cláusulas do Tratado de Versalhes estabelecia a criação da Sociedade das Nações, sob o pretexto de defender a paz e a segurança internacional, prevendo a aplicação de sanções econômicas, financeiras e militares ao país que cometesse uma agressão. Na realidade a Sociedade das Nações transformou-se em um dos centros da luta militar e diplomática contra o Estado Soviético e em um instrumento da política imperialista e colonial das grandes potências, especialmente a França e a Inglaterra.

Assim – sob o argumento de que os povos das colônias arrebatadas à Alemanha e à Turquia eram incapazes de se autogovernarem – a Sociedade das Nações entregou à França (sob mandato) a Síria, o Líbano, o Togo e uma parte do Camerum; à Inglaterra, a Palestina, a Transjordânia, o Iraque, Tanganica e outros territórios; ao Japão, as Ilhas Marianas, Carolinas e Marshall. Como o Senado dos Estados Unidos se negou a ratificar o Tratado de Versalhes, estes não se incorporaram à Sociedade das Nações. Na prática, ela nunca impôs, durante toda a sua existência, qualquer sanção a um país agressor (em geral, alguma potência imperialista) nem prestou qualquer ajuda a uma nação agredida.

Os acordos de Washington

            Durante a Primeira Guerra Mundial, o Japão havia consolidado as suas posições na China, em detrimento dos interesses dos outros países imperialistas, em especial os Estados Unidos e a Inglaterra. Havia imposto à China acordos que lhe proporcionavam grandes privilégios econômicos e políticos, e assumira o domínio de Tsa-Chou, do porto de Tsing-Tao e das concessões alemãs na península de Chantung. A ratificação desses “direitos” pela conferência de paz de 1919, em Paris, foi uma das razões da não ratificação do Tratado de Versalhes pelos norte-americanos. Desde então, os Estados Unidos pressionaram pela revisão das resoluções da conferência de paz de Paris, quanto ao Extremo Oriente.

Na conferência de Washington, realizada entre novembro de 1921 e fevereiro de 1922, participaram nove países, entre os quais os Estados Unidos, a Inglaterra, a França, a China e o Japão. Mais uma vez foi negado ao Estado Soviético a participação em suas deliberações. Desta conferência resultaram quatro acordos que complementaram os Sistema de Versalhes. O primeiro deles, o Pacto Naval, determinou a tonelagem máxima de cada potência e tinha por objetivo limitar a expansão da armada japonesa. Fixou 525 mil ton. para as esquadras inglesa e norte-americana, 315 mil ton. para a japonesa e 175 mil ton. para a francesa e a italiana. O Tratado de Chantung obrigava o Japão a retirar-se da Sibéria soviética e das regiões de Chantung e Kiaochow, na China.

O Tratado das Quatro Potências – Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e Japão – mantinha o status quo no Pacífico. Já o Tratado das Nove Potências, reconhecia a independência e a inviolabilidade territorial da China, mas impunha à China uma política de portas abertas para todas as nações do mundo (o que interessava diretamente aos Estados Unidos, que haviam chegado tarde à repartição da China e nela não possuíam concessões). Os acordos de Washington representaram um fortalecimento fundamentalmente dos Estados Unidos e um debilitamento do Japão, complementando o sistema de tratados de Versalhes.

A ascensão do nazi-fascismo

            A revolução russa de 1917, além de dar origem ao primeiro Estado Socialista do mundo, acelerou enormemente os processos revolucionários em todos os países e a luta anti-colonial. As revoluções alemãs de 1918, 1919 e 1923; a insurreição finlandesa de 1918; a criação da República Soviética Húngara em 1919; a greve insurrecional de 1917 em Turim, e a greve geral de 1920 em toda a Itália, seguida da ocupação das fábricas; a revolta da armada francesa do Mar Negro, em 1919, o aumento do movimento grevista na França e na Inglaterra; a criação da Internacional Comunista em 1919 e o surgimento de Partidos Comunistas nos principais países; enfim, a crescente simpatia da classe operária e dos povos coloniais pela URSS criou uma situação de profunda crise para o sistema capitalista. Diante dessa crise – ao mesmo tempo econômica, política e social – o grande capital, deixando de lado quaisquer veleidades democráticas, optou por governos autoritários, de caráter fascista.

            Em 1922, Benito Mussolini – após a Marcha sobre Roma – foi chamado pelo rei para formar o governo e instaurou o fascismo na Itália, com o beneplácito do grande capital, do Vaticano e das democracias ocidentais: “Quando o sr. Mussolini organizou o fascio, o que ele tinha em vista, antes de mais nada, era combater o comunismo. (...) Foi esta, toda gente o sabe, a quintessência moral, a força motriz política, a síntese social do fascismo. Assim ele se apresentou à face da Itália, assim o compreendeu o mundo (...) O fascismo existia como um antídoto do comunismo.”[xvi].

            Três anos depois toda e qualquer oposição foi banida na Itália, “não obstante, Ramsay MacDonald escreveu cartas cordiais a Mussolini – no momento do assassinato de Matteotti. Austen Chamberlain e Mussolini trocaram fotografias. Winston Churchill o elogiou como salvador de seu país e grande estadista europeu.[xvii]

            Em 1923, o general Primo de Rivera impôs uma ditadura militar na Espanha, enquanto que na Bulgária se instalou o governo Zankov, fruto de outro golpe militar. Na Alemanha, Hitler e Lüdendorff conclamaram em Munique à Marcha sobre Berlim, mas foram desbaratados. Em 1926, Polônia, Portugal e Lituânia substituíram a democracia liberal por regimes autoritários. Em 1929, a Iugoslávia sofreu o auto-golpe de estado do rei Alexandre.

A crise de 1929 – cujos efeitos viriam a se estenderam pelo menos até 1933 – teve como conseqüência o acirramento das lutas sociais e o reforço das tendências fascistas do grande capital em todo o mundo, em especial na Europa:

Diante da amplitude sem precedentes da crise capitalista (crise financeira, econômica, social e política), os grandes interesses mundiais procuram soluções urgentes. O ponto mais ameaçado é a Alemanha, segunda potência industrial do mundo, onde dez milhões de desempregados deslizavam para os partidos de extrema esquerda, preparando uma revolução proletária que viria a apoiar a União Soviética (...) Certamente as teorias nebulosas, medievais, místicas e anti-semitas de Adolf Hitler chocavam os liberais, mas, diante do progresso dos partidos de esquerda, uma Frente de Direita se cria no mundo e dentro de cada país. (...) A ação política dos grupos Krupp, Thyssen (alemães), Schneider e De Wendel (franceses) ultrapassa, e de longe, a dos partidos políticos. O cartel decide apoiar o Partido Nazista (...).A tomada do poder na Alemanha pelos nazistas, permitirá o rearmamento de uma Alemanha frustrada, a absorção de dez milhões de desempregados, a destruição dos partidos de esquerda e seus sindicatos, a modernização de um novo exército alemão, o único capaz de afrontar a União Soviética. (...) Na Inglaterra, o grupo de Cliveden, dirigido por Lord e Lady Astor, Neville Chamberlain e Lord Halifax, apoia os projetos do grupo franco-alemão. (...) Na Suécia, na Suíça, na Bélgica, na Holanda, na Dinamarca, apesar das reticências, os grupos do aço, do carvão, se aliam.[xviii]

Em 1932, formou-se o governo Salazar em Portugal e a Lituânia tornou-se um Estado autoritário, de partido único. Em 1933, depois de uma vitória eleitoral, Hitler foi nomeado chanceler, assumiu o poder e – em nome do nacionalismo e do anticomunismo – implantou o nazismo na Alemanha. No mesmo ano, Dollfus deu um golpe de estado e instaurou uma ditadura marcadamente fascista na Áustria. Em 1934 foram instalados governos ditatoriais na Estônia (Konstantin Paets) e na Letônia (Karlis Ulmanis).

Na França a tentativa de golpe fascista dos bandos armados dos Croix de Feux e dos Cavaleiros do Rei foi derrotada pela resistência popular. Em 1936, o general Franco - com o apoio da Alemanha e da Itália - levantou-se contra o governo republicano, dando início à guerra civil espanhola. Nesse mesmo ano, o general Metaxas deu um golpe de estado na Grécia. Salvo a França e alguns países Escandinavos, praticamente toda a Europa continental ficou submetida a governos fascistas ou filo-fascistas. Mesmo nos países onde a democracia liberal se manteve, importantes setores das classes dominantes passaram a olhar com simpatia o fenômeno fascista. No Japão, o primeiro ministro Konoye Fuminaro proclamou em 1938 a instauração de uma “Nova Ordem” na Ásia Oriental, fechou os partidos políticos e criou o partido único em 1940.

A POLÍTICA DE “APAZIGUAMENTO”

            Considera-se o 1º de setembro de 1939 – dia do início da invasão da Polônia pela Alemanha – como a data do início da 2ª Guerra Mundial. Mas, pode-se dizer que, de certa forma, esta já havia iniciado bem antes, através de uma série de agressões pontuais, entre 1931 e 1939, só tendo se ampliado com o ataque à Polônia.

O primeiro elo dessa corrente de agressões ocorreu em setembro de 1931, quando o Japão invadiu a Mandchúria, no Nordeste da China e na fronteira com a URSS. O governo de Chiang Kai-chek, em luta contra os comunistas chineses, não ofereceu uma resistência efetiva aos invasores japoneses, que criaram no território ocupado a República “independente” do Mandchuko, colocando a sua frente um governo fantoche. A China apelou à Sociedade das Nações e às democracias ocidentais, que nada fizeram: “A Grã-Bretanha, preocupada pela depressão econômica, se negou a prestar o seu apoio às sanções contra o Japão.”[xix] Os EUA, diretamente atingidos por essa expansão japonesa (que contrariava frontalmente as resoluções da Conferência de Washington), também aceitaram a ocupação japonesa. Na ocasião, o Presidente norte-americano Hoover assim explicou a sua postura:

Se os japoneses nos tivessem declarado diretamente: “Não podemos mais observar acordos [de Washington, G.D.] por que a ordem não foi restabelecida na China. A metade da China foi bolchevizada e colabora com a Rússia (…) Nossa existência estará ameaçada se tivermos por vizinho, ao Norte, a Rússia bolchevista e, nos flancos uma China que pode ser bolchevizada, (…) dêem-nos a possibilidade de restabelecer a ordem na China e nós seremos obrigados a fazê-lo para nossa defesa (…)” A esta proposta a América não poderia, certamente, apresentar sérias objeções.[xx]

            Ficava claro que tanto a Sociedade das Nações (França, Inglaterra, Itália, Japão) como os Estados Unidos – apesar do seu discurso em defesa da autonomia dos povos e em defesa da paz – moviam-se unicamente em função de seus interesses estratégicos e o grande inimigo a isolar era a URSS.

            A ascensão de Hitler ao poder na Alemanha, em 1933, também pode ser considerada como mais um passo no rumo da 2ª Guerra Mundial. Apesar disso, contou com a decidida simpatia das elites dirigentes e o apoio do grande capital das principais democracias capitalistas que consideravam que “a Alemanha deveria se tornar a potência dominante sobre o continente europeu e que o nacional-socialismo era a única barreira contra o comunismo.”[xxi] Aliás, Hitler soube jogar magistralmente com a histeria anticomunista da burguesia mundial, arrancando-lhe concessões crescentes em nome do “combate ao bolchevismo”:

Quando Hitler pretendeu restabelecer as disposições de Brest-Litovsk, pôde posar também como defensor da civilização européia contra o bolchevismo e o perigo vermelho. Talvez suas ambições estivessem realmente limitadas ao Leste (...) Contra todas as expectativas, Hitler viu-se em guerra com as potências ocidentais, antes de ter conquistado o Leste. Não obstante, a expansão naquele sentido era a finalidade primordial, e talvez única, de sua política.[xxii].

            Já em 1924, no penúltimo capítulo de Mein Kampf – intitulado “Orientação para leste ou política de leste” – Hitler afirmara:

Nós, os nacionais-socialistas (…) Fazemos parar a eterna corrente germânica em direção ao sul e ao ocidente da Europa e lançamos a vista para as terras de leste. (…) Quando, hoje em dia, falamos, na Europa, de nosso solo, pensamos, em primeira linha, somente na Rússia e Estados adjacentes, a ela subordinados. O próprio destino parece querer nos indicar a direção. O destino ao abandonar a Rússia ao bolchevismo, roubou ao povo russo a classe educada que criara e garantira a sua existência como Estado. (…) Devemos enxergar no bolchevismo russo a tentativa do judaísmo, no século vinte, de apoderar-se do domínio do mundo. (…) Não é a orientação para o Ocidente e para o Oriente que deve ser o futuro objetivo de nossa política externa e, sim, a política do Oriente necessária ao nosso povo.[xxiii]

            Deixando claro o sentimento das democracias ocidentais em relação ao nazismo, o primeiro ministro inglês Baldwin diria na época: “Todos nós temos conhecimento do desejo da Alemanha de avançar em direção ao Leste, exposto por Hitler no seu livro. Se avançasse para o Leste, o meu coração não se partiria... Se na Europa surgisse uma disputa, eu gostaria que fosse entre os bolcheviques e os nazistas. [xxiv]

O rearmamento alemão

            Em março de 1935, a Alemanha declarou formalmente que não reconhecia mais as restrições militares do Tratado de Versalhes, ampliou as suas forças terrestres para 12 corpos de exército e 36 divisões, criou a sua Força Aérea e restabeleceu o serviço militar obrigatório. As “potências” ocidentais e a Sociedade das Nações, afora tímidas notas formais de protesto, nada fizeram. Na Inglaterra, essa política de fortalecimento militar da Alemanha correspondia à política do chamado grupo de Cleveden – organizado por Neville Chamberlain, Lord Halifax e o casal Astor – que considerava ser “necessário criar uma frente das potências capitalistas, onde o Império Britânico e a França exerceriam seu poder nos impérios coloniais, e à Alemanha caberia a tarefa de dominar a Europa centro-oriental, destruindo o Estado Soviético e o movimento operário no continente.”[xxv] Como anotaria em suas Memórias  Ernst Heinkel, o construtor de aviões nazista:

Os políticos desses países, que de início haviam condenado o armamento da Alemanha, incentivaram-na, eles próprios, a armar-se, e (…) alguns anos mais tarde, engenheiros e militares desses países vieram consultar os técnicos alemães sobre a forma de acelerar a participação da Alemanha no armamento da Europa, afastando as restrições impostas.[xxvi]

            Explorando o anticomunismo, Hitler assinou em janeiro de 1934 um pacto de não-agressão com a Polônia de Pilsudski (que tinha o general Beck como Ministro do Exterior):

Tudo o que se conhece do pacto firmado entre a Polônia e a Alemanha demonstra que se trata de um pacto de agressão que serve aos fins da preparação da guerra. (...) ao firmar este pacto, o fascismo polaco adere ao plano criminoso de invasão e de colonização da Ucrânia Soviética. (...) Este acordo teve como conseqüência direta um agravamento da ameaça contra as fronteiras checas, contra a independência da Checoslováquia e tornou mais aguda a agressividade do fascismo alemão em sua luta para por fim à independência dos países bálticos. Aguçou, igualmente, até o extremo a questão austríaca. Depois de haver destruído a aliança franco-polaca (...) quer obter a desagregação da pequena Entente e substituí-la na Europa central por um novo bloco de potências fascistas, cujo eixo o formariam a Polônia, a Hungria e a Bulgária. Os fascistas alemães tratam, também, de atrair para esse bloco a Iugoslávia, prometendo-lhe uma parte dos territórios austríacos, assim como se esforçam em modificar a orientação da política exterior da Rumânia.[xxvii]

            Em 2 de maio de 1935, com o objetivo de satisfazer a opinião pública francesa, Pierre Laval assinou um pacto franco-soviético, mas não demonstrou a mínima vontade de concretizá-lo: “Foi necessário mais de um ano ao Governo francês para conseguir a ratificação do tratado de 1935 e depois o mesmo governo evitou a elaboração de uma convenção militar, que seria a conseqüência lógica do tratado.” [xxviii] Na verdade, “o que [Laval] desejava era uma aliança com a Itália fascista (...) e uma espécie de entendimento com a Alemanha nazista, para poupar à França nova agressão vinda da outra margem do Reno, e ainda fazer Hitler voltar seus anseios de agressão para leste, isto é, para Rússia.”[xxix]

            Em junho de 1935, depois de intensas negociações secretas, à revelia da França e transgredindo o Tratado de Versalhes, foi assinado o Acordo Naval Anglo-Germânico, pelo qual a Alemanha obteve o direito de quadruplicar a sua frota, até atingir 35% do poderio marítimo inglês, e de construir submarinos:

A limitação da frota alemã a um terço da inglesa permitia à Alemanha empreender um programa de novas construções que fariam trabalhar os seus estaleiros com máxima atividade pelo menos durante dez anos. (...) Se autorizou a Alemanha a lançar cinco couraçados, dois porta-aviões, 21 cruzadores e 64 destróiers.[xxx]

            O objetivo de fortalecer militarmente a Alemanha para torná-la um dique contra a URSS não podia ser mais claro e “o embaixador americano em Berlim considerou o pacto anglo-alemão como um passo a mais na política de cerco à União Soviética.”[xxxi]

            Nesse mesmo ano, o Sarre, com seus imensos recursos, foi reincorporado à Alemanha, reforçando o seu poderio econômico-militar.

            Em agosto de 1935, Jorge Dimitrov, em seu Informe ao VII Congresso da Internacional Comunista, afirmou: “a chegada ao poder do fascismo não é uma simples mudança de um governo burguês por outro, mas a substituição de uma forma estatal de dominação de classe da burguesia – a democracia burguesa – por outra forma, a ditadura terrorista declarada”.[xxxii] Para enfrentar essa ameaça, conclamou à formação de frentes únicas operárias e – tendo estas por base – de frentes populares antifascistas. Da mesma forma, definiu a Alemanha como o principal inimigo da paz, junto com o Japão e a Itália.

            Tendo em vista que a agressão fascista ameaçava outros países, além da URSS, o VII Congresso concluiu que “a guerra que a burguesia desse país travar para repelir esse ataque pode tomar o caráter de uma guerra de libertação, na qual não podem deixar de intervir a classe operária nem os comunistas do país em questão.”[xxxiii]

Agressão à Abissínia, militarização da Renânia, Guerra Civil Espanhola, ocupação da Mandchúria

            Encorajada por tanta impunidade, a Itália lançou as suas tropas, em outubro de 1935, contra a Abissínia, violando os Estatutos da Sociedade das Nações. Esta – após o plano Hoare-Laval que entregou a metade da Abissínia para a Itália – determinou unicamente um embargo comercial parcial, autorizando a venda à Itália de petróleo e outros produtos vitais para a sua ação militar:

se elaborou um imponente quadro de proibições. Mas o petróleo, necessário para atuar na Abissínia, continuou sendo enviado. (...) Se proibiu a exportação de alumínio à Itália, mas, por casualidade, este era o único metal produzido pela Itália em quantidades superiores às suas necessidades. (...) se impediu o envio à Itália de limalha e mineral de ferro (...) não se vedou o envio de lingotes de ferro e aço. A Itália não sofreu nenhum estorvo. De forma que as aparatosas sanções não tinham por objetivo paralisar o agressor, mas de fato o estimulavam a agir.[xxxiv]

            Em maio de 1936, depois de massacrar a população abissínia, inclusive com o uso de gases tóxicos, as tropas italianas entraram em Addis-Abeba e proclamaram Victor Emmanuel III imperador da Etiópia.

            Em março de 1936 – transgredindo abertamente o tratado de Versalhes – a Alemanha ocupou a Renânia desmilitarizada, com somente três batalhões, chegando até a fronteira franco-alemã. A França esboçou a mobilização de 12 divisões, mas antes consultou se a Inglaterra também agiria. Diante da resposta negativa, nada fez, apesar da superioridade absoluta de forças que tinha sobre a Alemanha. Também os Estados Unidos deram o seu beneplácito a mais essa investida nazista. Atemorizada, a Bélgica retirou-se do Pacto de Locarno e da aliança com Grã-Bretanha e França, e declarou-se neutra. No mesmo ano, a Alemanha deu início à construção na Renânia da Linha Sigfried.

            Em julho de 1936, o general Franco colocou-se à frente de um levante de caráter fascista contra o governo republicano da Espanha, com total apoio da Itália e da Alemanha:

Em 28 de julho de 1936, no início do conflito, quando parecia que Franco não poderia transportar seus mouros e legionários de Marrocos à península, Hitler lhe enviou 30 aviões Junker de transporte para cruzar o estreito. Esta ajuda foi seguida por um rio de munições, canhões, tropas, aviões, pilotos e mecânicos, enviados com o beneplácito de Hitler e Mussolini. Em 1937, Franco tinha sob o seu mando 30.000 soldados italianos e 12.000 alemães. Chegou a ter até 100.000 soldados italianos. O Papa também prestou a sua ajuda espiritual a Franco “este leal filho da Igreja”. As tropas italianas que embarcavam para a Espanha recebiam a benção papal antes de abandonar o solo italiano.[xxxv]

            Tão logo iniciou a guerra civil espanhola, a França, a Inglaterra, a Alemanha e a Itália criaram um hipócrita Comitê de Não Intervenção – que colocava em pé de igualdade o legítimo governo da República e os militares rebelados – e que fazia “olhos de mercador” à intervenção aberta da Alemanha e da Itália em favor dos fascistas espanhóis. Enquanto estas duas potências do Eixo inundavam a Espanha com suas armas e tropas, a França, a Inglaterra e os Estados Unidos se negavam a vender armas ao governo republicano, sob o pretexto de “não intervenção”, e ainda impunham esse embargo ao resto do mundo.

            Só a União Soviética – apesar do seu isolamento, e dos riscos que isto envolvia – ousou romper esse bloqueio que as “democracias liberais” e o nazi-fascismo impuseram ao governo republicano da Espanha, fornecendo-lhe apoio material e político: “De 1936 a 1937, a União Soviética forneceu ao governo legítimo da Espanha 806 aviões de guerra, 362 carros de combate, mais de 100 veículos blindados, 1.555 peças de artilharia, 15.113 metralhadoras, cerca de 500.000 fuzis, mais de 4.000.000 projéteis e outros equipamentos de guerra.[xxxvi]

            Depois de longos três anos de luta – durante os quais antifascistas de todo o mundo combateram lado a lado com o povo espanhol nas famosas brigadas internacionais – a Republica Espanhola foi derrotada em março de 1939.

            Em outubro de 1936, a Alemanha e a Itália criaram um bloco militar denominado “Eixo Berlim-Roma”:

se concretizou (...) o “eixo” Roma-Berlim, ostensivamente destinado à luta contra o bolchevismo (...) colocando a URSS como objetivo capaz de justificar todas as concessões. Os estadistas franceses e ingleses vislumbraram no fantasma do comunismo o pretexto para explicar a tolerância com que admitiam o fortalecimento dos dois ditadores, na esperança de que eles chamariam a si a tarefa de opor uma barreira à expansão soviética.[xxxvii]

            Em novembro do mesmo ano, a Alemanha e o Japão assinaram o Pacto Anticomintern que – para ganhar a simpatia dos círculos dirigentes da Inglaterra e da França – conclamava à luta comum contra as atividades da Internacional Comunista, dentro e fora dos seus países. Em 1937, a Itália aderiu a ele. Em abril de 1939, um mês após a sua vitória, Franco fez o mesmo:

Os jornais reacionários franceses, desde o cauteloso Le Temps ao viperino Gringoire, saudaram o pacto Anticomintern dizendo que era “um elemento poderoso para a segurança da França”. Logo que o bolchevismo – era assim que designavam a Frente Popular espanhola – fosse esmagado na Espanha, o Führer voltar-se-ia para a Rússia Soviética. [xxxviii]

Quando o pacto Anticomintern levantou as idéias políticas (...) personalidades dos dois países democráticos também sentiram a atração do anticomunismo. Inclinavam-se à neutralidade entre o fascismo e o comunismo ou, talvez, mesmo para o lado fascista (...) Quando um governo de Frente Popular se organizou, os franceses conservadores e ricos não disseram apenas: “Melhor Hitler do que Stalin”, mas “Melhior Hitler que León Blum” [xxxix]

            Em julho de 1937, o Japão – que já ocupara impunemente a Mandchúria – lançou-se sobre o resto da China. Uma a uma, foram caindo as principais cidades chinesas: Nanquim (dezembro de 1937), Cantão (outubro de 1938), Hankow (outubro de 1938). Virtualmente derrotada a resistência de Chiag-Kai-chek, os japoneses impuseram o governo fantoche pró-japonês de Wang Ching-Wei.

            Em fevereiro de 1939, foi tomada a ilha de Hainan, posição estratégica para um posterior assalto à Indochina francesa. Washington e Londres se limitaram a enviar notas formais de protesto a Tóquio, enquanto na prática contribuíam para o esforço de guerra japonês. Segundo Herrera, “as estatísticas revelam que 60% do petróleo, sucata, aviões, viaturas e outros equipamentos militares utilizados pelo Japão contra a China eram oriundos dos Estados Unidos, cabendo a Inglaterra contribuir com mais 20%.[xl]

            Mais uma vez, a URSS foi o único país a opor-se a essa agressão: “Entre 1938 e 1939, a URSS concedeu à China créditos totalizando uns 250 milhões de dólares norte-americanos, fornecendo-lhe, por conta desse valor, em torno de 900 aviões, 82 tanques, cerca de 1.200 canhões e obuses, mais de 9.500 metralhadoras, etc.[xli] Na verdade, as “aspirações expansionistas do Japão não encontraram resistência por parte dos círculos imperialistas dos EUA, da Inglaterra e da França, que contavam aproveitar a possibilidade que se lhes oferecia para reprimir o movimento revolucionário na China e atacar a União Soviética.”[xlii] Dando razão a esses círculos, em 1938 o Japão empreendeu um ataque armado direto à URSS, a partir da Mandchúria, na região do lago Khassan, mas foi contido e derrotado.

A anexação da Áustria

Dentro da estratégia das democracias ocidentais de incentivar a expansão da Alemanha nazista para o leste e de lançá-la contra a União Soviética, a França e a Inglaterra passaram a sinalizar o seu beneplácito em relação às pretensões de Hitler quanto à Áustria, à Checoslováquia e a Dantzig, desde que não fosse usada a violência. Em novembro de 1937, Lord Halifax entrevistou-se com Hitler:

Halifax disse tudo o que Hitler esperava ouvir. Elogiou a Alemanha nazista “como o baluarte da Europa contra o bolchevismo”, e evidenciou simpatia para com as reivindicações alemãs. Deteve-se particularmente em certas questões onde “alterações possíveis poderiam estar destinadas a se resolverem com o passar do tempo.” Eram Dantzig, Áustria a Checoslováquia. “A Inglaterra está interessada em que qualquer alteração se faça por meio da evolução pacífica e se evitem métodos que possam causar perturbações de longo alcance.” (...) As observações de Halifax (...) eram um convite a Hitler para promover a agitação nacionalista alemã em Dantzig, Checoslováquia e Áustria, e uma garantia de que a agitação não encontraria resistência externa. Tais insinuações não foram feitas apenas por Halifax. Em Londres, Eden disse a Ribbentrop: “O povo da Inglaterra reconhece que uma maior aproximação entre a Alemanha e a Áustria terá de ocorrer algum dia”. As mesmas notícias vinham da França. Papen, numa visita a Paris, “surpreendeu-se ao notar” que Chautemps, o ‘premier’, e Bonnet, então Ministro das Finanças (...) não tinham objeções a uma acentuada ampliação da influência da Alemanha na Áustria”, obtida através de “meios evolucionários”, nem na Checoslováquia “na base da reorganização numa ação de nacionalidades”.[xliii]

            Estavam preparadas as condições para que o ano de 1938 ficasse gravado na história como o ano da anexação da Áustria e da capitulação de Munique. Essas ações foram precedida de uma intensa atividade diplomática por parte de Hitler:

Já em novembro de 1937, recebera da Inglaterra garantias nesse sentido. Elas foram confirmadas por Henderson, embaixador britânico em Berlim. A 3 de março de 1938, Henderson informou a Hitler, em caráter estritamente confidencial, que era favorável ao Anschluss [V. Documentos e Materiais das Vésperas da Segunda Guerra Mundial, t.. I, Moscou 1948, p. 70]. Em começos de 1938, durante suas entrevistas em Berlim com o ex-presidente dos Estados Unidos Herbert Hoover, Hitler recebera as mesmas garantias. (…) em setembro de 1937 Hitler obtivera o consentimento de Mussolini para essa operação. (…) A Áustria estava entregue aos nazistas.[xliv]

            Agora só faltava o golpe de misericórdia. Depois de ordenar a Seyss-Inquart, chefe dos nazistas austríacos que intensificasse as agitações pró-Alemanha na Áustria, Hitler mandou chamar o chanceler Schuschnigg, a quem ameaçou com uma imediata invasão do país e apresentou um ultimato:

todos os austríacos tinham que aceitar a doutrina do nacional-socialismo; os nazistas austríacos poderiam se dedicar sem impedimento algum a suas “atividades legais”; todos os nazistas encarcerados, inclusive os assassinos de Dollfuss, tinham que ser postos em liberdade; havia que nomear Seysss-Inquart ministro do Interior, e o exército austríaco tinha que aceitar imediatamente no seu seio a uma centena de oficiais do exército alemão. Depois de dez horas (…) Schuschnigg aceitou a maioria das exigências, acrescentando que desejava esclarecer alguns pontos com o presidente Wilhelm Miklas.[xlv]

            De volta à Áustria, Schuschnigg convocou um plebiscito para 13 março de 1938 para decidir sobre o futuro da Áustria. Furioso, Hitler exigiu que o plebiscito fosse suspenso e ordenou a Wehrmacht que se mantivessem pronta para invadir a Áustria. Abandonado pelas democracias ocidentais, Schüschnigg capitulou, afirmando na radio que “tivemos que inclinar-nos ante a força, pois não estamos dispostos, sequer nesta terrível situação, a derramar sangue alemão. Ordenamos ao exército austríaco que se retire, sem oferecer resistência.[xlvi]

            A meia noite do dia 11 de março de 1938, Seyss-Inquart foi nomeado chanceler da Áustria, momento em que as primeiras unidades alemãs já estavam cruzando a fronteira. Ao meio dia Viena foi ocupada pelas tropas da Alemanha. O presidente Miklas se demitiu. Schuschnigg foi mantido encarcerado durante 17 meses. Hitler declarou a Áustria nova Land (província) do Reich sob o nome de Ostmark, tendo Seyss-Inquart como regente:

País capitalista algum protesta, nem mesmo pró forma, contra este ato de agressão A Inglaterra e a França reconhecem imediatamente a anexação. Os Estados Unidos fecham a embaixada em Viena e a substituem por um Consulado. O Vaticano tampouco se opõe à ocupação da Áustria católica.[xlvii]

            Diferentemente das democracias liberais, a URSS condenou a agressão e conclamou todos a se oporem aos invasores. A resposta foi a contemporização com o agressor:

Quando em 18 de março, a União Soviética solicitou que se adotasse uma ação coletiva contra aquela evidente agressão, o primeiro-ministro Neville Chamberlain, replicou timidamente que ele não queria estabelecer “um grupo exclusivo de nações que torpedeasse as perspectivas de paz na Europa.” As sombras do apaziguamento começaram a estender-se sobre a Europa.[xlviii]

            Com a ocupação da Áustria, a Alemanha dava mais um importante passo para a guerra. Além de aumentar sua “Grande Alemanha” em mais de 6.500.000 habitantes, no terreno estratégico Hitler havia tomado a chave do sistema de comunicações do Danúbio, estabeleceu fronteiras com a Itália e cercou a Checoslováquia. Como expôs Jodl, chefe do Gabinete de Operações do Grande Quartel-General Alemão:

A Anschluss permitiu, por sua vez, atingir não somente um antigo objetivo nacional, mas teve como resultado um crescimento de nossa capacidade de combate e um melhoramento notável de nossas posições estratégicas. Se até então o território da Checoslováquia avançara ameaçadoramente dentro da própria Alemanha, (“Ferrão de vespa” em direção da França e base aérea para os aliados, sobretudo para a Rússia), agora a Checoslováquia se acha presa nos dentes de uma tenaz.[xlix]

A capitulação de Munique

            Os círculos mais reacionários da Inglaterra – tomados pela miopia, e preocupados somente em dirigir o avanço alemão para o Leste – passaram a incentivar novos atos de agressão da Alemanha. Já no dia 14 de março de 1938, o jornal britânico The Daily Express afirmava: “A ocupação da Áustria pela Alemanha não muda nada. Afinal de contas a Áustria era um país germânico mesmo antes de Hitler enviar para lá suas tropas. Devemo-nos ocupar de nossos próprios negócios. A Checoslováquia não nos interessa.[l] Em 16 de abril de 1938, foi firmado o acordo anglo-italiano, dando carta branca aos italianos na Abissínia e total liberdade para agirem em favor de Franco na Espanha, em troca dos bons ofícios italianos na Europa Central. Em carta a Eden, Churchill comentaria:

O pacto italiano é, desde logo, um completo triunfo para Mussolini, já que aceitamos (...) que consolide a sua conquista da Abissínia e que execute violências na Espanha. (...) Eu creio que o pacto anglo-italiano seja só um primeiro passo, e que o segundo consistirá em uma tentativa de barganhar com Alemanha um tratado ainda mais enganador que adormeça ao público britânico enquanto permite crescer as forças armadas alemãs e desenvolverem-se os planos da Alemanha no Leste da Europa. Na semana passada, Chamberlain disse em segredo (...) que “não abandonava a esperança de alcançar acordos semelhantes com Alemanha”.[li]

            Estava aberto o caminho para a agressão à Checoslováquia. Em maio de 1938, alegando perseguição aos alemães que viviam nos Sudetos, Hitler faz ameaças e deslocou tropas para a fronteira checa. Estes respondem concentrando 400.000 homens na fronteira e receberam o apoio da União Soviética, da Inglaterra e da França. Hitler recuou momentaneamente, mas orientou Henlein, o chefe nazista nos Sudetos, a intensificar as ações dos seus seguidores. Ao mesmo tempo, intensificou as pressões diplomáticas sobre a França e a Inglaterra. Temeroso, Chamberlain – em acordo com a França – enviou Lord Runciman a Praga, na qualidade de árbitro oficioso.

            Pressionados por Runciman, os checos fizeram grandes concessões: concordaram em dividir a Checoslováquia em cantões (como a Suíça), garantir a participação proporcional de todas as nacionalidades no governo e na direção das empresas do Estado, conceder de empréstimos aos Sudetos para melhorar a sua situação econômica. Mas quanto mais cediam, mais Hitler ameaçava e intensificava a agitação nos Sudetos, a ponto do presidente Benes ser obrigado a proclamar a lei marcial.

Apavorado, Chamberlain tomou um avião em Londres e aterrizou em Berchtesgaden no dia 15 de setembro de 1938. Era a primeira das três humilhantes viagens feitas por ele à Alemanha, na tentativa de apaziguar Hitler. Este foi enfático: os Sudetos deviam ser imediatamente incorporados ao Terceiro Reich, senão estalaria a guerra geral: Chamberlain afirmou que se Hitler não queria nada mais que os Sudetos alemães a Inglaterra não se oporia a isso[lii], e só pediu alguns dias para consultar o seu ministério.

De regresso a Londres, conferenciou com os membros do seu gabinete e com o presidente do Conselho Francês Eduardo Daladier e seu ministro de Assuntos Exteriores George Bonnet. Entrementes, Hitler buscava o apoio da Polônia para a sua agressão à Checoslováquia. Aproveitando-se da situação difícil em que esse país se encontrava, o reacionário governo de Varsóvia reivindicou a região de Teschen, rica em carvão, e assegurou que não vacilaria em usar a força para conquistá-la.

No dia 20 de setembro, sem qualquer consulta a Praga, a Inglaterra e a França comunicaram à Checoslováquia que para evitar a guerra ela deveria entregar todas as regiões habitadas por maiorias alemãs a Hitler, anular o Tratado soviético-checoslovaco de assistência mútua, assinar um acordo econômico com a Alemanha (francamente desfavorável) e proibir toda propaganda antifascista. Se aceitasse essas condições, a Inglaterra e a França se comprometiam em garantir a sua independência. Caso contrário, retirariam suas garantias:

Se a guerra estalar por causa da atitude negativa do governo checo, a França não entrará em ação e, em tal hipótese, Checoslováquia seria feita responsável por ter provocado uma guerra. Se os checos se unirem com os russos, a guerra poderia tornar-se uma cruzada antibolchevique, da qual seria muito difícil aos governos francês e inglês desassociarem-se.[liii]

O gabinete checo decidiu ceder e apresentou a sua demissão. No dia 22 Chamberlain foi ao encontro de Hitler em Godesberg para entregar-lhe os Sudetos. Mas Hitler declarou que agora não bastavam essas condições, que a Alemanha exigia a imediata ocupação de todas as regiões de fala alemã no país e dava o prazo até 1º de outubro para que os checos aceitassem. Atordoado, o chanceler britânico voltou a Londres, para novas tratativas com os franceses. Indignados, os checos rechaçaram o ultimato de Godesberg:

Mal a nota de rejeição havia sido recebida pelos enviados inglês e francês em Praga, às cinco da tarde do dia 19, já o ministro britânico, Sir Basil Newton, avisou o Ministro do Exterior checo, Dr. Kamil Krofta de que se o governo checo a ela se apegasse a Inglaterra se desinteressaria do destino do país. M. De Lacroix, o embaixador francês, associou-se a essa declaração, em nome da França.[liv]

A Inglaterra sinalizava conceder tudo o que Hitler exigia:

Os ingleses também estavam se movendo: se sabe que a FA interceptou a chamada que Chamberlain havia feito à sua Embaixada em Berlim às 11h30 anunciando que estava pronto para ir outra vez à Alemanha. Às 12h30, enquanto François-Poncet se ia, chegou Henderson com a proposta oficial de Chamberlain de que as cinco potências celebrassem uma conferência: “Estou pronto para ir eu mesmo a Berlim.” (…) O embaixador Attolico voltou às 2h40 (…) Durante a tarde se convidou as outras duas potências, Grã-Bretanha e França, à conferência. As duas aceitaram, Checoslováquia não recebeu o convite. (…) Hitler explicou que não estava disposto a perder tempo com plebiscitos nas zonas em litígio. (…) Já que só pedia as zonas de fala alemã e as outras três potências estavam de acordo com isso, o único que restava por tratar era o modo de levar a cabo a cessão. (…) o único obstáculo era a evacuação imediata dos territórios por parte dos checos. (…) Às primeiras horas da madrugada se firmava o acordo de Munique. (…) Chamberlain pediu a Hitler a garantia de que – supondo que os checos fossem tão arrogantes como para rechaçar os acordos de Munique – a aviação não bombardearia alvos civis. Hitler prometeu.[lv]

Formalizando a capitulação, o Acordo de Munique foi assinado junto com um tratado de amizade anglo-germânico que teve como signatários Hitler e Chamberlain:

As deliberações adotadas em Munique representaram (...) uma vitória decisiva da estratégia hitleriana (...) solapava a confiança das nações menores e provocava o retraimento da URSS, principalmente porque já então Stalin se certificara dos secretos desígnios de Paris e Londres: desviar para Leste a direção de ataque da máquina nazista.[lvi]

Segundo Schirer, “em 4 de outubro, após breve debate, durante o qual Daladier defendeu veementemente o Acordo de Munique, este foi aprovado pela Câmara por 535 votos a 75. Além de 73 comunistas, somente 2 deputados (...) votaram contra.[lvii]

Além de entregar os Sudetos e seus 3.100.000 habitantes à Alemanha, o acordo impunha que a Checoslováquia resolvesse o problema das minorias nacionais polonesa e húngara. Autorizava os exércitos alemães a entrarem na Checoslováquia no dia 1º de outubro e exigia que os checos abandonassem nas regiões ocupadas toda a classe de bens, em especial as munições. Além de entregar as suas defesas naturais, os checos estavam proibidos de destruir as fortificações que haviam construído.

Cinco semanas depois, Hitler se vangloriava: “Só vim a compreender a magnitude de tudo aquilo no momento em que me vi pela primeira vez no meio da linha fortificada checa: me dei conta do que significava ter tomado toda uma frente de quase dois mil quilômetros de fortificações sem haver disparado nem um só tiro.[lviii] O Acordo ainda previa a realização de plebiscitos em outras partes da Checoslováquia. Assinado o acordo, os representantes do governo checo foram convidados a comparecer na sala de sessões, sendo-lhes dito pelo representante francês que era um veredicto sem apelo e sem correções possíveis. Nos círculos dirigentes de todas as potências capitalistas o júbilo foi enorme. Dava-se mais um passo no sentido de empurrar a Alemanha para o leste:

Constituía um retorno ao pacto das Quatro Potências, à idéia de remodelar a Europa sem consultar a Rússia, sob a égide de uma Alemanha e uma Itália agressivas e de uma Inglaterra e uma França (...) preocupadas por aplacar aos ditadores, distraindo a sua atenção para o Leste.[lix]

Para ele [Hitler] o essencial é que a França e a Inglaterra tenham aceitado suas exigências, o que significa que estão tacitamente de acordo para deixar-lhe, de agora em diante, com “as mãos livres a leste”, sob a condição de que ele renuncie a qualquer pretensão a oeste.[lx]

Sumner Welles, Sub-Secretário de Estado dos Estados Unidos assim caraterizou o ponto de vista desses círculos:

Naquele anos de pré-guerra, os grandes grupos financeiros e comerciais das democracias ocidentais, inclusive numerosos grupos dos Estados Unidos, estavam persuadidos que a guerra entre a União Soviética e a Alemanha só podia ser favorável a seus próprios interesses. Estimavam que a Rússia sofreria uma derrota inevitável e que o comunismo seria aniquilado. Mas, em conseqüência do conflito, a Alemanha ficaria tão enfraquecida que, por longos anos, seria incapaz de apresentar um perigo real para o resto do mundo.[lxi]

É preciso registrar que durante todo o período em que a Inglaterra e a França planejaram a entrega da Checoslováquia, o alvo era a União Soviética, que foi mantida a margem de qualquer negociação:

Os governos francês e britânico (...) estavam muito distraídos com o problema alemão para examinar o que ocorreria quando a Alemanha se tornasse a potência dominante na Europa oriental. Naturalmente preferiam que ela marchasse para o leste e não para o oeste (...) Observadores argutos esperavam que seu passo seguinte seria na direção da Ucrânia – passo esperado pelos estadistas ocidentais com certa satisfação (...) Se Hitler realmente pretendia atacar a Ucrânia, teria de fazê-lo através da Polônia (...) Alemanha e Polônia poderiam agir juntas na Ucrânia. A 24 de outubro, Ribbentrop insinuou essas propostas a Lipski, o embaixador polonês. (...) poderia haver então uma “política conjunta em relação à Rússia, tendo por base o Pacto Anticomintern. (...) Beck não guardou segredo sobre o fato de que a Polônia tinha aspirações em relação à Ucrânia Soviética” quando Ribbentrop visitou Varsóvia (...) considerava-se como iminente uma campanha conjunta na Ucrânia.[lxii]

Mesmo assim, a URSS reafirmou a sua firme disposição de honrar os compromissos que havia assumido em relação à Checoslováquia, inclusive através de um pronunciamento público de Litvinov da tribuna da Sociedade das Nações, em 21 de setembro de 1938:

O texto do tratado continha uma cláusula que fora introduzida às instâncias de Benes. Estabelecia que os compromissos do tratado soviético-checoslovaco eram válidos somente se a França executasse os seus, assumidos diante da União Soviética ou da Checoslováquia. No momento mais critico da luta em torno do problema, quando tornou claro que a França não cumpriria os compromissos assumidos, a União Soviética recusou-se a “tirar vantagens” desta cláusula. O Governo soviético declarou oficialmente que estava disposto a levar uma ajuda militar à Checoslováquia mesmo que a França não o fizesse e mesmo que a Polônia ou a Romênia impedissem a passagem das tropas soviéticas. Mas ressaltava que a ajuda seria concedida com a condição de que “a Checoslováquia se defendesse e solicitasse a ajuda soviética”.[lxiii]

Para as fronteiras ocidentais da URSS foi deslocado um grande agrupamento de tropas. Em 28 de setembro estavam preparadas para serem expedidas para a Checoslováquia 4 brigadas de aviação (548 aviões de combate), o que foi comunicado ao adido militar francês na URSS, Pallasse, e ao governo checoslovaco. Contudo, o governo Benes-Hodza tomou pela via da traição nacional e preferiu capitular, o que não permitiu à URSS ajudar em 1938 o povo checoslovaco e abriu aos hitlerianos o caminho para a completa ocupação e desmembramento do país.[lxiv]

            Depois de adonar-se da terceira parte do país e de quase um terço da sua população, Hitler apresentou novas demandas: a construção de uma estrada de caráter militar através do país, o direito de arbitrar a sorte da Eslováquia e da Rutênia e a fixação dos territórios que caberiam à Hungria e à Polônia. Assim, no início de novembro Hitler obrigou os checos a cederem Teschen aos polacos e as áreas fronteiriças da Eslováquia e da Rutênia à Hungria.

            A vitória de Hitler foi total:

Imediatamente depois do acordo de Munique, o governo polaco enviou ao checo um ultimato exigindo a entrega do distrito fronteiriço de Teschen em vinte e quatro horas. (...) Assim, ao mesmo tempo que o poderio alemão ameaçava aos polacos, esses se apressavam a compartir a pilhagem da Checoslováquia.[lxv]

A Polônia (...) tomou cerca de 650 milhas quadradas de Teschen, abrangendo uma população de 228.000 habitantes, dos quais 133.000 checos. A Hungria obteve um pedaço maior (...): 7.560 milhas quadradas, com uma população de 500.000 magiares e 272.000 eslovacos.[lxvi]

O ajuste definitivo de 20 de novembro de 1938 forçou a Checoslováquia a entregar à Alemanha 11.000 milhas quadradas de território, onde viviam 2.800.000 sudetos alemães e 800.000 checos. Nessa área estavam todas as imensas fortificações checas que constituíam até então a mais formidável linha defensiva na Europa, com a possível exceção da linha Maginot, na França. Mas não era tudo. Todo o sistema ferroviário, rodoviário, telegráfico e telefônico de comunicações foi destruído. Segundo os algarismos alemães, o país desmembrado perdeu 66% de seu carvão, 80% de sua linhita, 86% de suas substâncias químicas, 80% de seu cimento, 80% de seus têxteis, 70% de seu ferro e aço, 70% de seu potencial elétrico e 40% de suas florestas.[lxvii]

            Esquartejada a Checoslováquia, Ribbentrop viajou para a França, em dezembro de 1938, para assinar com Bonnet um pacto franco-alemão que – em troca do reconhecimento por Hitler do status quo na Alsácia-Lorena – deixava livres as mãos da Alemanha no Leste:

Não há dúvidas que a atitude dos estadistas ocidentais, que foram tão longe no apaziguamento a Hitler em Munique, encerrava a esperança de que ele lançaria suas forças contra os russos, mais que contra o Ocidente, nem de que estavam dispostos inclusive a alentá-lo nesta política que parecia a muitos deles o resultado natural do pacto Anticomintern.[lxviii]

            Poucos dias depois da assinatura desse acordo, Bonnet foi interrogado no Comitê de Relações Exteriores da Câmara “se a França cumpriria suas obrigações pelos pactos franco-polonês e franco-soviético, se esses países fossem atacados. Bonnet respondeu que não acreditava que qualquer desses dois países fosse capaz de se defender contra a Alemanha nazista. Acrescentou que novos movimentos alemães no leste não alterariam a posição estratégica da França.[lxix] O recado era claro. Coulondre, embaixador francês em Berlim, escreverá a Bonnet:

Com efeito, o desejo de expansão para o Leste por parte do III Reich parece-me tão certa como a sua renúncia, pelo menos de momento, a qualquer conquista no Ocidente (...) quer-me parecer que se vê desenhar pouco a pouco (...) as formas do grande empreendimento alemão: tornar-se senhor da Europa Central, tornando seus vassalos a Checoslováquia e a Hungria, e criar depois a grande Ucrânia sob hegemonia alemã (...). Para tanto, seria necessário dominar a Romênia, convencer a Polônia, espoliar a URSS (...) nos meios militares já se fala da cavalgada até ao Cáucaso e a Baku.[lxx]

            Analisando esses acontecimentos em outubro de 1938, quase um ano antes do ataque à Polônia, um atilado e privilegiado observador registrou: “a guerra é hoje mais provável do que nunca (...) deverá irromper depois das próximas colheitas (...) a Polônia é, sem dúvida alguma a próxima vítima da lista de Hitler (a estupidez cega dos poloneses durante a recente crise, auxiliando a destruição da Checoslováquia)[lxxi].

A destruição final da Checoslováquia

Nos primeiros dias de março de 1939, instigados por Hitler, os separatistas da Eslováquia e da Rutênia proclamaram a sua independência. Em 6 de março, o governo checoslovaco demitiu o governo autônomo da Rutênia e no dia 9 de março o seu similar eslovaco, decretando a lei marcial. Hitler convocou, então, o presidente Emil Hacha (Benes se refugiara nos EUA) a Berlim, comunicando-lhe que a Wermacht ia invadir a Bohemia e a Morávia, mas se ele assinasse a capitulação não haveria derramamento de sangue. Shirer registra a vilania da França e da Inglaterra frente a mais essa agressão de Hitler:

A França não mexerá um dedo. Na verdade, ainda hoje, Georges Bonnet declarou à Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados que as garantias de Munique “ainda não tinham sido efetivadas” e que, portanto, a França não estava obrigada a tomar nenhuma iniciativa. Ed Murrow telefona-me de Londres dizendo que, por lá, a reação é a mesma – que Chamberlain, falando esta tarde perante os Comuns, avançou tanto que chegou a afirmar que se recusava peremptoriamente a associar-se a qualquer acusação de quebra de compromisso por parte de Hitler.[lxxii]

Na madrugada do dia 15 de março de 1939, sem esperança de qualquer apoio da Inglaterra ou da França, Hacha assinou a rendição:

O acordo principal se assinou pouco antes das 4 da manhã. Em um segundo documento, Hacha aprovava a entrega imediata aos alemães da aviação e do armamento checo. (…) Enquanto iniciava a sua invasão da Checoslováquia, as 8h02 da manhã o trem especial de Hitler saía da estação de Anhalt. (…) Keitel mantinha Hitler informado sobre o avanço do exército. As 9 da manhã, este já se encontrava nas ruas de Praga. Não houve derramamento e sangue. (…) Às 4 da tarde, levantaram a barreira da fronteira para que Hitler entrasse na Checoslováquia (…) Chegou a Praga ao entardecer. (…) Começou a ditar uma lei que estabelecia um sistema de “Protetorado” alemão sobre a Bohemia e a Morávia. (…) A primeira reação procedente de Londres foi a de tomar o assunto como se não fosse de sua incumbência (…) uma semana depois, Chamberlain se serviu de um intermediário para assegurar a Hitler que estava a favor da ação que a Alemanha havia levado a cabo, ainda que não pudesse dizê-lo de público, por encontra-se a mercê de airados ataques de Churchill e companhia. (…) o controle de Praga pôs a disposição de Hitler as reservas de ouro que necessitava para superar o enorme déficit orçamentário do Reich; lhe proporcionava, ainda, aeroportos com que ameaçar a Polônia e a Rússia; e uma redução de mil e seiscentos quilômetros de frente para defender. Lhe proporcionava tanques, artilharia e aviação checas; além disso, colocava a Romênia e a Iugoslávia em suas mãos, pois os exércitos desses países se equipavam em grande parte graças à fábrica de armas Skoda de Pilsen.[lxxiii]

Depois de ocupar toda a Checoslováquia e anexar a Bohemia e a Morávia, Hitler transformou a Eslováquia em um domínio dirigido por um governo fantoche. A imprensa reacionária dos EUA, Inglaterra e França aconselhava Hitler a unir a Ucrânia Soviética à Ucrânia Subcarpática, induzindo a Alemanha a uma guerra com a URSS. Bullit, embaixador dos EUA em Paris, informou o seu governo:

A Alemanha tentará apoderar-se da Ucrânia, que é o celeiro da União Soviética. Ao fazê-lo, a Alemanha se extenuará de tal maneira que não poderá sustentar o esforço e acabará se esfacelando. O Japão ocupará ou tentará ocupar a Sibéria e desmoronará igualmente em conseqüência de um esforço demasiado grande. Abandonando a Rússia à sua sorte, a Inglaterra e a França afastarão a ameaça de seus próprios países.[lxxiv]

Mais prudente, a Alemanha entregou a Ucrânia Subcarpática à Hungria, evitando um conflito com a União Soviética. O que as democracias ocidentais ainda não haviam percebido é que a Alemanha considerava a guerra com a URSS uma prova muito difícil e entendia necessário – antes de atacá-la – fortalecer-se no ocidente, principalmente pela derrota da França que podia ameaçar-lhe o flanco, na região estratégica do Rhur, maior centro industrial do país.

            A União Soviética foi a única a protestar e não reconhecer a ocupação da Checoslováquia: “Nem a Inglaterra nem a França fizeram o menor gesto para salvá-la, embora em Munique tivessem solenemente garantido à Checoslováquia contra a agressão”.[lxxv] Ao contrário, “os britânicos reconheceram as autoridades alemãs na Boêmia, e o Banco da Inglaterra entregou-lhe seis milhões de libras em ouro checo (...) Um entendimento geral com Hitler continuava sendo o objetivo britânico.[lxxvi]

A ocupação de Memel, o ataque à Mongólia, a ocupação da Albânia

Aproveitando-se da cumplicidade das potências ocidentais, a Alemanha prosseguiu a sua marcha para o leste. A 22 de março, arrebatou Memel à Lituânia mediante um “acordo”. No dia seguinte, firmou um tratado germano-romeno, fazendo daquele país um apêndice da economia alemã e uma base militar da Alemanha. A 7 de abril de 1939, a Itália ocupou a Albânia. Nesses dias, a Alemanha denunciou o acordo naval com a Inglaterra e o Tratado de não agressão à Polônia.

Em maio, o Japão atacou a República Popular da Mongólia – a quem a URSS estava unida por um tratado de assistência mútua – nas proximidades do rio Calquin-Gol, com o objetivo de ocupá-la e chegar até as fronteiras soviéticas na região do lago Baikal. Mas foi contido e derrotado pelas Forças Armadas conjuntas da URSS e da Mongólia. Era cada vez mais evidente o cerco que se fechava em torno da URSS:

Mesmo após o Anschluss, Londres e Paris não descreram das possibilidades de uma paz duradoura com Berlim. (...) a escolher entre a URSS e o Terceiro Reich, os estadistas britânicos e franceses preferiam orientar a sua política de bom entendimento em direção ao eixo Roma-Berlim. (...) Os caminhos de Berlim se alongavam em direção da Romênia, do Mar Negro, do Egeu, da Ucrânia, do Oriente Próximo. É lá que estão os celeiros de trigo, as minas de petróleo, os campos das matérias primas de que a Alemanha necessita. Os países mais ameaçados, a partir do início dessa etapa, são a Polônia, a Romênia, a Grécia, em primeiro lugar; logo depois a URSS, a Turquia, o Iraque.[lxxvii]

Em março de 1939, referindo-se a política das democracias ocidentais de não deter os agressores, Stalin alertava em seu Informe ao XVIIIº Congresso do Partido Comunista (bolchevique) da URSS:

A política de não-intervenção eqüivale a tolerar a agressão, a desencadear a guerra e, conseqüentemente, a transformá-la em guerra mundial. Na política de não intervenção ressalta a aspiração, o desejo de não impedir aos agressores que realizem sua obra tenebrosa: de não impedir, por exemplo, que o Japão se envolva na guerra com a China e, melhor ainda, com a União Soviética; de não impedir a Alemanha, principalmente, de se imiscuir nos assuntos europeus, de se lançar numa guerra contra a União Soviética; de permitir a todos os beligerantes que se atolem até a cabeça no pântano de guerra, de encorajá-los dissimuladamente nesse sentido; de enfraquecê-los mutuamente e, em seguida, quando estiverem suficientemente débeis, aparecer em cena com forças frescas, de intervir, naturalmente “no interesses da paz” e de ditar condições aos beligerantes enfraquecidos.[lxxviii]

Em julho de 1939 – exatamente quando se travavam os combates às margens do Calquin-Gol – a Inglaterra assinava em Tóquio o acordo nipo-inglês – conhecido como o “Munique do Leste” pelo seu abandono da China – onde a Inglaterra declarava “reconhecer a situação atual da China e as necessidades particulares das forças armadas japonesas que operavam na China” e “a não encorajar atos ou medidas que pudessem trazer embaraços ao exército japonês na China”.[lxxix]

O FRACASSO DAS NEGOCIAÇÕES TRIPARTITES E O ACORDO GERMANO-SOVIÉTICO

            É nesse contexto que têm início as conversações da União Soviética com a França e a Inglaterra. Diante dos rumores de uma próxima agressão à Romênia, rica em petróleo, no dia 18 de março o embaixador inglês em Moscou entrevistou-se com Litvinov para saber da atitude soviética no caso de uma agressão de Hitler à Romênia. Este, em nome do Governo Soviético, propôs a imediata convocação de uma conferência de representantes da Inglaterra, França, URSS, Romênia, Turquia e Polônia para tomar medidas eficazes contra a ameaça. No dia seguinte, o Governo inglês respondeu negativamente à proposta.

            No dia 21 de março, a França e a Inglaterra propuseram a assinatura de uma declaração, junto com a URSS e a Polônia, pela qual, no caso de um novo ato de agressão, esses países se consultariam urgentemente para examinar as medidas a tomar. Embora considerando a medida pouco eficaz, o Governo Soviético se prontificou a assiná-la. Mas a Polônia, profundamente reacionária e anti-soviética, negou-se a firmar a declaração se a URSS o assinasse. Ao mesmo tempo em que se negava a realizar tratativas concretas com a URSS, Chamberlain ofereceu garantias unilaterais – que não tinha condições de cumprir – à Polônia. Mas nada fez de concreto:

os poloneses pediam um empréstimo de 60 milhões de libras em dinheiro e eles respondiam não ter dinheiro e só poder oferecer créditos. Em seguida, insistiam que os créditos deviam ser empregados na Grã-Bretanha e, finalmente, tendo reduzido a cifra para 8 milhões, explicaram que como as fábricas de armas inglesas estavam cheias de encomendas o crédito não poderia ser utilizado. Nenhum crédito fora posto em prática quando a guerra irrompeu, nenhuma bomba ou fuzil inglês fora para a Polônia.[lxxx]

            A França também deu garantias à Polônia. Ambas tentaram arrastar a União Soviética a oferecer as mesmas garantias, sem qualquer contrapartida. Na verdade, coerentes com a sua estratégia, incentivavam o confronto entre a Alemanha e a URSS. Como nos diz Herrera, nem a França nem a Inglaterra estavam dispostas a participar de qualquer acordo que contrariasse seus objetivos imediatos, isto é, desviar para Leste a expansão do Lebensraum hitlerista. A contraproposta de Chamberlain (...) admitia apenas a previsão de consultas recíprocas em caso de ataque.[lxxxi]

Negociações políticas para acalmar a opinião pública

Mas, a única alternativa capaz de deter a agressão nazi-fascista – e, portanto, evitar a Segunda Guerra Mundial – era uma união militar entre a França, a Inglaterra e a URSS. Por isso, em 17 de abril de 1939, o Governo Soviético voltou a propor a assinatura de um pacto de assistência mútua e de um convênio militar entre a União Soviética, a Inglaterra e a França, além da concessão de garantias a todos os países fronteiriços à URSS, do Báltico ao Mar Negro:

Sustentam os russos que a frente de resistência contra os agressores, para ser eficiente e evitar a guerra, há de ser um sistema compacto e sem frestas. Desde que um dos trechos territoriais mais imediatamente consideráveis como ‘espaço vital’ do Reich não seja incluído nas garantias do tratado, que significaria isto senão uma convite a que as vistas de Berlim se lançassem sobre ele? E tomando-se em atenção que a existência dos Estados Bálticos é uma condição imprescindível à tranqüilidade de Moscou, bem se compreende a sua insistência nesse particular.[lxxxii]

Recém em 8 de maio a Inglaterra e a França se dignaram dar uma resposta à URSS, mais uma vez negativa, onde alegavam que isso podia ser interpretado pela Alemanha como uma agressão. Contraditoriamente, nesses mesmos dias A França e a Inglaterra assinaram com a Turquia um tratado de assistência mútua. Enquanto isso, “a Polônia, e a Romênia (...) se recusavam a aceitar a garantia russa ou mesmo a admitir que tropas soviéticas atravessassem seus territórios para enfrentar um ataque alemão. A Letônia, a Estônia e a Finlândia também se negavam sistematicamente a aceitar qualquer garantia russa.[lxxxiii] Mas, a Inglaterra e a França continuaram insistindo para que a URSS desse garantias unilaterais à Polônia e à Romênia, sem contrapartida. A URSS respondeu que só seria negociado um pacto com compromissos recíprocos.

Estimulado por essa conduta de Chamberlain e Daladier de abortar qualquer acordo sério com a URSS, Hitler iniciou uma intensa campanha contra a Polônia, exigindo a devolução de Dantzig e o livre trânsito alemão pelo corredor polonês. A tensão chegou ao seu ponto máximo. No dia 19 de maio, na Câmara dos Comuns, Churchil fez um pronunciamento onde criticou a política externa inglesa e lembrou que “as propostas apresentadas pelo Governo da URSS prevêem uma tríplice aliança da Inglaterra, França e União Soviética, de cujos benefícios podem aproveitar-se também outros países.[lxxxiv] Lloyd George também defendeu o tríplice pacto: “Sem a ajuda da URSS não poderemos cumprir nossos compromissos com a Polônia e a Romênia. Por que não firmou ainda o Governo acordo de assistência mútua com a URSS?[lxxxv] No mesmo sentido pronunciou-se Eden.

Pressionado pela opinião pública, Chamberlain manobrou e no dia 25 de maio propôs ao Governo soviético um pacto tripartite genérico, vinculado à Sociedade das Nações, sem nenhum convênio militar concreto. A contraproposta soviética, apresentada no dia 2 de junho, independizava o pacto de qualquer procedimento estabelecido na Sociedade das Nações, discriminava os Estados que receberiam garantias e determinava que o pacto e o convênio militar entrariam em vigor simultaneamente.

Depois de muitas discussões, a questão da desvinculação do pacto da Sociedade das Nações foi aceita. Já as negociações em torno dos Estados que receberiam garantias – principalmente no que se refere às antigas províncias bálticas – começaram a arrastar-se em torno das mais absurdas polêmicas. Segundo  Lindolfo Collor:

Em nenhuma delas, rigorosamente, funciona um governo de estrutura democrática. (...) Na Estônia (...) domina ditatorialmente o sr. Constantin Paets; na Letônia (...) o presidente Karlis Ulmanis exerce com os chefes militares um poder absoluto; na Lituânia (...) o presidente Antanas Smetana, que tomou o poder por ocasião da queda do ditador Waldemaras, também é depositário de poderes excessivamente extensos (...) Que mais seria necessário acrescentar para deixar assinalada a simpatia desses homens de Estado pelo regime alemão? (...) Eles querem viver em boa paz com Berlim e repelem liminarmente toda e qualquer garantia provinda de Moscou. (...) Os países bálticos sempre figuraram no programa das reivindicações alemãs. (...) O que esses minúsculos Estados representam para o expansionismo germânico nem precisaria ser explicado o Baltikum foi, em todos os tempos, considerado pela Prússia como o seu ‘espaço vital’ mais lógico e sob todos os aspectos mais preciosos. Senhora de Riga, de Tallin e de Dantzig, a Alemanha imperaria entre a Escandinávia e a Rússia. Gdinia viveria à mercê de sua boa vontade, o corredor deixaria de existir. A Finlândia estaria bloqueada. (...) A Rússia teria definitivamente barradas as suas comunicações imediatas com o Ocidente, obrigada a recorrer às longínquas vias de Arkangel e Odessa. (...) A existência do Estados Bálticos de hoje (...) representa uma necessidade por muitos aspectos vital para a Rússia.[lxxxvi]

Baufre, um dos negociadores franceses, e posteriormente um destacado general, escreveu referindo-se às propostas soviéticas: “Era difícil ser mais concreto e mais claro (…) o contraste entre esse programa e as confusas abstrações franco-inglesas é surpreendente (…) Os argumentos soviéticos eram ponderáveis (…) A nossa posição era falsa.[lxxxvii]

No dia 8 de junho, Lord Halifax, Ministro das Relações Exteriores da Inglaterra, comunicou à Maiski, embaixador soviético em Londres, a viagem de William Strang, mero funcionário do Departamento Diplomático, para prosseguir as tratativas em Moscou. Era uma clara demonstração do desinteresse inglês em uma rápida assinatura do pacto:

a hipótese subjacente [era] de uma ação alemã contra a Ucrânia, na perspectiva do Meins Kampf. (...) Ainda no princípio de 1939, Sir Neville Henderson, embaixador inglês em Berlim, que fala constantemente dessa hipótese, declara a operação inevitável e aconselha ao governo britânico que se mantenha neutro. E concebe-se que certos dirigentes franceses e ingleses tenham podido pensar sem pena que o choque alemão se iria dar primeiro a oriente contra os soviéticos, de preferência a ocidente, contra eles próprios.[lxxxviii]

Em fins de junho, as negociações já duravam 75 dias. Desses, a URSS utilizara 16 dias para preparar as suas respostas; a Inglaterra e a França, 59. Enquanto isso a situação na Europa se agravava cada vez mais.

No começo de julho havia sido obtido o acordo em torno dos Estados “garantidos” no pacto. Iniciaram-se, então, as discussões sobre o Convênio Militar. Os soviéticos insistiam em que o pacto e o convênio militar formavam um todo único, entrando em vigor simultaneamente. Os ingleses e os franceses desconversavam e queriam tratá-los separadamente, como dois documentos distintos. No fundo, evitavam assumir qualquer compromisso militar concreto com a URSS.

Maiski relata: “no início de julho foi-me comunicado que teve lugar o seguinte diálogo entre Chamberlain e Wood, Ministro da Aviação: O que há de novo acerca das negociações sobre o pacto? perguntou Wood. Chamberlain fez um gesto de irritação e respondeu: Ainda não perdi a esperança de frustrar a assinatura desse malfadado pacto.[lxxxix] O historiador inglês David Irving também faz menção à essa postura de Chamberlain: ”Em 25 de maio, as escutas realizadas pela FA ao correspondente do The Times em Berlim, Mr. James Holburn, mostravam que, durante a sua estadia em Londres, havia tomado conhecimento de que Chamberlain não tinha a intenção de aliar-se com Stalin: ainda esperava retomar, algum dia, o contato direto com Hitler.[xc]

Como o Governo soviético não abriu mão da unidade entre o tratado e o convênio militar, recém no dia 24 de julho o Governo inglês aceitou esta tese. Haviam se passado mais três semanas. Não satisfeitos, franceses e ingleses polemizaram durante vários dias sobre o conceito de “agressão”. Enquanto prolongava ao máximo as negociações com a URSS, a Inglaterra agilizava os contatos diretos e indiretos com a Alemanha, procurando chegar a um acordo com a mesma:

as fontes autorizadas diziam desde Londres sobre que Chamberlain estava buscando o modo de renunciar à delicadas garantias dadas à Polônia. (…) A fins de julho, tudo parecia indicar que Chamberlain e seus conselheiros estavam dispostos a um segundo Munique. Por iniciativa britânica, já se haviam celebrado conversações entre Sir Horace Wilson, um dos conselheiros mais conciliadores de Chamberlain, e o doutor Helmuth Wohlthat, membro do pessoal de economia de Gõring. Wilson havia proposto um profundo acordo político, econômico e militar com Hitler, em troca de certas garantias. (…) Em 4 de agosto, Neville Chamberlain suspendia por dois meses as sessões do Parlamento. Simultaneamente (…) Sir Horace Wilson convidou o embaixador Herbert von Dirksen ao seu apartamento particular e lhe propôs a grandes traços “uma sólida colaboração em política mundial” entre a Grã-Bretanha e a Alemanha. Se Hitler aceitasse as condições, indicou Wilson, então a Grã-Bretanha pressionaria a Polônia para que concordasse com as exigências alemãs.[xci]

Wilson (...) propunha um tratado anglo-alemão de não agressão e não-interferência, uma acordo de desarmamento e uma cooperação no comércio externo. Um pacto semelhante “permitiria aos ingleses se livrarem de seus compromissos em relação à Polônia.”[xcii]

            Essas negociações são registradas por diversos historiadores: tratativas entre Ashton-Gwatkin chefe da Seção Econômica do Ministério dos Assuntos Estrangeiros britânico e Goering[xciii]; entre Horace Wilson e Robert Hudson Ministro do Comércio Ultra-marino e Helmut Wohltat[xciv]; entre Roden Buxton membro da Câmara dos Comuns e Kordt - Conselheiro da embaixada alemã[xcv]; entre Halifax e Dirksen embaixador alemão[xcvi]; entre Wohlthat e Hudson e Wilson[xcvii]; entre Dahlerus e Chamberlain, Halifax e Cadogan.[xcviii]

            Em todos esses contatos, uma constante: o estabelecimento de um pacto entre a Inglaterra e a Alemanha, dividindo áreas de interesse em troca do abandono da Polônia e do rompimento das negociações em torno do pacto de assistência mútua com a URSS. Assim, enquanto protelavam as negociações em Moscou, buscavam deixar a Polônia e a União Soviética entregues à própria sorte:

Aqui domina a impressão de que os vínculos que se estabeleceram nos últimos meses com outros Estados não são mais do que um meio de reserva para a verdadeira reconciliação com a Alemanha e que esses vínculos desaparecerão logo que se consiga o único objetivo importante e digno de esforço: o acordo com a Alemanha. [xcix]

O impasse nas negociações militares

            No dia 25 de julho, Halifax comunicou a Maiski que se chegara a um acordo em Moscou para iniciar de imediato as negociações militares, mas não demonstrou nenhuma pressa para enviar a delegação inglesa. No dia 31 de julho, o Parlamento foi sacudido por violentas discussões sobre a política exterior britânica; a oposição exigiu que fosse enviado a Moscou alguém de alto nível, o próprio Ministro do Exterior, para negociar. Justificando os quatro meses e meio que já duravam as negociações, Chamberlain alegou que as conversações em 1903 com o Japão duraram 6 meses, a Entente anglo-francesa de 1904 exigira 9 meses e a Entente anglo-russa de 1907, 15 meses. O recado era claro: o Governo inglês ainda pretendia demorar muito até a conclusão do acordo.

            A indicação do chefe da delegação militar – Sir Reginald Drax, ancião almirante da Marinha – surpreendeu a todos, pois era um ilustre desconhecido, sem qualquer peso político. O governo francês seguiu o mesmo caminho, indicando o general Doumenc. Os demais membros de ambas delegações não passavam de quadros médios das Forças Armadas. Só no dia 5 de agosto as delegações saíram de Londres, e ainda escolheram o meio de transporte mais demorado: um navio que demorou 5 dias em chegar a Leningrado. Só aí já se haviam ido mais 15 dias. A leitura dos arquivos do embaixador alemão em Londres – Dirksen – publicadas depois da guerra lançam luz sobre esses movimentos protelatórios dos ingleses, neste momento envolvidos em negociações secretas com a Alemanha:

Que “outras negociações” seriam essas? (…) O relatório que Dirksen enviou a Berlim a 1º de agosto de 1939 (A.3107) é muito mais concreto (…): 1) A Alemanha compromete-se a não se imiscuir nos negócios do Império Britânico. 2) A Inglaterra compromete-se a respeitar plenamente as esferas de interesses alemães no Leste e no Sudeste europeus. Isso teria como conseqüência que a Inglaterra renunciaria às garantias concedidas a certos Estados situados nessas esferas. [Polônia?] A Inglaterra compromete-se em seguida a trabalhar para que a França repudie sua aliança com a União Soviética e renuncie a todos os interesses que tenha no Sudeste da Europa. 3) A Inglaterra compromete-se a pôr fim às conversações atualmente mantidas com a União Soviética, visando a conclusão de um pacto.[c]

Alegando que ainda não haviam chegado a uma conclusão sobre o conceito de “agressão”, as instruções inglesas orientavam a sua Missão no sentido de desenvolver as negociações militares com a máxima lentidão, até que o acordo político fosse concluído:

As instruções dadas, por escrito, ao almirante Drax, tendem a que as conversações militares se desenrolem com lentidão enquanto não se chegar a um acordo sobre as questões políticas (…) Lamentaria muito que fosse essa a decisão do Governo de sua Majestade, pois tudo indica que a missão militar soviética quer resolver o assunto com seriedade.[ci]

Ao contrário das delegações da França e da Inglaterra, a delegação soviética era do mais alto nível possível, sendo formada pelo marechal Voroshilov (Comissário do Povo de Defesa da URSS), almirante Kuznetsov (Comissário do Povo da Marinha), Loktionov (Chefe das Forças Aéreas), Shaposnikov e Smorodinov (Chefe e subchefe, respectivamente, do Estado Maior do Exército).

No início da primeira reunião, no dia 12 de agosto, a delegação soviética propôs que cada delegação apresentasse os poderes de que estava investida para as negociações, e começou apresentando os seus amplos poderes: “manter negociações (…) e assinar um convênio militar sobre a organização da defesa militar da Inglaterra, França e URSS contra a agressão na Europa.”[cii] A seguir, o general Doumenc leu os seus poderes, bem mais limitados. Quando chegou a vez do almirante Drax, constatou-se que o mesmo não dispunha de nenhum poder por escrito. “Na verdade, tão cético estava o governo britânico que negligenciou fornecer ao Almirante Drax autorização escrita para negociar.”[ciii]

Ficava evidente a falta de seriedade com que a parte inglesa estava tratando as negociações. O almirante ficou de solicitar poderes por escrito ao seu Governo (que só chegaram dia 21 de agosto).

Apesar disso, foram iniciadas as negociações. No dia 14, a parte soviética levantou uma questão crucial: no caso de agressão à Polônia ou à Romênia será autorizada a entrada de tropas soviéticas no território desses países? Como esclarece James Joll, “O ponto difícil das negociações com a Grã-Bretanha e a França residia em que o governo soviético afirmava, não sem certa razão, que para auxiliar a Polônia carecia de enviar tropas para além da fronteira polaca, e a Polônia negava-se em absoluto e consentir que um único soldado russo pusesse os pés no seu solo.”[civ]

Como as partes inglesa e francesa responderam com evasivas e, ao final, ficaram de consultar à Polônia e à Romênia, a parte soviética fez constar por escrito que sem uma solução favorável para essa questão o pacto seria inviável, pela simples razão que a URSS ficaria impossibilitada de cumprir com os seus compromissos:

A única coisa que podia haver salvo o Estado e o exército polacos era uma aliança com a União Soviética, assim como com o imperialismo britânico e francês. (...) Mas esta possibilidade nunca foi seriamente considerada, nem pelo regime de Beck-Pyz-Smiply, nem pelos Estados Maiores francês e britânico, nem por Stalin [?!] (...) A negativa do regime polaco em aceitar ajuda soviética direta converteu as negociações militares entre o Estado Maior dos aliados ocidentais e o governo soviético no verão de 1939.[cv]

Como até o dia 17 não havia chegado uma resposta, foram suspensas as negociações e marcada nova reunião para o dia 21 pela manhã.

Segundo Léon Noel – embaixador francês em Varsóvia no período –, em 19 de agosto, o chefe do estado-maior polaco, general Stachiewicz, informou mais uma vez, ao adido militar francês, sobre a negativa do Governo polaco em relação à passagem de tropas soviéticas pelo território polaco, em caso de agressão alemã.[cvi] O adido militar francês teria dito: “Não me fale de vossa recusa. É melhor que em Moscou a nossa delegação possa manobrar como se vocês ainda não tivessem formulado a vossa recusa.[cvii] Era evidente a má fé seja dos negociadores franceses, seja dos negociadores ingleses. Como no dia 21 de agosto nem Londres, nem Paris, dessem qualquer resposta, a parte soviética resolveu suspender as negociações por prazo indeterminado:

As forças armadas soviéticas não poderão colaborar com as forças armadas da França e da Inglaterra, se estiverem impedidas de entrar no território da Polônia e da Romênia (…) A delegação militar soviética não entende como os Governos e os Estados Maiores da Inglaterra e da França, ao enviarem à URSS as suas delegações militares, não lhes tenham dado indicações precisas sobre questão tão elementar (…) Se os franceses e os ingleses transformam essa questão em um grande problema, isso significa que existe fundamento para duvidar de que desejem, realmente, uma colaboração militar séria com a URSS. Assim, a responsabilidade pela protelação das negociações militares recai sobre as partes francesa e inglesa.[cviii]

            Ficava claro para os dirigentes soviéticos que as outras duas partes, principalmente a inglesa, só pretendiam ganhar tempo as custas da URSS para tentar chegar a um acordo com Hitler, usando as negociações tripartites como instrumento de barganha com a Alemanha:

Assim, no dia 22 de agosto, às vésperas do ataque da Alemanha à Polônia, Chamberlain envia uma carta a Hitler, acenando com um novo Munique: “Não vejo que haja alguma coisa nas questões surgidas entre a Alemanha e a Polônia que não possa e não deva ser resolvida sem o uso da força, desde que se pudesse estabelecer uma situação de confiança que permitisse o desenrolar das discussões numa atmosfera diferente daquela que reina hoje.[cix]

Na realidade, o governo britânico não estava interessado numa cooperação militar sólida com a Rússia Soviética, mas apenas em acenar com o fantasma russo, na esperança de que isso aquietasse Hitler. (...) Os franceses pensavam em termos mais práticos. Estavam preocupados apenas em envolver o Exército Vermelho num conflito com Hitler, e não lhes importava se isso fosse conseguido as expensas da Polônia.[cx]

            O objetivo central era lançar a Alemanha, a Itália e o Japão contra uma URSS isolada: “Era essencial, no caso de uma guerra, tentar envolver nela a União Soviética, pois de outro modo no final da guerra a União Soviética com o seu exército intacto e a Inglaterra e a Alemanha em ruínas, dominaria a Europa. [cxi]

            Evidentemente, o Governo soviético não caiu nessa armadilha e buscou alternativas que evitassem – ou ao menos adiassem – o seu isolamento e a agressão nazi-fascista.

A busca de alternativas pela URSS para romper o isolamento

            Tudo indica que a partir de abril-maio de 1939 – após a ocupação da Checoslováquia sem qualquer reação das democracias ocidentais, e após a agressão japonesa à Mongólia e à União Soviética, seguida do pacto nipo-britânico (que entregou a China ao Japão) – a URSS, sem abandonar a tentativa de um acordo com a Inglaterra e a França, colocou na ordem-do-dia a busca de alguma alternativa que evitasse o seu isolamento e o risco de ter que enfrentar uma guerra em duas frentes, no Oriente e no Ocidente. Ao orientar-se nesse sentido, o Governo Soviético levava em conta as opiniões de Lenin por ocasião da paz de Brest Litovski:

Enquanto não ocorra a revolução socialista internacional que abarque a vários países e tenha força suficiente que lhe permita ajudar a vencer ao imperialismo internacional, enquanto isso não ocorra, o dever inelutável dos socialistas triunfantes em um só país (e especialmente se é um país atrasado) consiste em não aceitar o combate com os gigantes do imperialismo, em tratar de recusar o combate, de esperar que a contenda entre os imperialistas debilite a estes ainda mais, acerque ainda mais a revolução em outros países.[cxii]

Nossa preparação militar não terminou ainda, por isso a consigna geral segue a mesma: manobrar, recuar e esperar, continuando essa preparação com todas as forças. Sem renunciar em geral, nem muito menos, aos acordos militares com uma coalizão imperialista contra a outra em aqueles casos em que esses acordos, sem violar os fundamentos do Poder Soviético, possam fortalecer a sua situação e paralisar o ataque contra ele por parte de qualquer potência imperialista. (...) é preciso observar a maior prudência, circunspecção e firmeza para não ajudar, com um passo irrefletido ou precipitado, aos elementos extremistas dos partidos militares do Japão ou da Alemanha. (...) nesses dois países, os elementos extremistas do partido militar estão a favor de uma ofensiva imediata e geral contra a Rússia para ocupar todo o seu território e derrotar o Poder Soviético.[cxiii]

                A substituição de Litvinov por Molotov[cxiv] mostrou a importância que o governo da URSS concedia a essas negociações:

A política externa tinha sido deixada aos comunistas do segundo plano - primeiro Chicherin, depois Litvinov (nenhum dos quais membro do Politburo) - desde que Trotsky deixara de ser Comissário do Exterior em princípios de 1918. A 3 de maio de 1939, Molotov substituía Litvinov, medida esta que tem sido, por vezes, considerada como favorável à Alemanha. Talvez fosse, porém, apenas o reconhecimento de que os assuntos externos tinham importância.[cxv]

            Ao mesmo tempo, sinalizou uma possível mudança de rumo. No seu relatório ao Soviete Supremo, em 31 de maio, Molotov centrou o ataque na Alemanha, mas fez duras críticas à França e a Inglaterra: “Aumenta cada vez mais a arrogância das potências agressoras. Por outro lado, os representantes dos países democráticos mostram-se desinteressados pela política de segurança coletiva (...) tendo adotado uma atitude de não resistência à agressão”.[cxvi]

Simultaneamente, as negociações econômicas com o Reich permitiram aproximações e sondagens indiretas. Hitler parece ter percebido essas alterações. A miopia e a intransigência das potências imperialistas que trabalhavam com a estratégia de lançar a Alemanha contra a URSS, levou as negociações de Moscou ao fracasso e forçou a URSS a aceitar o pacto de não agressão proposto por Hitler. Como afirmou Taylor:

A Rússia Soviética buscava a segurança na Europa, não conquistas. É surpreendente que não tivesse procurado antes esse objetivo num acordo com a Alemanha. (...) A aliança com as potências ocidentais parecia uma política mais segura (...) podemos supor, com certa segurança, que o Governo Soviético só se voltou para a Alemanha quando tal aliança revelou-se impossível.[cxvii]

            Assim, decidido a atacar a Polônia e temeroso do pacto tripartite, Hitler começou a sinalizar para Moscou a possibilidade de uma aproximação. Em fins de maio o embaixador alemão em Moscou propôs a Molotov restabelecer as negociações comerciais germano-soviéticas, interrompidas e fevereiro; a parte soviética fez ver a necessidade, para isso, de uma melhoria das relações políticas. Em fins de junho novo contato do embaixador alemão com Molotov, insistindo na melhoria das relações entre os dois países e indicando sinais de boa vontade alemã: assinatura de pactos de não agressão com os países bálticos, mudança do tom da imprensa alemã em relação à URSS.

            Em fins de julho, em um jantar oferecido em Berlim a Astajov – encarregado de negócios soviético – Schnurre afirmou que a Alemanha estava disposta a um amplo acordo com a URSS sobre todos os problemas, do Báltico ao Mar Negro. Segundo as notas do próprio Schnurre, “Astajov (…) considerou que o ritmo para a aproximação deverá ser, provavelmente, muito lento (…) A política exterior nacional-socialista ameaça a União Soviética[cxviii] Os dados disponíveis indicam que foi só em fins de julho – com o ataque à Polônia já marcado – que Hitler decidiu dar passos mais decididos no sentido de buscar um acordo com a URSS, que lhe garantisse não ser atacado pelo Leste:

Trinta e um de julho: Schulenburg, o embaixador alemão em Moscou, recebe um nervoso, urgente e secreto despacho no qual lhe é ordenado informar, ainda naquele dia “a data e a hora do encontro que ele, Embaixador, teria com Molotov. O nervosismo de Ribbentrop tem razão de ser: é que no dia 22 chegara às mãos de Hitler uma notícia que deixou o irascível Führer ainda mais inquieto. Von Valezsek informava de Paris que franceses e ingleses estavam enviando missões militares a Moscou, “a fim de provarem a seriedade das intenções políticas russo-franco-inglesas”. Naquele momento ainda não era do conhecimento de Hitler que as tais Missões inglesa e francesa não tinham autoridade para a assinatura de qualquer acordo ou pacto, nem no terreno comercial, muito menos no campo militar. Mas, então, Stalin, afrontado com a má qualidade dos delegados que lhe enviaram Londres e Paris, já estava convicto de que era inexeqüível um acordo militar de qualquer espécie com as democracias ocidentais.[cxix]

O Estado Maior geral havia disposto que a data ótima para atacar a Polônia era o 25 de agosto. (…) Foi aqui, em Bayreuth, onde Hitler abordou efusivamente a Neurath com estas palavras: “O que vou te dizer vai te deixar assombrado: que te parece se chegamos a um acordo com a Rússia? (…) Mas Hitler continuou temendo uma negativa do ditador soviético. Seguindo suas instruções, no dia 2 de agosto Ribbentrop insinuou ao encarregado de negócios soviético que Moscou e Berlim deviam decidir entre si o destino da Polônia; e acrescentou, a modo de isca tentadora, que não havia “nenhum problema entre o Báltico e o Mar Negro” que não pudesse ser solucionado.[cxx]

            Maiski confirma o relato deste encontro de Ribbentrop com Astajov (na data de 3 de agosto). Conforme as notas de Ribbentrop – citadas por Maiski – “a seu ver, o Governo soviético deseja seguir uma política de compreensão mútua com Alemanha. (…) O encarregado de negócios procurou, várias vezes, fazer recair a conversa sobre questões mais concretas. Mas eu dei a entender que estou disposto a ser mais concreto só no caso do Governo soviético declarar a conveniência de dar um novo caráter às relações.[cxxi] Fica claro que até então não existia qualquer negociação concreta em torno do pacto de não agressão entre os dois governos, mas somente sondagens.

            No dia 4 de agosto, o embaixador alemão – Schulenburg – encontrou-se com Molotov, relatando a Berlim: “Minha impressão geral é que o Governo Soviético está no momento disposto a concluir um acordo com a Grã-Bretanha e a França, se elas atenderem aos desejos soviéticos (...) Será necessário considerável esforço de nossa parte para modificar a posição do governo soviético.[cxxii] No dia 14 de agosto, Schnurre enviou um telegrama a Schulenburg avisando que Astajov o visitara e comunicara que o Governo soviético se dispunha a “discutir por grupos de questões tudo o que se referisse à relações germano-soviéticas e propunha manter as negociações em Moscou.

            Já Ribbentrop solicitou ao embaixador alemão que visitasse Molotov e declarasse em nome do Governo alemão que “não há contradição de interesses entre a Alemanha e a URSS; não existe motivo para atitude agressiva de uma parte à outra; não há questão entre o Báltico e o Mar Negro que não possa ser resolvida de modo satisfatório para ambos os países” e que “a fim de normalizar com maior rapidez as relações germano soviéticas, estava disposto a visitar, ele próprio, Moscou, com a condição de ser recebido por Stalin.”

            No dia 15 de agosto, Schulenburg informou a boa receptividade de Molotov mas, quanto à visita de Ribbentrop à Moscou, que isso “requer uma preparação adequada”; além disso teria perguntado se o Governo Alemão se dispunha a assinar com a URSS um pacto de não-agressão, de garantias aos Estados do Báltico e influir para melhorar as relações nipo-soviéticas (é interessante lembrar que no dia 14 tanto a França quanto a Inglaterra haviam respondido com evasivas à questão crucial da passagem das tropas soviéticas pelo território polonês). Em 16 de agosto, Ribbentrop respondeu positivamente a todas as questões levantadas por Molotov, e insistiu na urgência da sua viagem à Moscou, a partir do dia 18. Mais uma vez a resposta soviética foi no sentido de que primeiro fosse estabelecido um convênio comercial e financeiro e que só depois se discutisse um pacto de não-agressão:

Nesse mesmo dia 16 de agosto, Molotov manteve uma longa conversa com o embaixador norte-americano, Lawrence Stenhardt, relatando com detalhes as suas conversas com Schulemburg, “inclusive a sugestão para a assinatura de um pacto de não agressão e um acordo no tocante ao Báltico.” Essa informação foi repassada aos britânicos no dia 17: “Qual a razão de haver Molotov revelado isso ao embaixador norte-americano? O Kremlin deveria saber que a informação seria passada para os britânicos. Stalin ainda estaria indeciso em 16 de agosto, não sabendo para que campo saltaria? Estaria tentando advertir os representantes franco-britânicos, em Moscou, de que deveriam tratar da questão porquanto, caso contrário, assinaria o pacto com os alemães que lhe ofereciam grandes vantagens?”[cxxiii]

            Estava clara a tentativa do Governo soviético de ganhar tempo para ver se as negociações do pacto tripartite com a Inglaterra e a França – paralisadas por falta de resposta desses dois países em relação à questão da Polônia – saíam do atoleiro em que se encontravam:

O Dr. Schnurre comunicou que as discussões com os russos sobre o tratado comercial haviam terminado na noite anterior “com completo acordo”, mas que os soviéticos se retardavam em assiná-lo. A assinatura, ele disse, devia ter lugar ao meio-dia de 19 de agosto, mas a essa hora os russos telefonaram dizendo que tinham de aguardar instruções de Moscou. “É evidente”, informou Schnurre, “que haviam recebido instruções de Moscou para dilatar a conclusão do tratado por motivos políticos.”’[cxxiv]

            No dia 20 de agosto, Hitler enviou uma mensagem à Stalin comunicando que na véspera fora assinado o convênio comercial e financeiro e insistindo para que recebesse Ribbentrop, o mais tardar a 22 ou 23 de agosto. Convencido – depois de quase cinco meses de infrutíferas conversações – de que a Inglaterra e a França não tinham a intenção real de firmar um pacto de assistência mútua, o Governo Soviético suspendeu no dia 21 de agosto as negociações com esses dois países e concordou com a vinda a Moscou de Ribbentrop no dia 23 de agosto.[cxxv] O historiador inglês David Irving – que teve acesso a uma série de arquivos nazistas – confirma, com pequenas diferenças, esse desenrolar dos acontecimentos:

no dia 9, o próprio Halifax falava com Dirksen. Desta vez prometia que a Grã-Bretanha estava disposta a “contribuir na medida do possível” para chegar a um entendimento com a Alemanha. (…) Quando no dia 11 Hitler falou com o professor Carl Burckhardt, alto comissário da Liga das Nações em Dantzig (…) (recordou Burckhardt anos mais tarde) seguiu dizendo: “tudo o que faço se dirige contra a Rússia. Se o ocidente se mostra incapaz de compreender isso, então me verei obrigado a chegar a um acordo com os russos e voltar-me contra o ocidente primeiro, para depois dirigir todas as minhas forças contra a URSS.” No dia 12 de agosto (…) Ribbentrop (…) levou Hitler a um lado e lhe disse algo em voz baixa: Molotov acabava de concordar em princípio a receber um negociador alemão em Moscou. (…) 14 de agosto, Ribbentrop enviou um telegrama à embaixada de Moscou com estas dramáticas instruções: havia que informar a Molotov que Ribbentrop estava disposto a ir pessoalmente à Moscou. (…) Os russos deram um passo atrás. No dia 18 de agosto, Ribbentrop mandou um telegrama urgente ao seu embaixador e lhe disse que estaria autorizado a firmar um protocolo adicional secreto (…) apesar de tudo, Molotov não parecia muito disposto a recebê-lo em Moscou antes do dia 26 ou 27. (…) Hitler (…) no dia 20 de agosto decidiu escrever uma nota pessoal a Stalin algo sem precedentes (…) para que aceitasse a presença de Ribbentrop em Moscou antes de três dias. (…) Na tarde do dia 21 de agosto chegou a resposta de Moscou: Molotov havia convocado o embaixador às três da tarde. Ainda tiveram que passar mais horas angustiantes. Por fim, Ribbentrop trouxe o informe do embaixador (…) o Kremlin estava encantado em receber a Herr Ribbentrop em dois dias, como havia pedido Hitler. (…) Ribbentrop partiu para Moscou (…) com instruções pessoais de Hitler de ceder a qualquer exigência soviética: para assegurar a assinatura de Molotov.[cxxvi]

            Apesar do Governo alemão ter feito questão, nessa mesma noite, com dois dias de antecedência, de divulgar pela radio a notícia da viagem de Ribbentrop à Moscou, nem a França, nem a Inglaterra se dignaram a qualquer iniciativa diplomática junto a URSS. Sua estratégia continuava sendo fazer um acordo com Hitler, mesmo que às custas da Polônia (como já fora feito com a Áustria e a Checoslováquia), e fazê-lo aproximar-se ainda mais das fronteiras soviéticas:

desde o dia 16 de agosto, a FA havia estado controlando furtivamente as conversações telefônicas entre Sir Horace Wilson e o embaixador britânico em Berlim. Wilson buscava desesperadamente alguma fórmula para devolver Dantzig ao Reich. No dia 20 de agosto, havia dito em segredo ao agregado de imprensa alemão em Londres que estava disposto a “ir em segredo à Alemanha” se fosse necessário. À última hora do dia 22 de agosto, o embaixador britânico chamou por telefone para solicitar uma entrevista com o Fuhrer no dia seguinte. Tinha uma carta do primeiro ministro britânico dirigida a Hitler (…) Segundo a escuta realizada, a carta de Chamberlain propunha um período de distensão enquanto se solucionavam os problemas de Dantzig e da minoria alemã da Polônia.[cxxvii]

O acordo germano-soviético de não agressão

            Mas, Hitler há muitos meses já havia decidido a invasão da Polônia e a operação militar para o ataque já estava em andamento desde o dia 15 de agosto. Como deixa claro Herrera, “conforme revelaram os inquéritos de Nuremberg - o pacto foi conseqüência e não, como se pensou durante algum tempo, fator da decisão de invadir a Polônia, pois que tal decisão fora tomada três meses antes.” [cxxviii]O Führer não estava disposto a suspendê-la em troca de Dantzig, que era um mero pretexto para a agressão.

            Sabedor disso, e sem qualquer perspectiva de chegar a curto prazo a uma aliança militar com a França e a Inglaterra, no dia 23 de agosto o Governo Soviético firmou com a Alemanha um acordo de não-agressão por 10 anos:

Enquanto as conversações da Rússia com as democracias ocidentais vinham-se arrastando havia 5 meses (...) as conversações entre Ribbentrop e Stalin foram concluídas com êxito em doze horas (...) Os alemães, diferentemente aos aliados ocidentais, fizeram todas as concessões pedidas pelos russos. Em troca receberam a única garantia que desejavam: a garantia solene de que a União Soviética permaneceria fora da guerra de Hitler.[cxxix]

            Pelo art. 1º desse acordo, ambas as partes se comprometiam a abster-se de qualquer agressão entre si. No art. 2º, ambos os países assumiam o compromisso de não apoiar a um terceiro, se uma das partes fosse objeto de hostilidades por esse terceiro país. O art. 3º rezava que a Alemanha e a URSS “continuariam em contato, no futuro, para manter consultas, a fim de informar-se, mutuamente, de questões que afetassem os seus interesses”. No art. 4º, ambos países comprometiam-se a não participar de grupos hostis à outra parte O art. 5º afirmava que os litígios que surgissem entre a Alemanha e a URSS deveriam ser resolvidos por meios pacíficos.[cxxx]

Shirer – insuspeito de qualquer simpatia por Stalin ou pela URSS – comentará:

A primeira e primordial consideração de Stalin, como a de qualquer outro chefe de governo, era a segurança de seu país. No verão de 1939, ele estava convencido (...) que Hitler iria à guerra. Ele decidiu que a Rússia não devia ser posta na perigosa situação de ter de enfrentar sozinha o Exército alemão. Se uma forte aliança com o Ocidente se afigurava impossível, então por que não voltar-se para Hitler, que repentinamente estava batendo à sua porta? Em fins de julho de 1939, Stalin se tornara convencido, é claro, não somente de que a França e a Inglaterra não queriam uma aliança firme, mas também que o objetivo do governo de Chamberlain na Inglaterra era induzir Hitler a fazer suas guerras na Europa Oriental. Stalin duvidava que a Inglaterra honrasse sua garantia à Polônia de uma forma melhor que a França mantivera suas obrigações com a Checoslováquia. E tudo que tinha ocorrido no Ocidente nos últimos dois anos tendia a aumentar sua desconfiança: a rejeição por Chamberlain das propostas soviéticas, depois do “Anschluss” e depois da ocupação nazista da Checoslováquia, no sentido de traçar planos para deter nova agressão nazista; o apaziguamento de Hitler em Munique, por Chamberlain, assunto do qual a Rússia fora excluída; as delongas e hesitações de Chamberlain em negociar uma aliança defensiva contra a Alemanha (...). Se Chamberlain era justo e honrado ao apaziguar Hitler em setembro de 1938, sacrificando a Checoslováquia, Stalin era injusto e desonrado ao apaziguar o Fhürer um ano depois às custas da Polônia, que se esquivara de qualquer forma de ajuda soviética?[cxxxi]

E Trotski, inimigo mortal de Stalin e crítico impiedoso do Estado Soviético dirá

Um Estado operário isolado não pode deixar de manobrar entre os campos imperialistas hostis. Manobrar significa apoiar temporariamente um deles contra os outros. Saber qual dos dois campos é o mais conveniente, ou o menos perigoso, de se apoiar em determinado momento não é uma questão de princípios, mas de cálculos e previsão práticas. (...) Mas realmente, que há de inesperado e imprevisto na tentativa do Kremlin de obter as maiores vantagens possíveis de sua aliança com Hitler? (...) Durante as prolongadas negociações com a delegação anglo-francesa no verão de 1939, o Kremlin exigiu abertamente o controle dos Estados Bálticos. Como a Inglaterra e a França não aceitaram este controle, Stalin rompeu as negociações. Isto indicava claramente que um acordo com Hitler asseguraria a Stalin, pelo menos, o controle dos Estados bálticos. (...) Nas condições da guerra mundial, tratar a questão do destino dos pequenos Estados do ponto de vista da “independência nacional”, “neutralidade”, etc., é permanecer no terreno da mitologia imperialista. A luta é pelo domínio mundial. A questão da existência da URSS será resolvida nela. (...) ao procurar garantias militares contra o imperialismo, o Estado operário (...) pode se ver obrigado a violar a independência deste ou daquele pequeno Estado. Derramar lágrimas sobre a rudeza da luta de classes no plano interno ou internacional pode ser próprio de filisteus democráticos mas não de revolucionários proletários. Em 1921 a República Soviética sovietizou à força a Geórgia, que constituía um caminho aberto para o assalto imperialista no Cáucaso. (...) a salvação da revolução socialista impunha-se aos princípios democráticos formais.[cxxxii]

Segundo diversos historiadores[cxxxiii], também houve um protocolo secreto, definindo as áreas de influência da Alemanha e da URSS e as fronteiras a serem respeitadas em caso de conflito militar com a Polônia. Segundo Schirer, esse “Protocolo Secreto” afirmava:

Os plenipotenciários abaixo-assinados, por ocasião da assinatura do Tratado de não-agressão entre a Alemanha e a União Soviética, discutiram em conversações estritamente confidenciais a questão da delimitação de suas esferas de interesse na Europa Ocidental.

1.   No caso de uma transformação territorial e política nos territórios pertencentes aos Estados Bálticos (Finlândia, Letônia e Lituânia) a fronteira ao norte da Lituânia representará a fronteira das esferas de interesse tanto da Alemanha como da URSS.

2.   No caso de uma transformação política e territorial dos territórios pertencentes ao Estado polonês, as esferas de interesse quer da Alemanha como da URSS serão limitadas aproximadamente pela linha dos rios Narew, Vístula e San.

3.   Quanto ao interesse de se manter um Estado polonês independente e de como as fronteiras deste Estado seriam traçadas, podem ser definitivamente determinadas somente no curso dos futuros acontecimentos políticos. Em qualquer caso, ambos os governos resolverão esta questão por meio de um entendimento amistoso.[cxxxiv]

Tudo indica que houve realmente esse protocolo secreto, anexo ao acordo germano-soviético de não-agressão, relacionado com o ataque – por todos previsto e sabido – que a Alemanha preparava contra a Polônia:

Um protocolo secreto excluía a Alemanha dos Estados bálticos e das partes ocidentais da Polônia – o território a leste da linha Curzon, habitado por ucranianos e russos brancos. (...) O acordo de Brest-Litovsk foi finalmente desfeito, com o consentimento da Alemanha, ao invés do apoio das potências ocidentais. (...) O pacto não era nem uma aliança nem um acordo para a divisão da Polônia. Munique fora uma autêntica aliança de partilha: os ingleses e franceses a impuseram aos checos. O governo soviético não empreendeu nenhuma ação semelhante contra os poloneses – apenas prometeu ficar neutro, ou seja, o que os poloneses sempre lhes haviam pedido, e que a política ocidental também desejava, implicitamente. Mais ainda, o acordo era, em última análise, anti-alemão: limitava o avanço germânico no leste, em caso de guerra (...) é difícil imaginar que outra política poderia ter a Rússia adotado (...) a neutralidade, com ou sem um pacto formal, era o máximo que a diplomacia soviética poderia obter. E a limitação das conquistas alemãs na Polônia e no Báltico tornavam o pacto formal atraente.[cxxxv]

Precisamente para evitar esse ataque, a URSS havia procurado durante 5 meses, infrutiferamente, estabelecer um tratado de ajuda mútua e um convênio militar com a França e a Inglaterra. Como afirmou De Gaulle, “na atitude de Stalin, fazendo de repente causa comum com Hitler, divisava-se a sua convicção de que os franceses ficariam imóveis; que, assim, o Reich tinha as mãos livres; e que era preferível partilhar a presa a deixar-lha inteiramente.[cxxxvi]

Sabendo-se que a Polônia fazia fronteiras com a URSS e que em 1920, pela paz de Riga, lhe havia arrancado pela força uma parte da Ucrânia e da Bielo-Rússia – com o apoio das potências ocidentais – seria ingenuidade imaginar que a URSS fosse aceitar que a Alemanha ocupasse toda a Polônia, inclusive os territórios que lhe tinham sido usurpados naquela ocasião. Como nos diz Shirer:

A Rússia (...) não havia esquecido que a Polônia, em dois anos de guerra contra ela (1920-1921) – enquanto enfraquecida pelas perdas sofridas na Grande Guerra, pela guerra civil e pelos ataques das nações aliadas do Ocidente – havia, às expensas da União Soviética, estendido a fronteira 240 quilômetros a leste da etnográfica Linha Curzon, fronteira que transferira para o domínio dos poloneses quatro milhões e meio de ucranianos e um milhão e meio de russos brancos.[cxxxvii]

Da mesma forma, era lógico que a URSS procurasse resguardar a sua segurança, exigindo que a Alemanha respeitasse as fronteiras dos países Bálticos – Lituânia, Letônia, Estônia, Finlândia – Estados criados pelo Tratado de Versalhes em territórios do antigo Império Russo (e onde o processo revolucionário havia sido abortado pela intervenção armada imperialista), com o único objetivo de cercá-la e de “deter o comunismo”:

Antes da Grande Guerra, os três Estados Bálticos propriamente ditos – a Lituânia, a Letônia e a Estônia – e mais a Finlândia faziam parte do Império dos Czares. (...) Os Estados Bálticos são criações de ontem. (...) A Finlândia atual nasceu, pode-se dizer, na batalha de Tampere, em que foram derrotados os bolcheviques, em começos de 1918.[cxxxviii]

A assinatura do acordo germano-soviético de não-agressão também viabilizou a melhoria das relações com o Japão – com quem a URSS se encontrava em luta na região da Mongólia desde maio de 1939. Depois de uma nota de protesto contra o acordo de não-agressão, considerado contrário à letra e ao espírito do Pacto Anticomintern, o Japão foi obrigado a modificar a sua política externa em relação à URSS, e buscar solucionar os conflitos existentes. Assim, em 15 de setembro de 1939, a URSS, a Mongólia e o Japão assinaram um acordo acabando com o conflito de Calguin-Gol, complementado em 13 de abril de 1941, por um acordo de não-agressão, por cinco anos.

Churchill, referindo-se ao acordo germano-soviético de não-agressão, dirá em suas memórias:

para os Sovietes era uma necessidade vital procurar que os exércitos alemães se concentrassem no Oeste (…) Agora as suas fronteiras situavam-se muito mais ao Leste do que na guerra anterior. A Rússia necessitava, pela força ou pela astúcia, ocupar os Estados Bálticos e grande parte da Polônia antes de sofrer o ataque inimigo. Esta política foi realista em alto grau. [cxxxix]

            E Isaac Deutscher – crítico implacável de Stalin e do governo soviético – assim opinou sobre o acordo germano-soviético:

No pacto prometeram permanecer rigorosamente neutros um em relação ao outro, caso um deles se envolvesse na guerra. O documento não continha garantias de amizade, salvo a obrigação dos dois governos solucionarem suas divergências “mediante a troca amigável de opiniões”. (...) ele, Stalin, não sentiu remorsos. No seu entender a guerra era, de qualquer maneira, inevitável; mesmo que ele não tivesse feito acordo com Hitler, a guerra teria rebentado logo ou um pouco mais tarde, em condições incomparavelmente menos favoráveis ao seu país. (...) Ele, Stalin, estava apenas afastando a conflagração da Rússia. (...) não tinha dúvida que a Polônia sucumbiria e que as potências ocidentais não poderiam ou não quereriam dar-lhe ajuda efetiva. Conseqüentemente, via a Alemanha trocar sua posição por um possível ataque à Rússia situada várias centenas de quilômetros a leste. Compreendeu que tinha o dever de reduzir o risco estratégico inerente a esta troca; e só poderia reduzi-lo tomando parte no desmembramento da Polônia. (...) Stalin agia unicamente em função de intuitos imediatos de segurança, sem visar a expansão pela expansão (...) Seu propósito agora era ganhar tempo e, mais uma vez, tempo, para executar seus planos econômicos, construir o poderio russo e depois lançar esse poderio na balança quando os outros beligerantes estivessem nas últimas.[cxl]

Mesmo Pierre Broué – que prefere apresentar o acordo de Munique como um fracasso de Stalin em sua busca de uma aliança com Paris e Londres, e não como uma capitulação das democracias ocidentais – é obrigado a reconhecer que “o Pacto Germano-Soviético tinha (...) um caráter defensivo para a própria URSS (...) ao desviar para o oeste o avanço alemão.”[cxli] Já Mandel – depois de concordar que “considerando a irresolução (...) dos governos francês e inglês sobre a colaboração militar em uma agressão alemã contra a Polônia, o governo soviético tinha todo o direito de garantir sua segurança imediata no caso de uma conquista alemã desse país[cxlii] - questiona o protocolo secreto e o veto de Stalin à criação de um Estado polaco sob controle nazista.

Quanto a Fernando Claudin, depois de sugerir – sem base nos fatos históricos – que o acordo germano-soviético “era visualizado por Stalin como o prólogo de um acordo de largo alcance com a Alemanha hitleriana” e que os dirigentes da URSS adotavam “posições que, na prática, estimulavam as conquistas alemãs na Europa[cxliii], desvia a discussão para a questão do “modo como este pacto foi utilizado e aplicado”:

Não vamos abordar aqui o problema de saber se o pacto germano-soviético resultou de uma opção deliberada de Stalin, posto ante duas possibilidades – aliança com a Alemanha ou aliança com as “democracias”. Nem discutiremos a viabilidade da segunda possibilidade – como o faz ainda hoje a versão oficial soviética Este problema permanece como objeto de debate entre os historiadores e só poderá ser plenamente esclarecido quando os arquivos soviéticos forem franqueados (...) Admitindo que o objetivo essencial da diplomacia soviética fosse impedir que as potências imperialistas constituíssem um bloco contra a URSS e que, para impedir essa eventualidade, não restasse ao governo soviético outra opção, em agosto de 1939, senão o pacto com a Alemanha, isto não justifica, em si mesmo, o modo como este pacto foi utilizado e aplicado por Stalin.[cxliv]

Roy Medvedev, historiador russo, crítico ferrenho de Stalin, diria anos mais tarde:

o fato é que não se pode incluir o pacto germano soviético de não-agressão na lista dos crimes e erros de Stalin. O governo Soviético viu-se obrigado a assinar esse pacto porque a Inglaterra e a França favoreciam o fascismo alemão e impediam que fossem consumadas negociações que levassem à assinatura de um pacto de assistência mútua com a URSS. (...) a França e a Grã-Bretanha entregavam-se a um jogo político perigoso: as duas esperavam conseguir um acordo com Hitler e procuravam desviar a agressão alemã na direção do Leste. (...) Foram os meios dirigentes da Inglaterra e da França (...) que permitiram à Alemanha reconstruir uma poderosa máquina militar, na esperança de que essa força se voltasse contra o bolchevismo. (...) Tais circunstâncias obrigavam a União Soviética a se proteger, procurando aproveitar-se dos conflitos em que se achavam envolvidos os Estados imperialistas: em 1939, o pacto de não-agressão com a Alemanha serviu a esse fim. (...) a União Soviética não podia ficar indiferente à sorte dos ucranianos e dos bielorussos, cujos territórios haviam sido anexados quando do ataque polonês ao jovem Estado soviético. A chegada do Exército Vermelho aos territórios da Bielorrússia e da Ucrânia era, portanto, um ato de libertação justificada (...) a União Soviética não se apoderou de territórios originalmente pertencentes à Polônia: para os ucranianos e bielorrussos, esta operação do Exército Vermelho não foi mais que um ato de libertação.[cxlv]

            No mesmo rumo vai Giuliano Procacci quando afirma que “hoje não são poucos os estudiosos certamente insuspeitos de simpatias por Stalin que reconhecem que, depois de Munique, as margens de manobra para a diplomacia soviética se haviam restringido a tal ponto (...) que não permitiam opções diferentes das que foram feitas.”[cxlvi] E Nelson Werneck Sodré, conhecido historiador brasileiro, escreveu sobre o acordo germano-soviético: “as manobras políticas dos chamados Aliados eram feitas para incitar Hitler contra a União Soviética. Os dois – Alemanha e União Soviética – deveriam se enfrentar e se destruir. (...) a União Soviética precisava se preparar para um conflito que era inevitável. (...) A União Soviética fez bem em assinar o pacto e ocupar uma área da Polônia. Se não, os alemães iriam ocupar. A cláusula nem precisaria ser secreta.”[cxlvii] Jacob Gorender também considera o acordo germano-soviético foi uma imposição da política da imperialista que visava isolar a URSS mas, sem qualquer fundamento, critica a sua interpretação pela liderança soviética como uma aliança:

Penso que, nas circunstâncias de 1939, a União Soviética não tinha alternativa, a não ser fazer o pacto de não-agressão com a Alemanha. Todas as tentativas de um acordo efetivo com a Inglaterra e com a França para uma reação contra a política agressiva da Alemanha, tinham fracassado. Era evidente que a França e a Inglaterra, através dos seus diplomatas, faziam todo o possível para bloquear a consumação de um acordo anti-hitlerista. Isolada, não restou à União Soviética outra saída além do pacto de não-agressão com a Alemanha. (...) O erro foi que a liderança stalinista interpretou o pacto de não agressão como um pacto de aliança (...) Hoje é possível ver que o pacto de não-agressão foi uma imposição da política hipócrita aplicada pela Alemanha, França Inglaterra em 1939. A União Soviética não tinha saída.[cxlviii]

ATAQUE ALEMÃO À POLÔNIA E A JÁ PREVISÍVEL PASSIVIDADE INGLESA E FRANCESA

Quando a Alemanha atacou a Polônia, no dia 1º de setembro de 1939, nem Inglaterra nem a França moveram um único dedo para ajudá-la, apesar de todas as promessas e compromissos. Protegidos detrás da linha Maginot, os exércitos franceses não se moveram 1 milímetro. A causa estava no seu interesse de que Hitler avançasse em direção à URSS:

É preciso dizer que certos meios queriam ver o inimigo mais em Stalin do que em Hitler. Preocupavam-se muito mais com os meios de ferir a Rússia (...) do que com a maneira de triunfar sobre o Reich. Muitos exprimiam abertamente a sua admiração por Mussolini. Alguns, mesmo no seio do Governo, trabalhavam para conseguir que a França obtivesse as boas graças do Duce, cedendo-lhe Jibuti, o Chade, parte de um condomínio sobre a Regência tunisina.[cxlix]

Mas a repressão aos comunistas foi feroz:

Em 1939, a declaração de guerra da França não foi acompanhada de operações militares. (...) Mas havia uma guerra e, portanto, devia haver um inimigo. Descobriram-no nos comunistas franceses. Foram fechados L’Humanité e Ce Soir. Não somente o Partido Comunista foi proscrito, mas também centenas de associações, de uniões, de ligas, suspeitas de simpatizarem com o comunismo. Começaram as prisões em massa. O Parlamento concedeu autorização ao Estado para processar os deputados comunistas: eram acusados de se recusarem a repudiar a União Soviética. Isto era um pretexto; na realidade a burguesia se vingava dos operários pelo medo que lhe haviam inspirado em 1936.[cl]

            Do outro lado do canal da Mancha, a orgulhosa Albion tampouco se moveu. Nenhum avião decolou da Inglaterra ou da França para ajudar a Polônia contra os ataques da Luftwaffe ou das divisões Panzer: “Quanto a aviação, essa não realizou nenhum ataque sobre o território teuto, segundo parece, por uma decisão tomada pelos governos francês e britânico ‘com o fim de evitar reação da Aviação alemã que poderia acarretar graves repercussões em nossa concentração.[cli]

            Suas poderosas marinhas tampouco entraram em ação para apoiar a Polônia. Ambas restringiram-se a declarar no dia 3 de setembro uma guerra “platônica” à Alemanha, enquanto assistiam passivamente a ocupação da Polônia: “No dia 3 de setembro, Grã-Bretanha e França entraram na guerra, embora pouco houvesse em matéria de luta até maio do ano seguinte. Enquanto a Blitzkrieg triunfava no leste, os aliados suportavam o tédio da Stzkrieg, ou a ‘guerra de mentirinha’.[clii]

            A imobilidade da França e da Inglaterra no front oeste determinou a derrota polonesa, como reconheceram depois da guerra diversos generais hitlerianos:

O General Guderian escreve: “Ficamos espantados, abismados mesmos, que os franceses não tivessem aproveitado a ocasião oferecida. Era impossível, àquela época, compreender as razões de tal abstenção”. (...) O General Keitel declarara, a esse respeito, em Nuremberg: (...) concluímos que a França e a Inglaterra não tinham com seriedade, a intenção de fazer a guerra.” (...) E a mesma conclusão é tirada pelo General von Lossberg: “por que os franceses não se aproveitaram de sua esmagadora superioridade para empurrar de roldão as nossas fracas tropas (...) de Oeste, mesmo que fosse apenas para atingir o Reno e lá paralisarem, praticamente a bacia do Ruhr? Teria sido para nós um golpe mais ou menos mortal!” (...) Do general Jodl em Nuremberg: “Em 1939 a catástrofe foi evitada porque as 110 Divisões, que possuíam aproximadamente os franceses e os ingleses, permaneceram completamente inativas diante das 23 Divisões alemãs do Oeste!”[cliii]

Se tivessem se movimentado as forças que dispunham de uma enorme superioridade (…), a guerra teria terminado inevitavelmente. Na Polônia ter-se-iam interrompido as ações de combate. No máximo dentro de uma semana estariam perdidas as minas do Sarre e a região do Ruhr.[cliv]

O Presidente Roosevelt proclamou a neutralidade dos Estados Unidos e o reacionário e anti-soviético governo polaco de Moscicki – que poucos meses antes participara dos despojos da Checoslováquia, que se negara a firmar qualquer documento em que figurasse a assinatura da URSS e que se opusera a permitir a passagem de tropas soviéticas pelo seu território, sequer para defendê-la – capitulou vergonhosamente fugiu para a Romênia, onde solicitou asilo, apesar do heroísmo do povo polaco que continuava resistindo. Já no dia 7, Ryds-Smigly – comandante em chefe do exército da Polônia – abandonou Varsóvia, deixando a sua defesa aos cuidados dos trabalhadores. Os generais polacos, acostumados somente a reprimir o povo, fugiram para a Romênia.

Só no dia 17 de setembro, depois de o governo polonês haver abandonado o país, a União Soviética ocupou a Ucrânia ocidental e a Bielo-Rússia ocidental:

A 16 de setembro, as tropas alemãs se encontram diante de Stanislavov, isto é, a 100 quilômetros da fronteira soviética. Então é que a URSS intervém (17 de setembro). As forças soviéticas ocupam a parte oriental da Polônia, povoada essencialmente por bielo-russos e ucranianos. A linha de demarcação ressuscita mais ou menos a linha Curzon.[clv]

No dia 17 de setembro de 1939 (…) as tropas russas ocuparam metodicamente as províncias polacas do Leste. Dois dias mais tarde tinham a metade da Polônia em suas mãos. O Führer não contava com essa rápida penetração dos vermelhos. Os russos se moveram com tal rapidez que não só lhe cortaram o caminho em direção aos ricos poços de petróleo de Galitzia, como lhe bloquearam a passagem às jazidas da Romênia.[clvi]

Em 28 de setembro de 1939, Molotov e Ribbentrop se reuniram e estabeleceram um novo Tratado de Amizade e de Fronteiras, que estipulava que a Polônia deixaria de existir como Estado independente:

É inteiramente normal que a URSS, tendo assinado um pacto de não-agressão com o Reich, conduzisse um jogo diplomático, justo e necessário do seu ponto de vista, a fim de não ressuscitar um Estado satélite da Alemanha, no caso o Estado polonês que lhe havia criado tantas dificuldades desde o primeiro dia de sua formação e que, em 1939, havia sido uma das causas principais do insucesso do pacto a três.[clvii]

Segundo este tratado, a Polônia ficava dividida “seguindo mais ou menos a velha linha Curzon, assinalada em dezembro de 1919 pelo Conselho Supremo Aliado como a possível fronteira leste da Polônia[clviii]:

O artigo do Temps de 1º de outubro de 1939 considera que “desde um ponto de vista estritamente russo este traçado tem toda a característica de uma linha étnica e lingüística”. E o correspondente do Temps em Moscou declarou no mesmo dia: “Os russos mantém todas as regiões povoadas por ucranianos e russos brancos (bielo-russos). A fronteira segue, tanto quanto possível, sem buscar vantagem, uma linha de demarcação étnica plausível.[clix]

Outro historiador dirá: “a URSS (...) se anexava pura e simplesmente a Rússia Branca, a Lituânia [o que é uma incorreção], a Galitzia Oriental e os confins da Ucrânia (territórios onde, a dizer a verdade, os polacos de origem constituíam em geral uma minoria).[clx] Um mês depois, através de eleições para as assembléias populares, estas regiões instauraram o poder dos sovietes no seu território e solicitaram o ingresso na URSS, sendo integradas, respectivamente, nas Repúblicas da Ucrânia e da Bielo-Rússia.

Mesmo mantendo suas críticas à URSS, Trotski teve que reconhecer a correção de Stalin em não permitir que Hitler ocupasse toda a Polônia e ter exigido que os antigos territórios da Ucrânia e da Bielo-Rússia retornassem à URSS:

o Kremlin com os seus métodos burocráticos deu um impulso à revolução socialista na Polônia (...) as massas populares da Ucrânia Ocidental e da Bielo-Rússia sentiram este impulso, entenderam seu significado e utilizaram-no para levar a cabo uma transformação drástica nas relações de propriedade. (...) Nas eleições para a Assembléia Nacional da Ucrânia Ocidental e da Bielo-Rússia Ocidental, o programa eleitoral, ditado, naturalmente, pelo Kremlin, inclui três pontos extremamente importantes: inclusão de ambas as províncias na Federação da URSS; confiscação do latifúndio em favor dos camponeses; e nacionalização da grande indústria e dos bancos. Os democratas ucranianos, a julgar pela sua conduta, consideraram um mal menor estarem unificados, sob a jurisdição de um só Estado. E do ponto de vista da futura luta pela independência estão certos. Quanto aos outros dois pontos do programa, poder-se-ia pensar que não poderia haver nenhuma dúvida entre nós sobre o seu caráter progressista. (...) Dan, o líder dos mencheviques, escreveu em 19 de outubro: “de acordo como o testemunho unânime de todos os observadores, a aparição do Exército e da burocracia soviéticas provocou, não só no território ocupado por eles, como também para além dos seus limites, um impulso (!!!) à desordem social e às transformações sociais”. (...) Outro autor menchevique escreve: (...) “o próprio fato da entrada das tropas soviéticas nos territórios da Polônia Oriental, com suas velhas relações agrárias semifeudais, tinha que provocar um tempestuoso movimento agrário. Com a aproximação das tropas soviéticas, os camponeses começaram a tomar os latifúndios dos grandes proprietários e a formar comitês de camponeses.” (...) Cito o testemunho dos mencheviques porque (...) não são suspeitos de terem capitulado perante o estalinismo. (...) Para os camponeses da Galícia e da Bielo-Rússia Ocidental, a transformação agrária foi da maior importância. A Quarta Internacional não poderia boicotar esta transformação com o argumento de que a iniciativa foi tomada pela burocracia reacionária. O nosso estrito dever era participar nesta transformação, junto aos operários e camponeses e, nessa medida, junto ao Exército Vermelho.[clxi]

É preciso destacar que – ao contrário do que muitos trotsquistas contemporâneos divulgam – Trotsky, sem abandonar as suas críticas a Stalin e ao regime soviético, defendeu abertamente a ocupação da Polônia Oriental pela URSS e as transformações revolucionárias que aí ocorreram, assim como o posterior ataque da URSS à Finlândia reacionária:

O Kremlin participa de uma nova divisão da Polônia, o Kremlin se apodera dos Estados Bálticos, o Kremlin se dirige para os Balcãs, a Pérsia e o Afeganistão; em outras palavras, o Kremlin continua a política do imperialismo czarista. Será que também neste caso temos o direito de qualificar de imperialista a política do Kremlin? (...) A revolução proletária que se produziu no território do império czarista tentou, desde o seu início, conquistar – e durante muito tempo conquistou – os países bálticos; tentou penetrar a Romênia e a Pérsia e, em certo momento, dirigiu seus exércitos para Varsóvia (1920). As linha da expansão revolucionária foram semelhantes às do czarismo, uma vez que a revolução não modifica as condições geográficas. Por isso, precisamente, já naquela época, os mencheviques falaram de imperialismo bolchevique, como calcado nas tradições da diplomacia czarista. A democracia pequeno-burguesa recorre, ainda hoje em dia, e de bom grado, a este argumento. Nisso, repito eu, não temos motivo algum para imitá-la. (...) a ocupação da Polônia oriental pelo Exército Vermelho é um “mal menor” em comparação com a ocupação deste mesmo território pelas tropas nazistas.[clxii]

Foi extremamente eloqüente em sua unanimidade e sua fúria, a campanha que lançou a burguesia mundial por ocasião da guerra fino-soviética. Nem a perfídia, nem a violência, anterior a esta guerra excitaram a indignação da burguesia, pois toda a história da política mundial foi escrita em termos da perfídia e da violência. Seu medo e sua indignação despertaram diante da perspectiva de uma reviravolta social na Finlândia, idêntica à provocada pelo Exército Vermelho na Polônia Oriental. O que foi colocado em questão foi uma nova ameaça para a propriedade capitalista. A campanha anti-soviética, que tinha em todos os pontos um caráter de classe, revelou uma vez mais que a URSS (...) continua sendo ainda um Estado operário que apavora a burguesia no mundo inteiro. (...) A submissão da Polônia oriental, garantia da aliança com Hitler e garantia contra esse mesmo Hitler, é acompanhada da nacionalização da propriedade semi-feudal e capitalista na Ucrânia ocidental e na Bielorússia ocidental. Sem essa medida, o Krêmlin não poderia incorporar à URSS os territórios ocupados. A Revolução de outubro estrangulada e profanada fazia saber por isto que ela ainda estava viva.[clxiii]

Referindo-se a essas opiniões de Trotsky, Deutscher afirmará:

Totsky insistiu com a maior firmeza que a União Soviética continuava sendo um Estado Operário, com direito a ser defendido incondicionalmente contra todos os seus inimigos capitalistas, fascistas e democráticos. Nem sequer negou a Stalin o direito de negociar com Hitler, ainda que ele mesmo pensava que o pacto germano-soviético não havia dado nenhuma vantagem importante à União soviética; ele teria preferido uma aliança soviética com o ocidente. Mas sustentava que o problema de com quem devia aliar-se a União Soviética devia ser resolvida unicamente tendo por base a conveniência, e que a escolha não implicava nenhum princípio político ou moral, porque tanto as potências ocidentais como o Terceiro Reich lutavam só por seus interesses imperialistas. O que Trotsky repudiava na política de Stalin não era tanto a sua escolha de um aliado ou sócio, senão fazer da escolha uma virtude e proclamar a sua solidariedade ideológica com qualquer que fosse seu aliado do momento.[clxiv]

Em 28 de setembro, a URSS assinou um acordo de assistência mútua com a Estônia, em 5 de outubro, com a Letônia e em 10 de outubro com a Lituânia:

Não se pode deixar de sublinhar a posição ao mesmo tempo cômica e trágica dos estadistas do Báltico. Inibidos pelo pavor da Rússia, voltaram-se para Berlim. Agora, o Reich concluiu à custa deles, o seu acordo com os Sovietes (...) Paga o Reich, como se vê, a alto preço o seu tratado de amizade com os Sovietes. Porque o Baltikum (...) foi sempre considerado pelos nazistas um campo de natural expansão do Reich, uma das mais próximas etapas do Drang nach Osten.[clxv]

Em 1º de outubro, o próprio Churchill, falando na Câmara dos Comuns, reconheceu:

É de toda evidência que os russos deviam forçosamente montar guarda nessa linha, a fim de garantir seu país contra a ameaça nazista. Seja como for, essa linha existe, o estabelecimento de uma frente oriental é hoje um fato consumado e a Alemanha nazista não ousa atacar essa frente. Quando o Sr. Ribbentrop foi convocado a Moscou, na última semana, era para tomar conhecimento desse fato e reconhecer que os nazistas deviam renunciar inteira e imediatamente às suas pretensões sobre os Estados Bálticos e sobre a Ucrânia.[clxvi]

Também William Shirer – crítico da URSS e do acordo germano-soviético – teve que reconhecer a habilidade e a firmeza do Governo Soviético nas negociações após o ataque de Hitler à Polônia:

Stalin apresentava sua conta e Hitler, pela primeira vez, pelo menos teve que pagá-la. Ele estava abandonando imediatamente não só a Estônia mas a Látvia, ambas as quais - concordara no Pacto Nazi-Soviético – pertenciam à esfera dos interesses soviéticos. Antes de terminado o dia, renunciava também à Lituânia, na fronteira nordeste da Alemanha, a qual, segundo as cláusulas secretas do Pacto de Moscou, pertencia à esfera do Reich. (…) Hitler guerreou contra a Polônia e ganhou a batalha, mas o maior vencedor foi Stalin, cujas tropas quase não disparam um tiro. A União Soviética obteve quase metade da Polônia e um baluarte nos Estados Bálticos. Isso bloqueava a Alemanha mais solidamente do que nunca em dois de seus principais objetivos a longo prazo: o trigo ucraniano e o petróleo romeno, dos quais ela tinha grande necessidade se quisesse sobreviver ao bloqueio britânico. Mesmo a região petrolífera de Borislav- Drogobycz, na Polônia, que Hitler desejava, foi exigida por Stalin, e com êxito, e este último prazeirosamente concordou em vender aos alemães o equivalente da produção anual dessa área.[clxvii]

            E o ex-embaixador dos EUA na URSS, Joseph Davies, anotou em seu diário em novembro de 1939:

Nenhuma pessoa bem informada podia ter concebido tampouco, há seis meses, que a Alemanha pagaria um preço tão elevado à Rússia para manter fechadas suas portas do leste quando atacou a Polônia. (...) Tudo isso cria uma situação nada vantajosa para Hitler. Entregou o Báltico (...) retirou-se da Ucrânia; seu poder econômico está restrito somente à Romênia e a uma limitada influência sobre a Bulgária ou a Hungria. (...) Considerando o grande conceito de “Lebensraun” (Espaço Vital) que Hitler predisse ao seu povo e ao mundo, encontra-se agora reduzido a um círculo muito pequeno. Sua única saída parece ser atualmente a oeste. (...) os Sovietes estão seguindo uma política independente baseada somente no seu próprio interesse e (...) Hitler não está muito satisfeito com isso.[clxviii]

            Depois de examinarmos todo esse quadro, seria interessante perguntar-nos se Hitler teria atacado a Polônia caso a Inglaterra e a França aceitassem o acordo de ajuda mútua com a URSS? Ou – caso mantivesse esse ataque – se nessas circunstâncias conseguiria fazer frente, simultaneamente, a essas três potências militares? Ou, imaginar o que aconteceria no caso do ataque alemão à Polônia ocorrer sem a existência do acordo de não-agressão germano-soviético?[clxix]Não teria sido, nesse caso, inevitável o confronto entre a URSS, isolada, e a Alemanha, desde o primeiro dia da Segunda Guerra Mundial? E a quem, exatamente, interessava essa situação? Mas a histórias não é feita de “SEs”!

ERROS DA URSS E DO MOVIMENTO COMUNISTA INTERNACIONAL

O maior erro vinculado à assinatura do tratado de não-agressão germano-soviético foi confundir um acordo entre os Estados Soviético e Alemão (firmado por razões militares e de Estado) com a tática e a estratégia do movimento comunista internacional. Ainda que esta questão seja controversa, o que é certo é que, além de uma grande confusão entre os militantes, ocorreram alterações na política do movimento comunista internacional, sob influencia da nova postura da URSS. Paolo Spriano, referindo-se às reações de partidos comunistas da Europa Ocidental após a assinatura do “pacto”, afirma:

As reações de Thorez e da direção do PCF até e mesmo após a deflagração da guerra (o mesmo se pode dizer dos comunistas italianos e dos ingleses) são de tal ordem que implicam, por si só, uma atitude autônoma em relação ao pacto russo-alemão. (...) O PCF continua a afirmar que “se Hitler, malgrado tudo, desencadeia a guerra, então saiba que encontrará diante de si, unido, o povo da França, os comunistas na primeira linha, para defender a segurança do país, a liberdade e a independência dos povos”. (...) o pacto russo-alemão pode ser justificado sob o ponto de vista da segurança da URSS, mas os comunistas franceses – dizem seus dirigentes – continuam sendo uma força patriótica que saberá assumir inteiramente seus próprios deveres nacionais. (...) depois da invasão da Polônia (...) o PCF afirma: “Hitler é o único responsável pela guerra, como representante máximo do sistema hitleriano de destruição das liberdades democráticas. Hitler, como chefe do maior Estado totalitário, é o inimigo número um de todas as classes trabalhadoras de todos os países”.[clxx]

Em 25 de agosto de 1939, Thorez, em nome da representação comunista na Câmara, divulgou comunicado afirmando que “o Partido Comunista aprova as medidas tomadas pelo governo para defender nossas fronteiras e dar, se necessário, auxílio ao país ameaçado pela agressão, ao qual estamos ligados por um tratado de aliança.” Apesar disso, no dia seguinte, Daladier mandou fechar dois diários comunistas – o Humanité e o Ce Soir – e proibiu e passou a perseguir o Partido Comunista.

Porém, segundo Spriano, em fins de setembro de 1939 o PCF teria recuado dessa postura “em razão de uma exigência do Comintern e no contexto de uma trajetória de alinhamento que todas as seções realizam (...) a nova linha da Internacional responde a pressões urgentes de ordem política e diplomática.”[clxxi] Na verdade, em novembro de 1939, o Comitê Executivo do Comintern definiu sua posição sobre a guerra em curso:

a guerra era imperialista de ambas as partes, injusta e reacionária, apontando como culpados dela “todos os governos capitalistas, em primeiro lugar todas as classes dominantes dos Estados beligerantes”.[A Internacional Comunista, 1939, nº 8-9, p. 4] Esta definição sublinhava as aspirações imperialistas dos beligerantes, mas não tinha em conta a tendência nacional-libertadora do conflito. A direção do Comintern considerava que a guerra acabara por igualar os objetivos dos dois grupos capitalistas. Este critério foi formulado, principalmente, sob a influência da política anti-soviética das esferas governantes da Inglaterra e da França, que queriam conluiar-se com a Alemanha hitleriana para lançá-la contra a URSS. As intenções anglo-francesas manifestaram-se com particular nitidez durante a guerra soviético-finlandesa. Além de incitarem os reacionários finlandeses a fazer a guerra à URSS, os governos da Inglaterra e da França forneciam-lhes armas em abundância. Os Estados Maiores Generais dessas duas potências propunham-se enviar as suas tropas para a Finlândia e projetavam agredir a União Soviética a partir do Sul.[clxxii]

Assim, inicialmente o Comintern caracterizou a II Guerra Mundial como uma guerra inter-imperialista, similar à I Guerra Mundial, contra a qual deviam levantar-se todos os povos do mundo. Em 1946, o próprio Stalin refutará essa caracterização errônea da guerra ao afirmar que “a Segunda Guerra Mundial teve desde o início um caráter de guerra antifascista e de libertação e uma de suas tarefas era o restabelecimento das liberdades democráticas”.[clxxiii]

O historiador inglês Alexander Werth, analisando a postura soviética após o tratado germano-soviético, afirma que “durante o período do Pacto (...) a imprensa russa guardou um acentuado alheamento a respeito da Alemanha nazista. Não foram feitos comentários favoráveis sobre quaisquer aspectos do regime nazista em qualquer época”.[clxxiv]

Mas, em 31 de agosto, ao defender o acordo germano-soviético perante o Soviete Supremo, Molotov afirmou: “É recente o fato de que os nazistas alemães seguiam uma política externa essencialmente hostil à União Soviética. Sim, há bem pouco tempo a URSS e a Alemanha eram inimigas. Agora a situação mudou e já não o somos mais.[clxxv]

E, segundo Ellenstein, em 30.11.39, o Pravda publicou uma declaração atribuída a Stalin de que “não é a Alemanha que ataca a França e a Inglaterra; foram a Inglaterra e a França que atacaram a Alemanha”.[clxxvi] No mesmo rumo foi a Declaração Conjunta Germano-Soviética de 29.09.39: “os Governos da União Soviética e da Alemanha declaram que a liquidação da guerra entre a Alemanha, de um lado, e a Grã-Bretanha e a França, de outro, seria do interesse de todas as nações. Não obstante, se os esforços de ambos os governos forem infrutíferos (...) a responsabilidade da continuação da guerra pesará somente sobre a Grã-Bretanha e a França.”[clxxvii]

Ainda que a tese de que a declaração de guerra partira da Inglaterra e da França, e não da Alemanha, pudesse ser formalmente correta, é evidente que isso era politicamente insustentável, pois fora uma resposta a toda uma série de agressões alemãs. A 31 de outubro, voltando a falar perante o Soviete Supremo, Molotov aprofundaria essa análise “pragmática”:

o conceito de “agressão” mudou inteiramente. Não podemos empregar hoje esta palavra no mesmo sentido em que fazíamos há três anos ou quatro meses atrás. Agora a Alemanha se bate pela paz, enquanto a Inglaterra e a França favorecem a continuação da guerra. Como vedes, os papéis se inverteram.[clxxviii]

Tanto na Inglaterra quanto na França, os adeptos da guerra declararam à Alemanha uma guerra ideológica que recorda as velhas lutas religiosas. (...) Uma guerra deste tipo não se justificaria hoje por nenhum motivo. A ideologia hitleriana, como qualquer outra ideologia, pode ser aceita ou recusada: este é um problema que diz respeito às idéias políticas pessoais. Mas qualquer um pode ver que uma ideologia não pode ser destruída com a força. Por isto, não é só insensato, é mesmo criminoso fazer passar esta guerra como uma luta pela destruição do hitlerismo, sob a falsa bandeira de uma batalha pela democracia.[clxxix]

Na verdade, procurava-se dar uma justificativa “teórica” para algo que devia ser explicado por imposições de caráter militar e por “razões de Estado”. Angustiado por esse tipo de análise forçada, Ilya Ehrenburg diria: “Lembrava-me que Bonnet e Chamberlain haviam sonhado com um ataque de Hitler contra a Ucrânia: o pacto germano-soviético fora ditado pela necessidade. A drôle de guerre e as perseguições contra os comunistas demonstravam que Daladier não tencionava combater contra Hitler. Todavia, as palavras de Molotov sobre os ‘antifascistas míopes’ me abalaram. (...) para mim o inimigo principal continuava sendo o fascismo.”[clxxx]

Apesar dos erros, não procedem, porém, as afirmações de que só após a invasão da URSS (21.07.41) os partidos comunistas retomaram a luta contra o nazi-fascismo. Em 6 de junho de 1940, frente ao avanço alemão e ao derrotismo nos altos escalões do governo e das Forças Armadas francesas, o PCF, mesmo proscrito, fez um chamamento à defesa de Paris ameaçada, onde afirmava:

O Partido Comunista consideraria como traição a entrega de Paris aos invasores fascistas. Considera a organização da sua defesa como o primeiro dever nacional. Para isso é necessário: 1. Mudar o caráter da guerra, transformando-a numa guerra nacional pela independência e pela liberdade. 2. Libertar os deputados e militantes comunistas, assim como dezenas de milhares de operários encarcerados ou internados. 3. Deter imediatamente os agentes do inimigo, que pululam no Parlamento, nos Ministérios e inclusive no Estado-Maior e aplicar-lhes um castigo exemplar. 4. Estas primeiras medidas despertariam o entusiasmo popular e tornariam possível a formação de milícias populares, o que se deve decretar sem demora. 5. Armar o povo e fazer de Paris uma cidadela inexpugnável.[clxxxi]

            Sem qualquer vacilação, a burguesia francesa traiu o seu povo e capitulou frente às hordas nazistas, com a única preocupação de “impedir o perigo bolchevista”:

O temor a um levante operário em Paris, mesmo depois da derrota da greve geral de setembro de 1938, seguiu sendo intenso. ‘Weygand e os demais temiam uma Comuna em Paris’, disse o almirante Auphan a Raymond Tournoux. Esta era a principal motivação por traz do desejo de Weygand de terminar a guerra a qualquer preço, um desejo absolutamente compartido por Pétain e Laval. [clxxxii]

                E Goujon acrescenta: A anarquia e o perigo vermelho são as obsessões de Pétain e dos altos militares. Mais tarde, Laval, chefe do governo de Vichy, estenderá essa doutrina a toda Europa: ‘desejo a vitória da Alemanha porque, sem ela, o bolchevismo amanhã estaria em toda parte’.[clxxxiii]

            Em 10 de julho de 1940, o PCF publicou um manifesto ao povo da França conclamando à luta implacável contra os ocupantes e o governo de traição nacional de Vichy e à constituição de uma “Frente pela liberdade, independência e renascimento da França”. Em todos os países ocupados, a Internacional Comunista e os comunistas procuraram organizar a resistência::

a diretriz do Comintern de 22 de Junho de 1940 (...) dava a importante indicação de organizar, atuando com a maior cautela, a resistência às medidas dos invasores: “Frustrando as provocações e evitando as ações prematuras, é necessário sustentar e organizar de todas as maneiras a resistência das massas às medidas de violência depredação e arbitrariedade contra o povo por parte dos invasores. (...) Quaisquer que sejam as condições, os comunistas devem estar com o povo e marchar sempre nas primeiras filas da sua luta libertadora” (...) A atividade dos comunistas franceses para organizar o movimento de resistência deu os primeiros frutos no Outono de 1940 (...) O PCF conseguiu formar grupos armados no âmbito de uma Organização Especial de Combate, embrião de ‘uma organização militar adaptada às condições da luta clandestina e do terror fascista. A resistência aos invasores fascistas foi crescendo também noutros países subjugados. Exortados pelo Partido Comunista da Bélgica (...) em junho de 1940 os operários de Liège paralisaram o trabalho; em setembro foram 10.000 mineiros de Borinage. (...) O Partido Comunista da Noruega organizou no outono do mesmo ano manifestações e comícios antifascistas em várias cidades do país. Os comunistas polacos começaram a criar organizações de luta contra os ocupantes nazis.[clxxxiv]

Ao aproximar-se o fim do verão de 1940 (...) seus enviados e agentes diplomáticos no exterior incentivavam todos os sinais de resistência à “nova ordem”. Os jornais de Moscou, que até então só reservavam aos aliados comentários depreciativos, começaram a noticiar com simpatia a Batalha da Grã-Bretanha e a concitar os patriotas franceses a resistirem à subjugação de seu país. Mesmo antes disto, o Ministério do Exterior alemão tivera de protestar contra a propaganda antinazista a que se entregara Madame Kollontai, representante soviética na Suécia. [clxxxv]

Outro equívoco de Stalin e do governo soviético – que causou grandes prejuízos na fase inicial da luta – foi a ilusão na possibilidade de adiar a guerra com a Alemanha nazista por um prazo demasiado longo, inclusive através de um “apaziguamento” de Hitler. Isso levou a que os fortes indícios da preparação de um ataque alemão fossem desconsiderados e a que os inúmeros avisos nesse sentido fossem considerados “provocações” das democracias ocidentais, com o único objetivo de precipitar a guerra da Alemanha contra a URSS.

As grandes deficiências na preparação do país para a defesa se deviam aos sérios erros de Stalin na apreciação da situação militar estratégica geral e dos possíveis prazos para o começo da luta. Stalin considerava que as notícias procedentes de distintas fontes de que a Alemanha se preparava para atacar a URSS tinham um caráter provocador e eram inspiradas pela imprensa burguesa com o objetivo de lançar a URSS contra a Alemanha. (...) Assim se explica que o primeiro golpe descarregado pelos fascistas foram inesperados (...).[clxxxvi]

Mas isso não dá razão aos que afirmam que a URSS não aproveitou o tempo ganho com o acordo germano-soviético para melhor preparar-se para esse embate. O problema é que o rápido desmoronamento das democracias ocidentais frente à agressão nazista – sem luta e sem desgaste para as hordas hitlerianas, entregando-lhe intactos seus parques industriais e sua máquina militar – acabou por fortalecer enormemente o poderio bélico do nazi-fascismo, tornando mais difíceis as coisas para a URSS.

Tampouco têm fundamento os relatos que apresentam a liderança soviética como totalmente despreparada e acovardada diante da agressão alemã. É Isaac Deutscher, insuspeito de qualquer simpatia pela liderança soviética, quem diz:

Sem dúvida, Stalin empregou os vinte e dois meses de trégua no desenvolvimento intensivo das indústrias bélicas russas e no treinamento das Forças Armadas segundo a mais recente experiência militar. (...) Apesar de todos os seus erros de cálculo, Stalin não estava despreparado para enfrentar a emergência. Havia armado solidamente o país e reorganizado suas forças militares. Seu espírito prático não se aferrara a nenhum dogma estratégico unilateral. Não embalara o Exército Vermelho numa falsa impressão de segurança por trás de alguma variedade russa da Linha Maginot (...) A Rússia iria vender espaço a troco de tempo; o espaço vendido ficaria imprestável para o inimigo, que por ele teria de pagar um preço escorchante. Era este o único meio pelo qual, depois de todos os erros e cálculos inexatos, Stalin podia bater-se com o conquistador da Europa. E enfrentou-o com uma força de vontade superior.[clxxxvii]

CONCLUSÃO

Por todo o exposto, parece-nos evidente que a chamada “Política de Apaziguamento” que as democracias ocidentais mantiveram frente às agressões dos regimes fascistas, correspondeu a uma política consciente dos principais países capitalistas, com o objetivo de isolar o Estado Soviético e a direcionar as agressões da Alemanha militarista no rumo do Leste Europeu:

A política de apaziguamento (...) decorreu de uma concepção puramente política, que foi muito bem expressa pelo jornal fascista francês Combat: “Os partidos da ala direita tiveram a impressão de que (...) uma derrota da Alemanha significaria o esmagamento dos sistemas autoritários que constituem o principal baluarte contra o comunismo e, talvez, a bolchevização da Europa.[clxxxviii]

Ao mesmo tempo que se buscava utilizar a Alemanha como um aríete contra o primeiro Estado Socialista do mundo, se procurava enfraquecer essa rival imperialista com uma luta desgastante contra a URSS. Assim, matava-se “dois coelhos com uma só cajadada”: “Hitler provavelmente pretendia uma grande guerra de conquista contra a Rússia Soviética, se é que tinha algum propósito consciente. Não é provável que pretendesse a guerra que irrompeu contra a Grã-Bretanha e França, em 1939.[clxxxix]

Intoxicadas pelo anticomunismo, as “democracias liberais” não percebiam que essa política oportunista às conduzia ao suicídio. Secundariamente – e aí estão as diferenças entre homens como Chamberlain e Churchill, Daladier e De Gaulle – jogou certo papel a pusilanimidade dos principais líderes dos governos ocidentais de então. Mas mesmo o fato de tais ou quais homens – e não outros – estarem à frente de seus governos, significa que eram quem melhor representavam os interesses dos círculos dirigentes de seus países naquele momento.

O incentivo e o apoio aberto ao rearmamento alemão, a conivência com as agressões japonesas no extremo Oriente, italianas na Abissínia e ítalo-alemãs na Espanha, sinalizaram já no início da década de trinta que o grande capital da Inglaterra, da França e dos Estados Unidos, apoiava o nazi-fascismo como tropa de choque contra o movimento operário e socialista.

A entrega da Áustria, logo dos Sudetos e a seguir de toda a Checoslováquia mostraram ao mundo que as democracias ocidentais não tinham o menor respeito pelas pequenas nações ou pelos compromissos por elas assumidos.

Quanto mais avançavam os agressores, mais a França, a Inglaterra e os Estados Unidos, cediam, de maneira calculada, incentivando-os a novas agressões. Enquanto prodigavam Hitler com propostas de “acordos”, “pactos” e “acertos” sobre uma nova divisão do mundo, negavam-se a qualquer acordo defensivo com a URSS.

Ao contrário, no mesmo momento em que o Japão agredia a China, a Mongólia e a URSS, no Extremo Oriente, a Inglaterra assinava o acordo nipo-inglês ou a “Munique do Leste”, como ficou conhecido. Buscava-se impor ao Estado Soviético o total isolamento e uma guerra em duas frentes.

            A “novela” das negociações tripartites entre a URSS, a Inglaterra e a França está suficientemente documentada para tirar as nossas dúvidas acerca das verdadeiras intenções das democracias ocidentais. O mesmo Chamberlain, que acorrera três vezes à Alemanha, de forma humilhante, para negociar com Hitler a entrega da Checoslováquia, se negou a viajar sequer uma vez até Moscou, para negociar o único acordo que poderia ter detido a aventura nazi-fascista e evitado a guerra. Ao contrário, enviou, ostensivamente, uma delegação desqualificada e sem poderes, e nunca escondeu que não tinha a menor intenção de assinar qualquer tratado com a URSS. Enquanto isso, até o último minuto tentou negociar com a Alemanha o abandono da Polônia.

            A França e os Estados Unidos não ficaram muito atrás nas suas atitudes. A total inatividade dessas nações capitalistas quando se concretizou a agressão alemã à Polônia, mostrou ao mundo a quem elas tentavam colocar na linha de fogo das tropas alemãs quando propunham que à URSS oferecesse garantias unilaterais a uma Polônia que se negava sequer a admitir a entrada de um único soldado soviético para defendê-la:

Os diplomatas soviéticos deram-se conta de que o grupo de Cliveden, contra a crescente oposição da opinião pública anglo-francesa, pretendia jogar seu último trunfo sobre a Polônia. Ocupando-a, a Wehrmacht – exército alemão – atingiria a fronteira soviética. A URSS, em guerra com os japoneses no leste, sentiu a ameaça de uma dupla invasão. A falta de preparação de Londres e Paris numa conjuntura tão tensa revelava-se uma estratégia de encorajar o ataque de Hitler à Polônia. De que serviam as garantias de Varsóvia sem um respaldo militar?[cxc]

            Não nos cabe emitir “julgamentos” sobre os acontecimentos históricos – em particular sobre a “política de apaziguamento” e o acordo germano-soviético de não-agressão – mas tentar explicá-los. Nesse sentido, independentemente das opiniões que tenhamos sobre Stalin e os erros que tenha cometido, uma coisa não pode ser negada: a URSS adotou durante anos uma política de denúncia e de enfrentamento ao nazi-fascismo e tentou por todos os meios um tratado com a França e a Inglaterra, para detê-lo enquanto era possível. Mas sempre recebeu um rotundo “não”.

            Em luta no Oriente com o Japão já há quatro meses, foi só quando perdeu toda a esperança em um acordo com as democracias liberais e faltavam menos de dez dias para o ataque alemão à Polônia que a URSS aceitou um acordo de não-agressão com a Alemanha, com o objetivo de ganhar tempo e terreno para o inevitável e futuro confronto com ela. Que outra nação não teria agido desta forma para preservar o seu futuro?

            Assim colocada a questão, fica claro que a responsabilidade do início da Segunda Guerra Mundial – se tomarmos o ataque à Polônia como o seu deflagrador – coube em primeiro lugar à Alemanha:

Não pode haver a menor dúvida de que o imperialismo alemão, deliberada e descaradamente, desencadeou a guerra contra a Polônia e, com isso, a Segunda Guerra Mundial, em 1º de setembro de 1939. Quaisquer que sejam as responsabilidades do sistema capitalista mundial no seu conjunto e das outras potências imperialistas, esse ato em particular foi obra da classe dominante alemã dirigida pelo Führer e seus sequazes militares.[cxci]

            Em segundo lugar, a responsabilidade pela deflagração da Segunda Guerra Mundial cabe à política de “apaziguamento” e de “incitamento” das democracias ocidentais à Alemanha para que atacasse a URSS. O acordo germano-soviético de não-agressão em nenhum momento pode ser responsabilizado por isso. As informações históricas comprovam que esse ataque não só estava planejado desde abril de 1939, como que já havia sido posto em marcha no dia 15 de agosto, oito dias antes da assinatura do referido acordo.

            Na verdade, as causas de fundo da Segunda Guerra Mundial foram as contradições inter-imperialistas, decorrentes do desenvolvimento desigual do capitalismo, às quais se somaram as contradições entre o Socialismo emergente e o Capitalismo em crise. Muitos “desejariam nos fazer crer que a Segunda Guerra Mundial nasceu no espírito de alguns ambiciosos, de alguns loucos. Não, a Segunda Guerra Mundial foi preparada, desejada pelos dirigentes dos grandes interesses financeiros, para sair de seu marasmo e para destruir o socialismo. [cxcii]

NOTAS

[i] LOMBEEK, Alain V. Do conflito à coexistência: contribuição para o estudo do contencioso sovietico-finlandês (1917-1955). Lisboa: Prelo, 1973, pp. 16-17, 35-38.

[ii] Idem, pp. 21-29.

[iii] LENIN. Tesis sobre el problema de la conclusión de una paz separada (24.02.1918). In: LENIN, V.I. Obras Escogidas. Moscou: Ediciones en lenguas extranjeras, 1960, t.2, pp. 582-583.

[iv] BRUHAT, Jean. História da URSS. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1966, p. 42.

[v] [Curzon] “Propunha que as conversações para o armistício começassem imediatamente entre a Rússia e a Polônia sobre as bases de uma linha traçada no outono de 1919, após um detalhado estudo dos dados etnográficos pelos especialistas da conferência de paz (conhecida mais tarde por ‘linha Curzon’) [CARR, E. H. Historia de la Rusia Soviética: La revolución Bolchevique (1917-1923). Madrid: Alianza Editorial, 1973, v.3, p. 222]

[vi] KINDER, Hermann e HILGEMANN, Werner. Atlas histórico mundial: De La Revolución Francesa a nuestros días, 6ª edição, vol. 2. Madrid: Ediciones Istmo, 1977, p 171.

[vii] BRUHAT. Op. Cit., p. 45.

[viii] LOMBEEK. Op. Cit., p. 43.

[ix] CROUZET, Maurice. História Geral das Civilizações - a Época Contemporânea: o declínio da Europa; o mundo soviético, Tomo VII. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1961, p. 41.

[x] CHURCHILL, Winston S. La Segunda Guerra Mundial, vol. 1. Madrid: Ediciones Orbis, 1985, p. 35].

[xi] “a diplomacia comum russo germânica trabalhou lado a lado, secretamente, sobre o rearmamento mútuo. Negociações em 1921-22, conduzidas por Trotski, do lado russo, e pelo chefe do novo Reichswehr alemão, general von Seeckt, levaram ao estabelecimento na Rússia de fábricas alemãs que produziam gás tóxico, aviões e obuses.” [KOCHAN, Lionel. A Formação da Rússia Moderna. Lisboa: Editora Ulisséia, 1962, 387 p.].

[xii] TAYLOR, A.J.P. A Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro: ZAHAR EDITORES, 1963, pp. 48,49.

[xiii] DUTT, R. Palme. Problemas da História Contemporânea. Rio de Janeiro: Zahar, 1984, pp. 45-46.

[xiv] BEZIMENSKI, L. O militarismo Alemão com/sem Hitler. V.1.Rio de Janeiro: Saga, 1967, p. 39.

[xv] E. KULKOV, O. RJECHEVSKI e I. TCHELICHEV. A verdade e a mentira sobre a Segunda Guerra Mundial. Lisboa: Editorial “Avante”, 1984. p. 38.

[xvi] COLLOR, Lindolfo. Europa 1939. Porto Alegre: Fundação Paulo do Couto e Silva; Fundação Casa de Rui Barbosa, 1989, p. 233.

[xvii] TAYLOR. Op. Cit. p. 56-57.

[xviii] ROCHE, Alexandre. A Segunda Guerra Mundial. In: História: Ensino e Pesquisa, Ano 1, nº 2. P. Alegre: Sulina, 1985, pp. 51, 52.

[xix] SNYDER. Op. Cit., p. 43.

[xx] SMITH, S.R. The Mandchurian Crisis, 1913-1932. In: DEBORIN, G. Segunda Guerra Mundial. São Paulo: Editora Fulgor, 1966. p. 13.

[xxi] ALSTYNE, Richard W. American Diplomacy in Action. In: DEBORIN. Op. Cit. p. 13.

[xxii] TAYLOR. Op. Cit., p. 70.

[xxiii] HITLER, Adolf. Minha Luta. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1939, p. 548, 554, 558.

[xxiv] BALDWIN, Stanley. Apud LEBEDEV, N. La URSS en la política mundial. Moscu: Editorial Progreso, 1983, p. 78.

[xxv] VIZENTINI, Paulo Gilberto Fagundes. Segunda Guerra Mundial: Relações internacionais do século 20 (segunda parte), 4ª edição. Porto Alegre, Editora da Universidade/ UFRGS, 1996, p. 23-24.

[xxvi] HEINKEL, E. Stürmisches Leben. In: BEZIMENSKI. Op. Cit., v. 1, p. 65.

[xxvii] TOGLIATTI, Palmiro. La lucha contra el fascismo y la guerra. In: Fascismo, Democracia y Frente Popular – VII Congresso de la Internacional Comunista México: Siglo XXI, 1984, pp. 308-309.

[xxviii] CHEVALLAZ, Georges-André. As grandes conferências diplomáticas. In: BERNARD, Henri et al. Os arquivos da Segunda Guerra Mundial. São Paulo: DIFEL, 1964, p. 127.

[xxix] SHIRER, William L. A queda da França: o colapso da Terceira República. Rio de Janeiro: RECORD, 1969, v.1, p. 289.

[xxx] CHURCHILL. Op. Cit., v.1, p. 124.

[xxxi] BEZIMENSKI. Op. Cit., v. 1, p.83.

[xxxii] DIMITROV, J. La ofensiva del fascismo y las tareas de La Internacional em la lucha por la unidad de la clase obrera contra el fascismo .In: DIMITROV, J. Selección de trabajos. Buenos Aires: Ediciones Estudio, 1972, p. 183.

[xxxiii] SOBOLEV, A. et al. A Internacional Comunista. Lisboa: Edições Avante, 1973, v 3, p. 40-79.

[xxxiv] CHURCHILL. Op. Cit., v. 1, p. 152.

[xxxv] SNYDER. Op. Cit., p. 53.

[xxxvi] LEBEDEV. Op. Cit., p. 85.

[xxxvii] HERRERA, Heitor A. A Estratégia dos Aliados na Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1961, pp. 47-48.

[xxxviii] SIMONE, André. A derrocada de uma nação. Porto Alegre: Edições Meridiano, 1941, p. 163.

[xxxix] TAYLOR. Op. Cit., p. 112.

[xl] HERRERA. Op. Cit., p. 55.

[xli] LEBEDEV. Op. Cit., p. 87.

[xlii] BEZIMENSKI. Op. Cit., v.1, p. 53.

[xliii] TAYLOR. Op. Cit., pp. 137-138.

[xliv] BEZIMENSKI. Op. Cit., v. 1, p. 112.

[xlv] SNYDER. Op. Cit., p. 64.

[xlvi] SCHUSCHNIGG. Apud SNYDER. Op. Cit., p.65.

[xlvii] DEBORIN. Op. Cit., p. 22.

[xlviii] SNYDER. Op. Cit., p. 66.

[xlix] JODL. Apud DEBORIN. Op. Cit., p. 22.

[l] THE DAILY EXPRESS, 14.03.38. Apud DEBORIN. Op. Cit., p. 24.

[li] CHURCHILL. Op. Cit., v. 1, p. 230.

[lii] IRVING, David. El camino de la guerra. Buenos Aires: Planeta, 1991, p. 179.

[liii] SIMONE. Op. Cit., p. 210.

[liv] SHIRER. Ascensão... Op. Cit., v. 2, p. 161.

[lv] IRVING. Op. Cit., pp. 191-192.

[lvi] HERRERA. Op. Cit., pp. 50-51.

[lvii] SHIRER, William L. A queda... Op. Cit., v.2, p 87.

[lviii] IRVING. Op. Cit., p. 193.

[lix] PARKER, R.A.C. El Siglo XX - Europa, 1918-1945. México, DF: Siglo veintiuno, 1990, p. 363.

[lx] BRISSAUD, André. Almirante Canaris – o príncipe da espionagem alemã. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1978, p. 181.

[lxi] WELLES, Sumner. The Time  for Decision. Apud DEBORIN. Op. Cit., p. 28.

[lxii] TAYLOR. Op. Cit., pp. 162, 192, 196.

[lxiii] DEBORIN. Op. Cit., p. 25-26.

[lxiv] E. KULKOV, O. RJECHEVSKI e I. TCHELICHEV. Op. Cit., p. 51.

[lxv] CHURCHILL. Op. Cit., v.1, p. 257.

[lxvi] SHIRER. Ascensão... Op. Cit., vol. 2, p. 204.

[lxvii] Idem, pp. 204-205.

[lxviii].COLE, G.D.H. História del pensamiento Socialista: Socialismo y Fascismo (1931-1939), vol. VII. México, DF: Fondo de Cultura Econômica, 1965, p. 35.

[lxix] SIMONE. Op. Cit., p. 234.

[lxx] Livre jaune français, Paris, 1939. Documents diplomatiques 1938-1939, pp. 45-46. Apud ELLEINSTEIN, Jean. A História da URSS. Portugal: Publicações Europa-América, 1976, pp. 10-11.

[lxxi] SHIRER, William L. Diário de Berlim: 1934-1941. Rio de Janeiro: Record, S/D, v. 1, p. 134.

[lxxii] SHIRER. Diário ... Op. Cit., v. 1, p. 142.

[lxxiii] IRVING. Op. Cit., pp. 226-228.

[lxxiv] BULITT. Apud DEBORIN. Op. Cit., p. 31.

[lxxv] SHIRER. Ascensão... Op. Cit., vol 2, p. 242.

[lxxvi] TAYLOR. Op. Cit., p. 206.

[lxxvii] COLLOR. Op. Cit., p. 196.

[lxxviii] STALIN. Apud GROZ, Victor. Polônia 1939. Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1955, p. 71.

[lxxix] DEBORIN. Op. Cit., p. 35.

[lxxx] TAYLOR. Op. Cit., p. 221.

[lxxxi] HERRERA. Op. Cit., p. 52.

[lxxxii] COLLOR. Op. Cit., p. 204.

[lxxxiii] SHIRER, Ascensão...Op. Cit., vol 2, p. 303-304.

[lxxxiv] MAISKI, Ivan. Quem ajudou a Hitler. (Tradução condensada de Elio Bolsanello) São Paulo: Editora Socialista, 1984. p. 58.

[lxxxv] Idem, p.59.

[lxxxvi] COLLOR. Op. Cit., pp. 219, 63, 182-18.

[lxxxvii] BAUFRE, General. Le Drame 1940. Apud E. KULKOV, O. RJECHEVSKI e I. TCHELICHEV. Op. Cit., p. 72-73.

[lxxxviii] CHEVALLAZ, Georges-André. As grandes conferências diplomáticas. In: BERNARD, Henri et al. Os arquivos da Segunda Guerra Mundial. São Paulo: DIFEL, 1964, p. 128-129.

[lxxxix] MAISKI. Op. Cit., p. 71.

[xc] IRVING. Op. Cit., p. 244.

[xci] Idem. p. 263-266.

[xcii] TAYLOR. Op. Cit., p. 245.

[xciii] BEZIMENSKI. Op. Cit., p. 127.

[xciv] Idem, p. 128.

[xcv] DEBORIN. Op. Cit., p. 38-39.

[xcvi] Idem, p.39.

[xcvii] MAISKI, Op. Cit., p.73-74.

[xcviii] CARTIER, Raymond. Os mistérios da Guerra. Rio de Janeiro: Editora Biblioteca Militar, 1949, p. 85.

[xcix] DIRKSEN. Informe ao Ministério de Relações Exteriores, 03.08.1939. Apud, Burô de Información Soviético. Falsificadores de La História (reseña histórica). Moscou: Ediciones en lenguas extranjeras, 1948, p. 31.

[c] GROZ. Op. Cit., pp. 76-77.

[ci] Telegrama de Seeds a Halifax, em 13 de agosto de 1939, Apud MAISKI. Op. Cit., p.77-78.

[cii] MAISKI. Op. Cit., p.79.

[ciii] SHIRER. Ascensão... .Op. Cit., vol 2, p. 314-5.

[civ] JOLL, James. A Europa desde 1870. Lisboa: Dom Quixote, 1995, p.552.

[cv] MANDEL. Op. Cit. pp. 105-106.

[cvi] “Com os alemães arriscamo-nos a perder a nossa liberdade, com os russo perderemos a nossa alma.” [BECK. In: BAUER, Eddy. História Polémica da Segunda Guerra Mundial. Mem Martins: Publicações Europa-América, 1967, v. 1, p. 270].

[cvii] NOEL, L. La Guerre de 39 a commencé 4 ans plus tôt. Apud E. KULKOV, O. RJECHEVSKI e I. TCHELICHEV. Op. Cit., p. 73.

[cviii] MAISKI. Op. Cit., p. 83.

[cix] BOSCHESI, B. Palmiro. Os responsáveis pela II Guerra Mundial. Lisboa: Editora Ulisseia, 1976, p. 52.

[cx] TAYLOR. Op. Cit., p. 256, 258.

[cxi] Memorando do Foreign Office, 22.05.39. Apud TAYLOR. Op. Cit., pp. 228-229.

[cxii] LENIN, V.I. O infantilismo “esquerdista” e o espírito pequeno-burguês. In: Obras Escogidas. Moscou: Ediciones en lenguas extranjeras, 1960, t.2, pp. 745.

[cxiii] LENIN, V.I. Tesis sobre la situación política actual. (1918) In: LENIN, V.I. Obras Escogidas. Moscou: Ediciones en Lenguas Extranjeras, 1960, t. 2, p. 770.

[cxiv] “Litvinov ainda viria a servir à pátria nos anos de guerra: entre 1941 e 1943, foi Embaixador da União Soviética nos Estados Unidos. De 1943 a 1946, terminaria a vida política e diplomática como um dos Vice-Ministros do Exterior”. [SILVEIRA, Joel e MORAES NETO, Geneton. Hitler/Stalin - O Pacto Maldito. Rio de Janeiro: Record, 1989, p. 163.

[cxv] TAYLOR. Op. Cit., p.233.

[cxvi] Molotov. Apud WERTH, Alexander. A Rússia na Guerra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, vol. 1, p. 41.

[cxvii] TAYLOR. Op. Cit., p. 241.

[cxviii] MAISKI. Op. Cit., p. 90.

[cxix] SILVEIRA, Joel e MORAES NETO, Geneton. Op. Cit., p.316.

[cxx] IRVING. Op. Cit., p. 263-264.

[cxxi] MAISKI. Op. Cit., p. 91.

[cxxii] Schulenberg a Ribbentrop, 04.08.39, Apud TAYLOR. Op.Cit, p. 242.

[cxxiii] SHIRER. A queda..., Op. Cit, v.1, pp. 155-156.

[cxxiv] SHIRER. Ascensão..., Op. Cit, vol. 2, p. 343.

[cxxv] MAISKI. Op. Cit., p. 90-95.

[cxxvi] IRVING. Op. Cit., p. 266-272, 275.

[cxxvii] Idem, p. 276.

[cxxviii] HERRERA. Op. Cit., p. 53.

[cxxix] SHIRER. A queda...Op. Cit., v. 1, pp. 162.

[cxxx] MAISKI. Op. Cit., p. 95-96; SNYDER. Op. Cit., p. 83.

[cxxxi] SHIRER, W.L. Ascensão e Queda do Terceiro Reich, vol. II, pp. 367-369.

[cxxxii] TROTSKY, L. Novamente, e uma vez mais, sobre a natureza da URSS (18.10.39). In: Em Defesa do Marxismo. Fortaleza: Liga Bolchevique Internacionalista, 1997, p. 32.

[cxxxiii] SNYDER. Op. Cit., p. 83; IRVING. Op. Cit., p.272; SHIRER. Op. Cit., v. 3, p. 13; HEYDECKER, Joe J. e LEEB, E. Johannes. O Processo de Nuremberg. Rio de Janeiro: Editorial Bruguera, 1968, p.217.

[cxxxiv] SHIRER. Ascensão... Op. Cit., v. 2, pp. 365-366.

[cxxxv] TAYLOR. Op. Cit., p. 262-263.

[cxxxvi] DE GAULLE, Charles. Memórias de Guerra. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1977, t. I, p. 32.

[cxxxvii] SHIRER, A queda... Op. Cit., v.1, p. 99.

[cxxxviii] COLLOR. Op. Cit., pp. 217-220.

[cxxxix] CHURCHILL. Op. Cit., v.1, p. 307.

[cxl] DEUTSCHER, Isaac. Stalin - a história de uma tirania. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970, t.2, pp. 395-397.

[cxli] BROUÉ, Pierre. União Soviética - Da revolução ao colapso. Porto Alegre: Editora da Universidade / UFRGS, 1996, p. 126.

[cxlii] MANDEL. Op. Cit., p.34.

[cxliii] CLAUDIN, Fernando. A crise do movimento comunista: v.1 - a crise da internacional comunista. Rio de Janeiro: Global, 1985, p.258.

[cxliv] CLAUDIN. Op. Cit., pp. 257-258.

[cxlv] SILVEIRA, Joel e MORAES NETO, Geneton. Op. Cit., pp. 340-342.

[cxlvi] SPRIANO, Paolo. O movimento comunista entre a guerra e o pós-guerra: 1938-1947. In: HOBSBAWM, Eric. J. (organizador). História do Marxismo. Rio de Janeiro: PAZ E TERRA, 1987, v. 10, p. 139.

[cxlvii] SILVEIRA, Joel e MORAES NETO, Geneton. Op. Cit., pp. 500-502.

[cxlviii] SILVEIRA, Joel e MORAES NETO, Geneton.Op. Cit., pp. 512-514.

[cxlix] DE GAULLE. Memórias... Op. Cit., t. 1, p. 36.

[cl] EHRENBURG, Ilya. Memórias: a Europa sob o nazismo (1933-1941). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, v. IV, pp. 251-252.

[cli] GOUTARD, A. A Guerra das Ocasiões Perdidas. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1967, p. 121.

[clii] KITCHEN, Martin. Um mundo em chamas: uma breve história da 2ª Guerra Mundial na Europa e na Ásia – 1939/1945. Rio de Janeiro: ZAHAR, 1993, p. 19.

[cliii] GOUTARD. Op. Cit., p.117.

[cliv] VORMANN, N. Apud E. KULKOV, O. RJECHEVSKI e I. TCHELICHEV. Op. Cit., p. 83.

[clv] BRUHAT, Jean. História da URSS. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1966, p. 106.

[clvi] SNYDER. Op. Cit., p. 15.

[clvii] GORIEUX, Benjamin. In: DUROSELLE, Jean Baptiste. Le frontières europeennes de l’URSS (1917-41). Paris: Armand Colin, 1957, p. 284-285.

[clviii] SNYDER. Op. Cit., pp. 16-17.

[clix] Idem, p. 289.

[clx] LATREILLE, André. La Segunda Guerra Mundial: 1939-1945. Madrid: Guadarrama, 1966, p. 70.

[clxi] TROTSKY, Leon. De um arranhão, ao perigo da gangrena (24.01.40). In: Em Defesa do Marxismo. Op. Cit., pp. 107-109.

[clxii] TROTSKY, Leon. Novamente, e uma vez mais, sobre a natureza da URSS (18.10.39). In: Em Defesa do Marxismo. Op. Cit., pp. 31-33.

[clxiii] TROTSKY, Leon. O “Manifesto de Alarme” da Quarta Internacional. (1940) Apud MARIE, Jean-Jacques. Os quinze primeiros anos da Quarta Internacional. São Paulo: Palavra Editora, 1981, pp. 38, 41.

[clxiv] DEUTSCHER, Isaac. Trotsky - El profeta desterrado (1929/1940). México DF: Edic. Era, 1988, pp. 413-414.

[clxv] COLLOR. Op. Cit., p. 277.

[clxvi] CHURCHILL, 1º de outubro de 1939. Apud GROSZ. Op. Cit., p.83.

[clxvii] SHIRER. Ascensão..., Op. Cit., vol. 3, pp. 19-21.

[clxviii] DAVIES, Joseph E. Missão em Moscou. Rio de Janeiro: Calvino, 1942, pp. 312-314.

[clxix] “se na Europa iniciasse a guerra, talvez se pudesse convertê-la em uma cruzada contra o comunismo e alcançar os objetivos que a intervenção armada dos aliados não havia obtido em 1918.” [DULLES, Foster Rhea. The Road to Teheran. The Story of Rusia anda America, 1781-1943. Princeton, 1944, p. 212. Apud LEBEDEV, Op. Cit., p. 94.

[clxx] SPRIANO, Paolo. O movimento comunista entre a guerra e o pós-guerra: 1938-1947. In: HOBSBAWM, Eric. J. (organizador). História do Marxismo. Rio de Janeiro: PAZ E TERRA, 1987, vol. 10, p. 144- 145.

[clxxi] Idem, p. 145-146.

[clxxii] SOBOLEV. Op. Cit., v. 3, p. 154.

[clxxiii] STALIN, J. Discurso de 06.02.46. Apud: SPRIANO. Op. Cit., p. 151.

[clxxiv] WERTH. Op. Cit., p. 67.

[clxxv] Idem, p. 72.

[clxxvi] ELLENSTEIN, Op. Cit., p. 25.

[clxxvii] WERTH. Op. Cit., p. 81.

[clxxviii] Idem, p. 84.

[clxxix] SPRIANO. Op. Cit., p. 149.

[clxxx] EHRENBURG. Op. Cit., v. 4, p. 253.

[clxxxi] SOBOLEV.. Op. Cit., v.3, p. 156.

[clxxxii] MANDEL. Op. Cit., p. 29.

[clxxxiii] GOUJON, Gérard. A social democracia e a Segunda Guerra Mundial. In: COGGIOLA, Osvaldo. Segunda Guerra Mundial. Op. Cit., p. 249.

[clxxxiv] SOBOLEV. Op. Cit., v.3, pp. 157-159.

[clxxxv] DEUTSCHER. Op. Cit., t. 2, pp. 405-406.

[clxxxvi] SAMSONOV, A. et al. Compendio de História de la URSS – desde la Gran Revolución Socialista de octubre hasta nuestros dias. Moscu: Editorial Progreso, S/D, p. 229.

[clxxxvii] DEUTSCHER. Op. Cit., pp. 414, 419, 421.

[clxxxviii] SIMONE. Op. Cit., p. 242.

[clxxxix] TAYLOR. Op. Cit., p. 103.

[cxc] VIZENTINI, Paulo Gilberto Fagundes et al. A Revolução Soviética/1905-45: o socialismo num só país. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1989, p. 117.

[cxci] MANDEL. Op. Cit., p. 28.

[cxcii] ROCHE. Op. Cit., p. 60.